Conversa ao
pé do fogo.
O famigerado
apito Escoteiro do Chefe Sonho de Valsa.
Nota – Dizem eu não sei
que para ser um bom Chefe tem de ser bom no apito. Verdade? Aquela estridência
no ar? Não dói os ouvidos? Bem tem gente que gosta, mas leia a história. Vais
ver que nem sempre o que dizem é verdade.
Era um bom Chefe, bom até demais.
Tinha um defeito. E quem não os tem? Bem voltemos ao defeito do Chefe Sonho de
Valsa. Ops! Seu nome não era este, mas para evitar colocar um nome e alguém se
enquadrar melhor é chamá-lo Sonho de Valsa. Vá lá que é um nome doce e eu gosto
muito do bombom.
- Pombas! Estou fugindo da história. Vamos
voltar a ela. O Chefe Sonho de Valsa como disse era um ótimo Chefe, mas gostava
de apitar. Como apitava! Era apito daqui, apito dali e no final da reunião a
Escoteira estava zonza com tanto apito. Ele se orgulhava do seu apito. – Alemão
legítimo! Dizia ele. Tenho também um francês, um italiano e um holandês. Sei
que uma vez em uma cidade pequena encontrou um apito, ou melhor, um trinado de
um Uirapuru. Era lindo. Ele gostou e comprou.
Quando na primeira reunião usou o
apito do trinado do Uirapuru a tropa assustou. – O que era aquilo? Um apito
diferente? Será que Deus ouviu nossas preces? E todos riram de alegria. Mas foi
só na abertura. Depois a rotina do apitador Escoteiro voltou. Ele fazia questão
de pendurar no seu pescoço dois três ou quatro apitos diferentes. E nos
acampamentos? Mama mia! Como apitava. A passarinhada sumia dali de tanto apito
estridente.
Muitos chefes comentaram com ele
do apito, mas ele não dava ouvido. Foi Lomanto que um dia lhe disse: – Chefe,
porque não vai ser juiz de futebol? Lá sim você vai se esbaldar. Se possível de
jogos de várzea onde os pizãos os empurrões, os chutes e os palavrões são
frequentes. E você vai apitar como nunca. Chefe Sonho de Valsa olhou enviesado
para Lomanto e nunca mais lhe dirigiu a palavra. Foi então que um fato
pitoresco aconteceu. Foi no Acampamento em Lobo Branco. Já havia acampado lá,
mas aprendeu uma lição que nunca mais esqueceu.
Era umas dez horas quando o
caminhão cheio de Escoteiros chegou a Campina do Arroio e para surpresa viram
que lá estava acampado uma tropa Escoteira. O Chefe Sonho de Valsa não conhecia.
Tudo bem pensou, aqui cabe todo mundo. Procurou o Chefe da outra tropa e se
apresentou. Um cara super simpático, mas ele logo notou que não tinha apito. Se
não tinha não era um bom Chefe. Dizem que o apito faz o Chefe. Verdade?
Conversaram pouco tempo e logo
seus apitos se fizeram ouvir. Apito de monitores, apito de intendência, apito
de cozinheiros, apito dos sub monitores, apito para formatura e apito para a
bandeira. Exigia que por apito a cada tarefa das patrulhas o monitores
avisassem que a tarefa tinha terminado. Sua tropa tudo bem ela estava
acostumada, mas a outra tropa se assustou. O Chefe Long Jonny resolveu
interferir educadamente. Viu que o semblante do Chefe Sonho de Valsa franzia. –
Bem, pensou que seja, vou abrir o jogo, o apito do Chefe está entornando o
caldo!
Chefe! O senhor tem uma bela
coleção de apitos no pescoço, disse. – Sonho de Valsa riu a toa. Quantos os
senhor tem? Eu? Não tenho nenhum. Uma vez comprei um Chifre do Kudu e ainda o
tenho, mas quase não uso. – Não usa? E como chama os meninos? Por sinal Chefe,
por sinal. E quando necessário por bandeirola. Bandeirola? Como? Perguntou
Sonho de Valsa. – Simples, olhe ali naquele pequeno mastro, tenho várias
bandeirolas pequenas. Cada uma para solicitação. A azul para monitores, a verde
para chamada geral, a marrom para os subs e assim vai. Subo a bandeira e eles
vem correndo. – Sei não disse o Chefe Sonho de Valsa, meu apito se ouve longe.
– Pode ser disse o Chefe Long Jonny, mas será que os pássaros não se incomodam?
Os animais reclamam? E como fazer para estarmos de bem com a natureza com o
trinar dos apitos?
O Chefe Sonho de Valsa deu
como encerrado a conversa. Já pensou? Disse ele para si, bandeirolas para
chamar? Melhor chamar com a fumaça de um fogo. E riu baixinho. Naquela noite o
Chefe Sonho de Valsa foi dormir sorrindo depois de apitar feito um louco em
todo tempo do acampamento. Dormiu e dormiu um sonho que nunca mais queria
sonhar como ele sonhou. Estava voando, isto mesmo voando e viu a terra dos
pássaros. Uma força o levava para baixo. Milhões de pássaros o esperavam. Um
círculo se fez. Um enorme gavião com um apito apitou no ouvido dele e logo em
seguida veio o Papagaio, a Coruja, a Águia e assim centenas de pássaros
apitaram no seu ouvido sem parar. Ele gritava para parar e não adiantava.
Soltaram-no e ele correu pelas nuvens e foi agarrado por um trovão que o levou
a terra dos animais da floresta. Mesma coisa. O Quati apitou, a Onça apitou. Os
macacos apitaram. Ele gritava e chorava e o soltaram. Acordou suado. Ainda com
os apitos no ouvido.
Abriu à porta da Barraca, um
silêncio gostoso da floresta. Um trinar cantante de pássaros. Ouviu ao longe a
cascata de águas límpidas, ouviu o vento passar. Que gostoso pensou. O Chefe
Long Jonny estava certo. O apito não faz parte da natureza. Ele jurou a si
mesmo que nunca mais usaria um a não ser para um pedido de socorro ou alguma
emergência.
E foi então que a tropa do
Chefe Sonho de Valsa sentiu a paz no coração. Quando viram que ele não apitava
mais, quando só usava as bandeiras ou os sinais com as mãos sentiram que agora
sim tinham um Chefe de verdade. E sabem? Aquela tropa enquanto o Chefe Sonho de
Valsa estava lá tinha como diz o lobo os olhos e os ouvidos abertos. E assim
viveram felizes para sempre.