Crônicas de um Chefe Escoteiro.
Verborragia Escoteira II.
(Verborragia – Vem do Latim Verbum. Escorrer, fluir, pessoas
quando abre a boca parecem dar escoamento a um infinito rio de palavras. São os
donos da verdade. Não aceitam qualquer tentativa de resposta de parte do
interlocutor). Interessante.
O que o Chefe de Campo de
Gilwell, John Thurman (falecido)
escreveu em 1950 permanece vivo até hoje. Disse ele que o escotismo é um
movimento sério, mas que uma de suas melhores coisas seria a alegria em
participar. Completou dizendo que isso serviria tanto para os dirigentes como
para os jovens. E complementava: - Cuidado com o perigo de se pensar em termos
educacionais ou psicológicos, pois isto nos faz perder nossas condições de
amadores. E fechou suas palavras assim: - Como amadores nós somos bons, mas
como profissionais somos péssimos. Não é
interessante? Vejam, de trinta anos para cá, começamos a ter uma revolução na
educação Escoteira. Tudo antes era muito simples. Lembro que um Chefe Escoteiro
conhecia facilmente o “adestramento” que deveria existir na sua sessão.
Pata-tenra, primeira estrela, segunda estrela e cruzeiro do sul e depois vinha
o noviço, segunda e primeira classe. E nos seniores, algumas eficiências e o Escoteiro
da Pátria. Nos primórdios só um livrinho. ”Para ser Escoteiro”. Depois
insistiram com o Chefe Floriano para desmembrar em noviço, segunda e primeira
classe. Mas era tudo muito simples. Não nos faltava os livros do fundador. Sempre
um prazer em reler. E para completar vinha o Guia do Escoteiro do Velho Lobo,
um “livraço”! Não se precisava de mais. Os lobinhos só um pequeno manual simples
sempre traduzido do verdadeiro de BP. Nenhum Chefe de
lobos, de Escoteiros deixava de ter em sua cabeceira estas literaturas. Ah! Não
vamos esquecer o Livro da Jângal de Kipling. Uma beleza! Era tudo na moleza
como se diz. Afinal sempre fomos amadores. Aí começou a chegar os
doutores, os pedagogos, psicólogos. Altos professores e dirigentes eméritos.
Começaram as mudanças. Arrumaram tantos programas para lobinhos que quando
dirigia cursos correlatos tinha de me cercar de doutores e doutoras
“lobísticas” para não me perder. Risos. E as mudanças não paravam. Fizeram da
ficha modelo 120 um sonho distante. Agora tudo eletrônico. Não existe mais o
escrever e sim o digitar no SIGUE, dizem que ele preencheu uma lacuna que
faltava.
Nunca me
intrometi nas novas tecnologias. Perco-me nisto e confesso ser um “Pata Tenra”.
Quem sabe eles teriam razão com estas mudanças? Até me deleito quando vejo uma
jovem ou um jovem pedindo ajuda nas redes sociais para um projeto tal visando
possuir o Flor de Lis ou o Escoteiro da Pátria. Acho que eles ou não tem chefes
ou não tem patrulha, ou melhor, existe ainda o Sistema de Patrulhas? Sei que
houve uma época que a exigência era tanta que precisávamos ter nos grupos
doutores no assunto, sem isto necas de aprovação por parte dos membros da elite
escoteira. O programa Escoteiro que era aplicado de maneira simples, gostosa,
aventureira, sem aquelas complicações de programas técnicos, a curto médio e
longo prazo, começou a mudar. Antes se preparava os monitores e eles se
tornavam mestres nas patrulhas. Hoje as mudanças já não são mais para amadores.
Ou se torna um profissional ou esquece que ali é seu lugar. Nossos dirigentes
sempre adoram mudar e tem cada um com ideias miraculosas. Sem consultar as bases
eles vão mudando. Os interessados que se virem. Agora é assim. A biblioteca Escoteira cresceu. A lista da loja Escoteira é
enorme. Haja condição financeira para ter todos. E ler então? Quando fico
sabendo me assusto. Alardearam que agora os chefes de lobinhos estavam com a
faca e o queijo na mão. Cinco manuais a disposição. Cinco! E para as sessões
subsequentes? E aí vieram os cursos. De adestramento simples do passado agora
se chama formação. Tem cada coisa que até me arrepio. Acho que são válidas, mas
se eu voltasse atrás iria correr disto tudo. Outro dia discutia-se sobre o
seguro Escoteiro. Seguro? “Mama mia”, alguém queria saber como ficam os pais
que vão à reunião, os pais que vão ao acampamento e aí por diante. Pelo que
vejo estamos na vanguarda de tudo que existe em organizações de jovens.
Se Baden Powell conforme diz nosso amigo John Thurman conseguiu
criar uma das mais formidáveis ideias e práticas que levam os rapazes a
segui-la com entusiasmo, e nos métodos, e modo simples de manejar e guiar os
jovens, agora parece que tudo mudou. Não adianta dizer que devíamos manter como
antes, um clima de simplicidade, da alegria e do entusiasmo que ele inspirou.
Ainda copiando o John, os únicos que são capazes de por tudo a perder pela
austeridade demasiada são os próprios dirigentes. E isto está acontecendo. O
escotismo nasceu em 1907 entre meninos pobres e, se economicamente os rapazes
melhoraram desde então, ainda existem milhares de pobres que aspiram fazer
escotismo como naquela época. Mas quando se toca no assunto, como continua a
dizer o John (já falecido) muitos se tornam arrogantes, complacentes e se
fazendo passar demasiadamente autossuficientes e com isto podem arruinar o
movimento. Peço a Deus que não. Lembro que o escotismo sempre foi uma atividade de fim de
semana, duas ou três horas. Mais um pequeno tempo em uma atividade aventureira.
Complicar em fazer do "Chefe" Escoteiro um profissional é fazer com
que não caminhe para o sucesso da formação Escoteira. Nosso tempo restrito,
corrido em nossas vidas profissionais, sociais e familiares não pode ser tomado
com a austeridade de uma profissionalização. Se nos considerarem amadores, nos
derem um programa para amadores como no passado, então o escotismo irá
florescer, mas confesso que não acredito nisto. Não sei o futuro e nem sei se o
sucesso pelo que estão fazendo vai merecer meu aplauso. Se o que dizem é o
caminho e se não acertarem neste caminho e claro se ainda estiver aqui direi -
O tempo passou, perdeu-se tudo. Vamos recomeçar de novo? Ainda vai dar tempo? –
Claro que sim, nunca iremos perder os Doutores do escotismo.