Crônicas
de um Velho Chefe Escoteiro.
A
morte da árvore frondosa que eu tanto amei.
Nota - Eu vi minha vida ramificando-se
diante de mim como a figueira verde da história. Na ponta de cada
galho, como um figo gordo e roxo, um futuro maravilhoso acenava e piscava. Um
figo era um marido, um lar feliz e filhos, outro era uma poetisa famosa e
consagrada, outro era uma professora brilhante...
Eu a descobri por acaso. Não mais que a um quilômetro da minha
residência. No final da Rua dos Afonsos. Nada que uma pequena caminhada para chegar
até ela. Vi que era uma linda figueira. Enorme, Copada, uma sombra incrível ela
produzia. Estava no meio do nada. Um matagal no final de rua. Apaixonei-me por
ela. Durante três dias limpei o mato e o lixo em volta de sua sombra. Alí a
gente se escondia. Pensei em plantar gramas e flores. Eu plantei uns chapéus de
couro, lírios, flor de laranjeira, crista de galo e todas se deram bem.
Era meu cantinho. Era gostoso e perfumado. As tardes pegava um livro,
jogava nas costas uma cadeira de praia e lá ia eu. Sentava-me, refastelava com
aquela sombra gostosa e sem nenhum barulho eu viajava em meu livro nas páginas
de sonhos que me levavam a terras longínquas de um mundo fantástico. Li uma
dezena de livros acobertados pela sombra daquela árvore que passei a amar.
Eu ficava horas e horas sentado ao pé da árvore. Eu sabia que a amizade
é como a sombra na tarde ela cresce até com o ocaso da vida. Tom Jobim dizia
que quando uma árvore é cortada ela renasce em outro lugar. Eu gostaria quando
morrer ir para este lugar, onde as árvores vivem em paz. Minha bela vida de
tardes sombreadas durou pouco. Um ano depois quando lá cheguei encontrei uns
homens da prefeitura. Faziam medidas aqui e ali. – Oi! O que é isto? Perguntei.
- A nova avenida. Isto aqui vai ficar mais agradável. Muitos carros, ônibus,
novas casas, shoppings edifícios enormes você vai gostar!
Olhei para ele amargurado. Não sabia o que dizia. Ele não sabia que a
civilização não trás a felicidade. E minha árvore? Perguntei. Vai ser cortada.
Ela fica bem no meio do caminho e se no meio do caminho tem uma árvore ela não
pode ficar! – O que posso fazer para vocês deixarem ela viva? – Nada meu amigo.
Nada.
Demorou seis
meses. Vi com tristeza em uma manhã de segunda, caminhões, tratores a caminho
do meu sonho das tardes assombreadas. Minha árvore ia partir. Senti um aperto
no coração. Disseram-me um dia que um ancião é uma grande árvore que, já não
tendo nem frutos e nem folhas ainda vive preso a terra como ela. Ainda bem que
estou "Velho". Logo, logo também irei partir. A natureza não é mais a
mesma. Não há respeito. Em nome da civilização ela é jogada como lixo em todos
os lugares. A árvore quando está sendo cortada,
observa com tristeza que o cabo do machado é de madeira. Deu-me vontade de
chorar. Iam rir de mim, o Velho chorando por uma árvore?
Eu sabia que a árvore não
prova a doçura dos próprios frutos; o rio não bebe suas próprias ondas; as
nuvens não despejam água sobre si mesmas. A força dos bons deve ser usada para
benefício de todos. Minha amiga partiu para onde Deus lhe reservava um lugar em
seu jardim do Éden. Eu sabia que todo jardim começa com uma história de amor,
antes que qualquer árvore seja plantada ou um lago construído é preciso que elas
tenham nascido dentro da alma. Quem não planta jardim por dentro, não planta
jardins por fora e nem passeia por eles.
Voltei para minha casa
tristonho, ainda tinha minha varanda meu canto. Mas que saudades da minha linda
árvore que um dia amei e que achei que iria viver para sempre presa nas minhas
saudades acreditando que durar para sempre!