Crônicas de
um Velho Chefe Escoteiro.
“O Acampamento”
Por Lord
Baden-Powell do seu livro A Caminho do Triunfo.
Prólogo: Não existe
nada que substitui o Acampamento no Programa Escoteiro. Ele é a própria razão
da existência do Escotismo. Afinal a vida ao ar livre, as técnicas, a maneira
de acampar, o aprendizado, a desenvoltura do corpo e da alma são as essências da
formação do Escoteiro. Vejamos o que BP dizia no seu livro “A Caminho do
Triunfo”.
- O acampamento é a grande atração que chama o rapaz para o
Escotismo e oferece o melhor ensejo para ensiná-lo a confiar em si próprio e a
desenvolver o espírito de iniciativa, além de lhe dar saúde e robustez. Um
acampamento é um lugar espaçoso, mas não há nele lugar para um indivíduo só:
aquele que não quer desempenhar a parte que lhe cabe-nos muitos trabalhos que
sempre há para fazer. Não há lugar para o fingido nem para o resmungão. O
Pata-Tenra queixa-se da «dura vida do acampamento», mas o Escoteiro que conhece
as regras do jogo bem sabe que a vida em campo está longe de ser dura.
O objetivo de um acampamento é (a) ir ao encontro do desejo
que o rapaz tem de gozar a vida ao ar livre dos Escoteiros, e (b) pô-lo
completamente nas mãos do seu Chefe durante um período definido, para formação
individual do caráter e do espírito de iniciativa, e desenvolvimento físico e
moral. Todo o Escoteiro sabe que quando levanta o acampamento só há duas coisas
que deve deixar atrás de si:
1. Nada;
2. Os seus agradecimentos - a Deus pelos bons momentos que
viveu, e ao proprietário do terreno por tê-lo deixado fazer uso dele.
Se o acampamento for utilizado como um mero pretexto para a inação
e o amolecimento, quase que mais vale não acampar. Só quando estamos acampados
é que podemos verdadeiramente aprender a estudar a Natureza como deve ser, pois
é ali que nos encontramos frente a frente com a Natureza em todas as horas do
dia ou da noite. O acampamento ideal, para mim, é aquele em que todos andam
alegres e ocupados, em que as Patrulhas se mantêm intactas em todas as
circunstâncias, e todos os Monitores de Patrulha e todos os Escoteiros sentem
verdadeiro orgulho no seu acampamento e nas suas construções.
Sempre que acampares ou
partires em expedição, lembra-te que muito se espera dos Escoteiros. Tens de
ajudar a manter o bom nome do Movimento. O acampamento, essencial para os Escoteiros,
não o é para os Lobinhos, e com estes é de longe melhor nem sequer tentar
acampar, a menos que se possa contar com todos os meios e se tenha a
experiência necessária. Um bom acampamento pode ter efeitos benéficos e
duradouros sobre os Escoteiros. Um acampamento ruim será uma vergonha
permanente para o Chefe, a Tropa, e provavelmente para todo o Movimento. Mais
vale educar os rapazes por métodos talvez menos atraentes e mais lentos do que
de correr este risco.
O acampamento é a melhor oportunidade para estudar os escoteiros,
pois em poucos dias aprendereis mais a seu respeito do que em muitos meses de
reuniões normais, e podereis exercer sobre eles, no domínio do caráter, do
asseio e da saúde, uma influência tal que crie neles hábitos duradouros. Na
vida de acampamento aprendemos a passar sem uma porção de coisas que achamos
necessárias quando vivemos em casas, e descobrimos que conseguimos fazer
sozinhos muitas coisa que pensávamos não ser capazes de fazer. É difícil haver
um único artigo da Lei do Escoteiro que não seja cumprido melhor, depois de
teres acampado e de o teres posto em prática no acampamento.
Não deixemos que os nossos acampamentos se convertam nos
piqueniques aborrecidos e indolentes que seriam se organizados ao estilo
militar. O que nós queremos é a arte da exploração e da vida na natureza, e é
isso que os rapazes mais desejam. Que o tenham, e em força. Enquanto os Grupos
e as Patrulhas não estiverem acostumados a acampar, ainda não começaram a ser
Escoteiros.
O acampamento é o jardim celestial do rapaz, e a oportunidade
do Chefe. E, além disso, é Escotismo. Há um aspecto que eu gostaria de insistir
junto de todos aqueles que assumem a responsabilidade de um acampamento; esse
aspecto tem a ver com a minha velha divisa «vistas largas», e consiste em
compreender que, por muito elevado que seja o grau de perfeição a que possa ser
levado, o campismo não é o fim último do Escotismo. É apenas uma das etapas -
embora a mais cheia de potencialidades - em direção ao nosso objetivo de formar
cidadãos felizes, saudáveis e úteis.
Quando cheguei à arena, em Budapeste, no meio duma intensa
chuvada, fui mais uma vez aclamado como «Baden Meister». (Mestre do Banho).
Expliquei então aos rapazes que tinha trazido à chuva comigo
de propósito, para melhor poder julgar as suas qualidades, uma vez que esperava
que eles não fossem Escoteiros só de bom tempo.
“O estudo da natureza mostrará a vocês quão repleto de
coisas belas e maravilhosas Deus fez o mundo para vocês aproveitarem.
Alegrem-se com o que receberam e façam bom proveito disso. Olhem para o lado
bom das coisas, ao invés do lado ruim delas. Contudo, a melhor maneira de obter
felicidade é proporcionar felicidade a outras pessoas. Tentem deixar este mundo
um pouco melhor do que o encontraram e, quando chegar à vez de morrerem, possam
morrer felizes com o sentimento de que, pelo menos, não desperdiçaram o tempo,
mas fizeram o melhor que puderam. Estejam preparados, desta maneira, para
viverem e morrerem felizes, sempre fiéis à Promessa Escoteira, até mesmo depois
que deixarem de ser jovens - e que Deus os ajude a cumpri-la. “Vosso amigo,
Baden-Powell”.