quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro. Uma breve história do tempo. Escoteiros! Aos seus lugares... Vamos partir!




Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
Uma breve história do tempo.
Escoteiros! Aos seus lugares... Vamos partir!

Nada a ver com livro homônimo de Stephen Hawking, que guia o leitor na busca de respostas a algumas das maiores dúvidas da humanidade. Qual a origem do universo? Ele é infinito? E o tempo? Houve um começo e haverá um fim? Aqui faremos uma busca no tempo do ontem e do hoje quando chegava a hora da partida de lobos e escoteiros para um acampamento. Trivial, banal? Convido você a ler e quem sabe comentar. Bem vindo a Uma breve história do tempo.

Desde suas origens que os escoteiros se prepararam para sair em busca de aventuras fora da sede. Seja uma simples caminhada, uma jornada, uma atividade aventureira ou um acampamento. Até mesmo os lobos amam uma caminhada um acantonamento e a preparação para suas atividades são inesquecíveis. Até os anos sessenta vivíamos uma tranquilidade relativa à criminalidade e aos perigos que hoje infestam os caminhos e locais permissíveis para acampar. Eram poucos os lobos e Escoteiros (aqui incluídos os seniores) que se preocupavam como hoje na preparação do material individual, pois cada um sabia o que levar como levar e como manter um padrão de qualidade no uso e custeio. Acredito que desde os tempos dos jovens ingleses ao lerem o “Scout for boys” e se aventurarem nos bosques e cercania de Londres até 1970 pouca coisa mudou.

As cidades menores eram privilegiadas. Fazia-se carta prego sem medo de errar o caminho. Os chefes confiavam nos seus jovens deixando-os depois de preparados acampar ou excursionar sem suas presenças. Os pais confiavam. Solicitar uma autorização do menino para participar era algum até então não sonhado. Havia solidariedade e disciplina na marcha para o campo, seja em pequenas estradas carroçáveis ou trilhas abertas e conhecidas. O transito era um roceiro a cavalo, ou uma charrete ou mesmo um carro de boi. Com o tempo foi aparecendo nas pequenas estradas um Jeep ou um Ford Bigode cujo barulho se ouvia ao longe. As patrulhas com suas carrocinhas (não era assim tão fácil de adquirir) se divertiam no revezamento, enquanto dois ou três emparelhavam os demais eram observadores dos animais, pássaros e possíveis pesqueiros para não faltar nas refeições que eles iriam fazer. Os pais se acostumaram com o recado do Chefe: Pai, mamãe sábado vamos acampar, voltamos no domingo à tarde. Às vezes um sorriso e uma pergunta: - Filho qual ração vai levar? Ração? Uma outra história para contar.

Durante este período a criminalidade era mínima. Podia-se confiar nos fazendeiros, posseiros os caminhantes passantes onde estivessem acampados ou acantonados. Tudo era uma descoberta, o rumo, as horas, o tempo e a observação da natureza. O tempo foi passando. Nem tudo era no solado dos pés. As cidades cresceram. Veio o ano de 1970 e até 1990 ainda se podia confiar numa prova de jornada feito a dois, vivenciando locais pré-estabelecidos e até mesmo visitados pelos responsáveis. Já havia necessidade de autorização, a principio verbal ainda se confiava na palavra e tudo era motivo de alegria descoberta e aprendizado. O Campo ainda era o objetivo. A observância da metodologia Badeniana era cumprida a risca. Se antes uma jardineira ou caminhão lonado ou sem lona servia de transporte agora era necessário alugar ou pedir aos órgãos municipais ônibus mais modernos para qualquer atividade de campo.

Passou-se a década de 80, 90 chegamos ao ano 2.000. A burocratização estava caminho nas atividades escoteiras. Dizem alguns que por necessidade do mundo moderno diferente daquele do passado. Se antes bastava o dizer simples que ia acampar agora era necessário autorização por escrito dos pais, do grupo aos órgãos escoteiros superiores e um enorme cuidado com a ECA – Estatutos da Criança e do Adolescente. As lideranças exigiam seu quinhão para em troca fornecer seguro para casos de acidentes dentre outros. Os pais preocupados acorreram nas hostes escoteiras. Se antes os nascentes na manjedoura escoteiras e já adultos assumiam a continuidade do seu sonho de menino, agora havia um aluvião de adultos, pais que além de preocupados queriam acompanhar seus rebentos na duvida se havia mesmo a segurança que tantos alegavam ter. Muitos promessaram. Aprenderam a amar o escotismo e colocaram sua filosofia dentro do coração. Mas outros se imiscuíram na formação de suas crias querendo para eles mais do que eles podiam chegar e conquistar. E foi aí que surgiu a cizânia.

Ouve um salto de transposição do ontem para o hoje, chamado de modernismo. Adultos recém-chegados analisavam a juventude pós-moderna. Sem ter uma base de entendimento para ouvir e saber o que eles queriam ou desejavam, formou a opinião que no advindo novos tempos o escotismo teria que mudar. Se antes o aprender a fazer fazendo era na vivência do campismo, agora uma nova pedagogia devia ser feita para agradar os recém-chegados. A natureza tão dignificada nos meios atuais ficou no esquecimento. Diziam-se que os jovens queriam outro tipo de vivência outro tipo de aprendizado bem diferente dos seus avós do passado. Não havia mais estradas vicinais, trilhas e matas para desbravar. Não havia mais o amigo do campo que prazerosamente oferecia sua área para acampar. Agora surgiam pequenos sítios, fazedores de camping oferecendo por uma módica quantia um gramado para que pudessem todos pernoitar e em alguns um belo restaurante com quentinhas para servir aos que quisessem pagar.

E eu nos meus momentos de deslumbramento ainda me lembro de quando Chefe, saindo para uma atividade no campo, a dizer... Escoteiros! Aos seus lugares... Vamos partir! E lá vinham os pais quando os filhos entravam nos ônibus, chorosos, pedindo para olhar seus filhos, me dando receitas e lembretes, que eu tomasse cuidado para que ele só fizesse as refeições com tantas calorias e que evitasse o orvalho e brincadeiras ao luar. E me dizem que o escotismo mudou... Precisava, pois o mundo mudou... E como mudou como escreveu Cora Coralina: - A vida tem duas faces: Positiva e negativa... O passado foi duro, mas deixou o seu legado. Saber viver é a grande sabedoria, que eu possa dignificar minha condição de ser vivente... Aceitar suas limitações e me fazer pedra de segurança dos valores que vão se desmoronando... Nasci em tempos rudes, aceitei contradições lutas e pedras como lições de vida e delas me sirvo... Aprendi a viver!