Gentil.
O Antigo
Escoteiro.
Como se fosse
ontem...
Prólogo: - Ontem? Mas
não foi hoje que vesti minha calça curta ali naquele pátio? Primeiro a azul e
depois a caqui? O que eu estava fazendo de volta ao passado? Ninguém me
conhecia, ninguém sabia que era eu. Mas eis que chegou Noal, amigos de patrulha
e agora de distância que só cabem nas lembranças do coração. Porque não fiquei?
Sem explicação. Destinos são assim, uns fazem os seus outros aceitam o que foi
destinado. Uma pequena história. Bem vindos!
- Quem é você? – Eu chefe?
Um simples antigo Escoteiro. Visitando. – O que quer ver? Levantei as
sobrancelhas. Suas palavras mudaram o vento do meu rumo. Francamente não
esperava tal rebeldia por uma simples visita. – Trinta anos, passei trinta anos
sem voltar. Quantos ainda restavam do lugar que ficou na memória? A voz parecia
brotar machucando como se ele quisesse dizer que eu ali não fazia falta. – Você
não pode crescer aprender e depois ir embora! Ele era mordaz. Eu pensei que
sempre fui eu mesmo. – Não pode ser um destes chefes que ficam sentados falando
o que pretendem fazer e nada fazem. - Ele tinha razão. Ele esperava que eu
tivesse dito: - Eu vou fazer e pronto. Vou imaginar o futuro sobre o prisma de
um valente Escoteiro! Voltei no tempo, quanto tempo, não fiz minha história e
nem sequer pensei no rumo que escolhi. – Olhei para ele, não o reconheci. Não
era da minha época. Será que não era bem vindo? Perguntava-me também porque
voltei. Deixei minha memória passear no tempo. Tempo? Sim naquela época os
adolescentes se achavam invencíveis. Sempre com aquele sorriso malicioso e
idiota estampado no rosto sempre se achando o melhor.
- Não posso ficar e ver a nova
geração? – Ele sorriu desconfiado. Quem sabe pensou que era um daqueles que
quase destruiu um trabalho feito por valentes oriundo de uma saga que hoje não existe
mais. – Ele me perguntou: Você é uma pessoa escoteira? – Nossa! Que termo mais
abstrato. O que significaria ser uma pessoa? Será que existimos no presente sem
saber o que seremos quando deixarmos de existir? Quais seriam as regras do jogo
agora e será que eu teria condições de aprender a jogá-las? – Um lobo se
aproximou. Dirigiu-se a ele me olhando pelo “rabo” de olho. – Akelá, faremos o
melhor agora? – Me lembrei do Grande Uivo. Quantas vezes eu fiz? Quantas vezes
fui eu convidado para representar a Alcateia? – Já vou serei breve rápido
rasteiro. – Mas que diabos significava rápido e rasteiro? Arroz instantâneo
leva cinco minutos e pudim instantâneo uma hora. Duvido que a velocidade seja
medida desta forma.
O circulo na Roca do Conselho
estava em posição. Acho que um cisco levado pelo vento resolveu pousar em meu
olho. Lágrimas se fizeram instantaneamente. Como cresci meu Deus. Perdi parte
da minha vida ali naquele circulo, ou melhor, será que perdi ou ganhei? Ao
longe a canção se fez ouvir. Avançam as patrulhas! Que saudades. Pensei em Noal
e Zezé. Ainda estão vivos? A quem perguntar? Ao chefão dos lobos ou o Grande Chefe
da Tropa escoteira que adentrava na sede? Eu queria ser uma pessoa dessas que
tem uma vontade enorme de falar e contar as nuances do passado. Passei anos sem
encontrar pessoas deste tipo. Ouve um tempo que acreditei que precisavam de mim
como um cometa precisa da cauda! – Não nos conhecemos? Incrível volta no tempo.
Era Noal sem tirar nem por. O Maestro dos Lobos se foi. Um abraço apertado um
aperto de mão, uma saudação nos moldes militar. Cascos batidos de um calcanhar
forte emplumado por um coturno que todos sempre sonharam ter.
- É você? Não acredito. De
volta as raízes? Confesso que comecei a chorar. As saudades eram demais. Eu
sabia que não devemos perder a esperança, pois se acontecer seremos
irremediavelmente feridos. A vida nos faz pensar que somos invencíveis o que
realmente somos. Não nascemos, nem morremos. Como toda energia, nós
simplesmente mudamos a forma de tamanho e manifestação. A Tropa surda ao
passado olhava com atenção.
- E Zezé? – Morreu. Uma
resposta fria e dita de forma direta. De longe o Chefe dos lobos espiava o
encontro de dois Matusaléns que encarnou ali no pátio uma memorial que jazia há
tempos na vastidão do passado. Olhei para ele dei um sorriso simples e pensei
que às vezes precisamos de alguém que nos ouça, que não nos julgue que não nos
subestime, apenas nos ouça. Fui embora despedindo de todos. Uma volta no tempo,
uma lembrança perdida e reencontrada no presente. Saudades de tudo do que foi e
do que ficou preso na memória do tempo. Eu sabia que tinha perdido uma coisa
importante e que nunca consegui achá-la. Era como se eu tivesse perdido os meus
óculos, fosse até uma óptica e descobrisse que todos os óculos do mundo tinham
se acabado e que, agora, eu teria de viver sem eles.
Foi bom retornar. Velhos
sonhos, velhos amigos e pensei quantas palavras estavam ainda escritas nas
árvores daquele pátio que nunca em tempo algum me saíram da lembrança.