domingo, 4 de dezembro de 2011

CURSOS / ADESTRAMENTO / FORMAÇÃO - O que aconteceu?


Se procuro em minhas recordações as que me deixaram um sabor duradouro, se faço balanço das horas que valeram, sempre me encontro com aquelas que não valeram a pena.

Cursos – adestramento – formação - O que aconteceu?

Eu fico olhando e pensando, o que aconteceu? Porque não deu certo, afinal onde estão estes milhares e milhares de adultos que participaram dos cursos aplicados no Brasil nos últimos 60 anos?. Entristece saber que uns poucos continuaram. É difícil analisar quantos foram.

Ainda não vi e se existe desconheço, uma pesquisa da UEB a respeito. Pesquisa de campo é claro. Séria e objetiva. Sei que cada um diz uma coisa, que quando assume determinada função logo faz sua modificaçãozinha. Sem ofensas, mas convidam uns e outros, formam uma comissão e logo está tudo mudado.

Agora é para valer dizem.  Os anos passam e os cursos se multiplicam, e até escotistas não preparados adequadamente são promovidos no intuito de aumentar o numero deles (os cursos) no Pais. É uma afirmação ambígua, pois também não possuo dados concretos.

Pelo meu exemplo pessoal, dos cursos que tive oportunidade de dirigir e participar como membro da equipe, acredito que só um pequeno numero deles ainda estão na ativa. O numero que saiu deve ser assustador, pois deixei de participar como dirigente de curso desde 1986 e tantos e tantos cursos continuaram a ser aplicados.

Vocês já pensaram se pelo menos 50% deles ainda estivessem aqui? Teríamos outro movimento. Maior, mais forte e uma excelente base para arregimentação de adultos.

Mas isto foi uma utopia do passado. Porque saíram? Motivos? Acho que cada um tem sua explicação lógica. Mas é uma lógica que não resolve, pois mesmo com as mudanças efetuadas pela Direção Nacional nos cursos no Brasil, tudo continua o mesmo.

Acho que o nosso maior problema é a falta de continuidade em planos já esquematizados e que quando aparece uma nova direção, as mudanças vão acontecendo. Lembra-me os políticos que assumem algum cargo executivo e deixam os planos anteriores a ver “navios”.

Outro é a falta de uma boa democracia no movimento. Em nome da lealdade, alguns assumem posições, se tornam sem perceber os donos da verdade, não dão oportunidade aos que merecem e isto faz com que vários bons escotistas abandonem o seu grupo por discordar do Chefe do Grupo ou talvez por não ter visto suas solicitações atendidas.

Destes, uns abandonam de vez, outros se transferem ou organizam outros grupos, seja filiado a UEB seja ao Escotismo Independente que, diversamente do que dizem tem crescido muito em nosso País. E olhe, a maioria faz um bom escotismo.

Fico triste em ver escotistas que aprenderam e não aplicam o Sistema de Patrulhas. Escotistas que estão vibrando a cada dia com atividades nacionais, regionais e distritais, mas ainda não vi a vibração com seu pequeno acampamento de tropa, lá numa floresta longínqua ou mesmo em um bosque escondido de uma fazenda qualquer, onde seus monitores foram adestrados e estão fazendo um acampamento ao molde deles.

Acho que verei isto cada vez menos. Claro muitos deles dizem que o movimento é isto, é aquilo e não sei se o que dizem os jovens. Alguns com certeza dirão que é estupendo, formidável, incrível, extraordinário! Mas porque saem tantos do escotismo? Alguém no seu próprio grupo já fez uma pesquisa séria a respeito?

Mas não quero ser agourento prefiro ser mais auspicioso ou otimista.

Estou me lembrando de um fato que aconteceu lá pelo final da década de 60, onde ainda participava como chefe de uma tropa escoteira e quase não conhecia ninguém da alta cúpula regional. Amigos, nada a ver com a abertura do meu artigo. É só um fato, nada mais.

Ficamos sabendo da abertura de um grande empreendimento montado próximo a uma pequena cidade no interior e que seu principal executivo (do empreendimento) convenceu a Direção Regional a fazer lá um Acampamento Nacional. Tinha visto em viagem aos Estados Unidos como funcionavam os acampamentos de férias (hoje uma realidade) e partiu para montar o seu.

Nada melhor que inaugurar lá com um grande acampamento nacional. Centenas de escoteiros e como era uma pessoa de boa conversa, acreditou que isto seria o ápice para o sucesso de seu empreendimento. Nada melhor que vender seu peixe a quem de direito. Prometeu mundos e fundos. Alimentação para todas as patrulhas, infra-estrutura local, transporte da capital até o local e vice versa (mais ou menos 280 km) e até iria trazer uma tribo indígena para montar as ocas e ensinar aos participantes a técnica do arco e flexa.

Bem, todos acreditaram e o primeiro passo foi dado. Foi contratado um profissional (mais tarde um grande amigo meu) para montar a estrutura do evento. Circulares as Regiões, Grupos, inscrições, taxas, muitos detalhes tudo aquilo que se requer numa situação desta.

Fiquei sabendo que mais de 500 jovens e adultos de todo o Brasil inscreveram-se.

Chegou o grande dia e lá chegamos com uma patrulha (nem todos puderam participar e a tropa era pequena - estávamos iniciando). Combinado as 09 hs no centro da capital em local determinado. O transporte sairia as 09:30 hs. Fomos os primeiros a chegar. Logo a praça estava cheia de escoteiros e escotistas. Mais de 200 participantes. Os demais saíram de ônibus fretados direto ao local ou foram de condução própria.

10 hs nada dos ônibus. 11 hs nada. Começamos a nos preocupar. Convidei um amigo escotista e nos dirigimos ao Escritório onde estava a organização e lá encontramos o profissional (jovem ainda) nervoso, pronto a explodir e engasgando nos disse que o responsável não providenciou nada. Onde está ele perguntei. Sumiu! Disse ele. Não sei o que fazer! Enfim, não tinha ônibus. E as demais provisões lá no campo, estão lá? - Não sei, respondeu.

Pensei, e agora, Tínhamos lá na praça um numero enorme de escoteiros esperando, alegres, esperançosos e avisar que não haveria mais Ajuri nacional e cancelar? E os que foram para o local?

Os que estavam ali, em uníssemos, disseram- vamos resolver ou não. Ninguém desistiu do Acampamento Nacional. Sugeri para alguém convidar uns 15 escotistas da capital que estavam na praça para virem em uma reunião na sala da organização. Assim foi feito. Fomos francos com a situação. Alguns não quiseram se comprometer. Ficamos em 10. Montamos um plano de operação. Onde conseguir ônibus agora? – Anotamos endereços e partimos. Eu fui de ônibus urbano até o Batalhão da Policia militar mais próximo. Procurei o comandante. Pessoa gentilíssima. Expliquei a situação. Cederam-me um ônibus. Ida e volta. Chegariam à praça em 3 hs. (naquela época, as calças curtas e o chapelão valiam)

Voltei para o escritório. Somente um dos escotistas tinha chegado. Com um ônibus para as 4 hs. Foi chegando um a um. Conseguimos mais 2 para as 15 hs. Resolvido. Dava para todos. Um foi avisar a todos na praça. Cada um fez seu lanche aqui e ali. 16 horas. Embarcamos os últimos. Eu estava junto. Muita alegria. Canções, e dormi.

Acordei no local. Uma grande movimentação. Um distrital da área, por sinal um dos que salvaram a atividade, comunicava que o executivo não apareceu. Não tinha alimentação. Lá estavam os índios (uns 20) montando suas ocas sem saber o que acontecia. O Distrital me convidou a ajudá-lo a resolver o problema. Dá para resolver perguntei? Ele me disse que não seria fácil. Quem sabe com um prefeito qualquer? Ele não acreditou mas mesmo assim com a ajuda dele arrumamos uma caminhonete e partimos para a cidade mais próxima. Procuramos a prefeitura. Grande prefeito! E era amigo do Distrital. Disse que resolveria sobre a intendência e resolveu.

Tivemos depois o problema da madeira. O prometido era 20 bambus por patrulha. Não havia nada no campo. De novo com o distrital e a turma que tinha colaborado na capital (Era composta de jovens de 18 a 21 anos escotistas de primeira qualidade e que alguns anos depois se tornaram meus assistentes quando assumi a região). Fomos a pé até duas fazendas próximas. Colocaram seus funcionários para trabalhar e em pouco tempo uma grande quantidade de bambus estavam no campo.

Fizemos a abertura lá pelas 18 hs.  Só as 20 foi chamado a intendência. Não houve atividades naquele dia. Todos foram dormir altas horas da noite. Eu não tinha função ali. Os chefes de Campo e Sub Campo, intendência, programação entre outros já haviam sido escolhidos antes. Na hora do vap vup não os vi. Claro, eles eram de outros estados e alguns do interior e nada sabiam do acontecido. O zunzum ainda não circulara no campo.

Mas olhe, se não fossem estes escotistas todo o programa teria sido um fracasso geral. Empenharam-se, deram tudo de si e poucos muito poucos ficaram sabendo da real situação. Tudo feito em menos de 12 hs de uma programação que já vinha a mais de um ano.

Tínhamos um sub campo de escotistas. Fiquei ali olhando e vendo se tudo corria a contendo. Ninguém da direção me conhecia. Fui conhecendo a cada um. Pena, tinha alguns que só faltavam colocar nele um crachá com um nome – BP2. (Isto aconteceu depois em outras grandes atividades regionais e nacionais)

O acampamento foi realizado. Um grande sucesso. Os ônibus estavam a disposição para o retorno. Ninguém falhou.

No final, no dia do encerramento, apareceu o executivo idealizador. Com aquela cara de quem comeu de graça e gostou. Sorria para todo mundo como se nada tivesse acontecido. Depois a região entregou a ele uma condecoração pelos bons serviços (?).  Muitos outros receberam certificados e agradecimentos. Acho que mereciam. Pena que aqueles que fizeram o acampamento acontecer nada receberam. E graças a eles, a atividade foi um sucesso.

Sabemos que ninguém está aqui atrás de recompensas. O trabalho voluntário é assim. Uns vão, outros ficam, uns saem, outros entram. É uma rotatividade desigual. Mas amigos, sei que muitos de vocês passam ou já passaram por isto. Um grupo, um Distrito ou Uma região que não vê não enxerga, não ensina, faz com que os agradecimentos não existam. E olhe, são vocês que fazem tudo isto.
Mais tarde, anos depois o tal executivo do acampamento de férias apareceu de novo na minha vida, mas desta vez eu já tinha experiência suficiente com tais tipos.

Mas esta é outra história, eram outros tempos. Hoje onde estarão todos que conheci? Mais de 120 cursos. Mais de 1800 alunos. Onde estão os escotistas?

Autor: Gustave Flaubert