segunda-feira, 8 de abril de 2019

Conversa ao pé do fogo. O Chifre de Kudu.



Conversa ao pé do fogo.
O Chifre de Kudu.

Prólogo: – Muito conhecido nas hostes escoteiras, o Chifre de Kudu tem sido usado em cursos avançados e como tradições em muitas tropas escoteiras em todo o mundo. No Brasil é adotado por poucas tropas. Por ser um toque simples e ouvido a distancia substitui o apito cuja estridência muitas vezes prejudica os tímpanos de quem houve. Essa é sua história. Aprendam e divirtam.

             O Kudu (Tregelaphus strepsiceros) é uma espécie de antílope cujo habitat vai desde a África do Sul á Etiópia. Um touro Kudu pode chegar a uma altura de 1,5 metros e tem uma coloração que vai de um cinzento avermelhado até quase azul. As suas características de visão aguçada, bom sentido de audição, olfato apurado e grande velocidade fazem dele um animal difícil de capturar. Seguindo uma tradição que remonta há 90 anos, as patrulhas são chamadas a reunir com o toque tradicional do chifre de Kudu, durante os cursos da Insígnia de Madeira. Pode parecer estranho que o chifre de um antílope africano, do tipo usado pelos Matabeles como clarim de guerra no século XIX, seja usado para chamar Escoteiros e Chefes por esse mundo a fora. Mas foi precisamente com um toque deste chifre que os primeiros Escoteiros foram acordados.

Quando reuniu os primeiros escoteiros em Brownsea, Baden-Powell lembrou-se do chifre de Kudu que tinha trazido das guerras contra os Matabeles, e usou-o para dar um toque de aventura e divertimento ao acampamento. De fato, foi durante o acampamento experimental de Brownsea, em Poole Harbour, no verão de 1907, que Baden-Powell colocou ao serviço do Escotismo, e pela primeira vez, o chifre de Kudu. William Hillcourt, um dos grandes pioneiros do Escotismo, o mesmo que escreveu o resumo da história de BP no final do «Escotismo para Rapazes», descreve assim a primeira alvorada em Brownsea:

"O dia começou ás 6h da manhã, quando BP acordou o acampamento com o som esquisito do longo chifre de Kudu em espiral - o clarim de guerra que tinha trazido da sua expedição à floresta de Somabula durante a Campanha Matabele de 1896".

John Thurman, grande nome do Escotismo britânico, conta como BP conheceu o chifre de Kudu:

"Como coronel na África, em 1896, Baden-Powell comandou uma coluna militar na Campanha Matabele. Foi num raid pelo rio Shangani abaixo que ele primeiro ouviu o som do chifre de Kudu. Ele andava confundido pela rapidez com que os alarmes eram espalhados entre os Matabeles, até que um dia se apercebeu que eles usavam o chifre de Kudu, o qual tinha uma grande potência sonora. Era usado um código. Assim que o inimigo era avistado, o alarme era tocado no Kudu, para todos os lados, e assim transmitido por muitas milhas em pouco tempo."

Depois da ilha de Brownsea, o chifre de Kudu voltou para a casa de BP onde permaneceu silenciosamente durante 12 anos, enquanto o movimento que ele anunciara se tornava moda e se espalhava pelo mundo fora. Então, em 1919, Baden-Powell entregou o chifre ao Parque de Gilwell para ser usado nos primeiros cursos para treino de Chefes. William Hillcourt comenta assim o início do uso do chifre de Kudu no Parque de Gilwell, na floresta de Epping, Inglaterra, a oito de Setembro de 1919:
"O primeiro acampamento para treino de chefes feito em Gilwell começou a oito de Setembro. Seguiu o padrão que BP tinha usado com os rapazes em Brownsea, 12 anos atrás. O sistema de patrulhas foi novamente posto á prova com 19 participantes divididos em patrulhas e vivendo uma vida em patrulha. A instrução tomou a mesma forma que em Brownsea. Cada dia um assunto novo era introduzido e aplicado em demonstrações, prática e jogos. O chifre de Kudu dos Matabeles que tinha sido usado para chamar os rapazes em Brownsea foi usado para todos os sinais."

              Dez anos mais tarde, aos 72 anos de idade, Baden-Powell levou consigo o chifre de Kudu para a abertura do 3º Jamboree Mundial, em Arrowe Park, Birkenhead, Inglaterra, a 28 de Julho de 1929. Foi constatado, pela experiência de Arrowe Park, que fazer soar o chifre de Kudu é um desafio. Os resultados, no entanto, foram tão impressionantes quanto se poderia desejar, segundo as palavras de William Hillcourt:

            "O dia da abertura do 3º Jamboree Mundial começou com uma forte chuvada que aumentou com o passar do dia; mas, à hora prevista... o tempo tornou-se «ameno». BP tinha trazido consigo para Arrowe Park o velho chifre de Kudu dos dias da guerra com os Matabeles que tinha sido usado para acordar os acampados em Brownsea no primeiro acampamento de escoteiros do mundo e para abrir o primeiro curso para chefes no Parque de Gilwell. Levou-o aos lábios para dar um toque que haveria de ecoar pela extensa parada em frente dele, mas, com o excitamento, os lábios recusaram-se a fazer o que deviam. O som do chifre não passou de um fraco «pff». No entanto, como que chamados para a ação pelo chifre, a marcha começou, com os contingentes a desfilarem atrás de contingentes em frente da plateia, com as bandeiras de quase todas as nações civilizadas desfraldadas ao vento, com milhares de pessoas a aplaudirem cada nação entusiasticamente.”.

             Ainda hoje o chifre é usado para reunir chefes em cursos de formação em todo o mundo. Para todos os que seguem as pegadas do fundador, é um viver do Escotismo no seu melhor.