Conversa ao pé do fogo.
A Lei do Escoteiro.
“Para que uma lei se ela não for levada a sério?”
Quando menino
ouvi falar pela primeira vez na Lei dos Escoteiros. Uma época onde a leitura se
fazia na biblioteca da cidade, onde as conversas giravam nas atividades ao ar
livre e não havia ainda as tecnologias de hoje. Fui conhecer TV já nos meus
dezessete anos. O mundo mudou muito e tinha de mudar. Nada pode ser estático
sem uma razão de ser. Se nós crescemos tudo cresce a nossa volta. O escotismo é
uma fonte inesgotável de experiências. Algumas boas outras nem tanto. O
progresso trouxe muitas mudanças. No Movimento Escoteiro nunca em menos de
vinte anos se mudou tanto. Se valer a pena ou se está valendo só o futuro dirá.
BP nunca foi contra as mudanças deste que a finalidade fosse alcançada. Aquela
áurea de nobreza de caráter, onde se acreditava em sonhos, onde o sentimento
batia forte e todos acreditavam ter um anjo ao seu lado já não é a mesma. De um
dia para o outro aparecem novas metodologias, novas maneiras de pensar e a
imprensa principalmente a televisada nos trás diariamente fatos que não
escolhemos. Ela a TV nos trás em nossa sala a interpretação de um autor ou
roteirista que sem perceber mudam nossa maneira de vivenciar o bem e do mal.
Ficamos presos a um processo tal que
dificilmente escapamos dele. Em nosso país boa parte da população assiste as
séries e novelas, comenta e sem perceber assimilam os heróis, as personagens a
trama as vestimentas e esta é motivo de discussões em diversas situações
diárias na vida de cada um. Não vou analisar aqui as vantagens e desvantagens
apesar de que minha maneira de pensar e agir não aceita facilmente este tipo de
comportamento. O jovem de hoje em sua maioria já não tem mais aqueles sonhos
aventureiros onde uma Távola Redonda já não faz parte mais do seu modo de agir.
As leis, as normas da sociedade e a visão ética do mundo não estão sendo
assimilada como no passado e que os jovens acreditavam. Quem conhece ainda a
história de um homem que um dia tirou uma espada Excalibur da pedra e se tornou
rei? Um rei que comandou uma das maiores sagas contadas por séculos e séculos
em livros de história e vivida por milhares de Escoteiros que sonharam com isto?
Tenho escrito
aqui sobre os sonhos dos jovens, como eles veem a natureza, como reconhecem a
Deus sobre todas as coisas e nem sei se é assim mesmo que pensam. O palavreado
moderno me assusta e suas maneiras de ver o mundo mais ainda. Se o escotismo
pode trazer dividendos em sua formação quem sabe a modernidade está aos poucos
os afastando da verdadeira interpretação do escotismo. Temos hoje a liberdade
de expressão o que é muito válido e a formação religiosa que ficou em segundo
plano o importante é discutir os valores que alguns defendem tais como a
liberdade sexual, o homossexual, bissexual entre outros como se isto fosse
importante na formação escoteira. Sempre pensei que isto era obrigação dos pais
ao criar a família. Temos ainda o ateísmo que muitos defendem e os temas são
discutidos em detrimento de outros que alguns julgam importantes. Não tiro o
mérito de nenhuma forma de aceitação sexual e ateísta. É um direito, mas
discutir isto no escotismo tão em falta de valores éticos e morais é como mudar
toda uma forma de pensamento que produziu as normas da sociedade como são
vistas hoje.
Claro que
contestações são um direito e devemos levar em consideração o que cada um
acredita, mas no escotismo que caminha em minha opinião tropegamente,
precisamos primeiro fortalecer o que falta na formação escoteira para depois
enraizados abrir as portas para aqueles que acreditam e querem ser aceitos
conforme suas escolhas pessoais. Vejo muitos arvorando nos seus direitos, mas
será que eu não tenho os meus? Sou obrigado a aceitar estas mudanças que nunca
fiz parte? Tenho de discutir se eles estão certos ou errados? Na visão de
muitos eu sei que sou errado, mas sempre acreditei num escotismo puro nas suas
ações e nas suas palavras onde Deus é a fonte de tudo. Não me vejo em um mundo
Escoteiro onde Deus não está presente. Se outros não pensam assim é um direito,
mas forçar uma situação para que se mude ou se dê liberdade às mudanças de
comportamento ou palavras ditas na promessa não compactuarei com ninguém.
Outro dia em uma
atividade escoteira um alto dirigente pertencente à equipe de formação dizia
que por muitos anos a UEB se descuidou com a formação religiosa. Ele,
entretanto acreditava nas palavras de BP que o escotismo colabora na formação e
educação do jovem na escola, na religião e em seu lar. Colabora e não
substitui. Disse o dirigente que está havendo uma mudança de comportamento.
Agora já pensam em uma volta ao passado com diretores religiosos. Pensei comigo
porque isto aconteceu? No passado quando atuava Equipe de cursos tínhamos como
a mais importante das palestras a Lei e Promessa. Lembro que me esmerava quando
era o responsável por ela. Preparava-me com esmero e nunca deixei que ela
caísse no lugar comum em que alguns religiosos já tem como comprometimento, com
um discurso pronto em suas concepções. Mudei inclusive horários e a parte da
Lei e Promessa saltou de meia hora para uma hora. Fiz uma unidade didática
diferente, participativa com grupos de trabalho ao ar livre, montagens de peças
e vivencia escoteira. Questão de honra em quem acreditava e acredita.
Lembro que
quando menino, quando fui fazer minha promessa escoteira meu Chefe me chamou e
conversou comigo por muito tempo. Ouviu mais do que falou. Deixou-me pensativo
com os artigos da lei. Fui para casa e os li novamente. Já os tinha decorado,
mas queria mais, queria me sentir responsável a cumprir o que seria prometido,
pois iria fazer uma promessa e me ensinaram que uma promessa é uma norma que exige
muito no caráter e da honra de um escoteiro. Marcou-me profundamente e olhe que
pedi ao Chefe antes de fazer a promessa que me deixasse dar um testemunho do
novo Escoteiro que iria surgir em mim. Eu ia prometer e minha promessa seria
para sempre. Uma lei é para ser cumprida não para aprender e esquecer. Durante
todo o tempo que fui menino Escoteiro até na vida adulta mantive o mesmo
“status-quo”. Sempre exigi de todos que ela a Lei e Promessa deveria estar presentes
em todos os momentos da vida escoteira. Antes eram corriqueiros os jogos da
lei, os jograis, as enquetes e tantas outras formas que nos faziam lembrar a
todo instante que sem uma lei, sem uma promessa não existe a palavra do
Escoteiro. Já nem sei se isto ainda existe nas sessões escoteiras.
Espero que
não levem minhas palavras como alguém que se arraiga a um passado e que hoje o
que escrevi são meras quimeras de um tempo que já se foi. Se assim for, se o
mundo é outro e se a modernidade não comporta mais este saudosismo ou esta
norma de comportamento ou de vida então, e só então eu acredito que o escotismo
que conheci está nos seus estertores finais. Sei que me dirão que irá surgir
das cinzas do passado um novo escotismo, mais livre, mais forte e moderno,
cheio de jovens que acreditam em si e não precisam acreditar em Deus. Ainda bem
que não estarei aqui para ver...