Crônicas de
um Velho Chefe Escoteiro.
Era uma
vez... Um planeta azul chamado Terra!
Prólogo: - Crônica
utópica tirada da minha imaginação. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou
mortas é mera coincidência.
A vista era maravilhosa, debaixo
daquele enorme castanheiro em um banco simples de madeira feito por ele mesmo
estava sentado Baden-Powell. Gostava de todas as tardes ficar ali, olhando seu
planeta azul que se destacava no infinito entre milhares de estrelas no céu.
Suas lembranças ainda estavam vivas. Morava em uma Colônia que tão singelamente
batizaram de “Fraternidade”. Era uso fruto dos Escoteiros que um dia partiram
para as estrelas. Lord Baden-Powell fazia questão de receber todos com um
sorriso com um aperto de mão um abraço dos que chegavam da terra. Sorrindo
dizia que armassem a barraca no campo mais verde, nas campinas mais floridas
onde o jorro de uma nascente ou cascata acontecia, e árvores frutíferas que
proliferavam. Absorto em seus pensamentos Lord Baden-Powell não viu chegar seu
amigo Kenneth Maclaren. Amigos de longa data desde a Guerra do Transvaal e do
primeiro acampamento em Brownsea. Ele sorria ao pensar nos demais amigos que
moravam e se reuniam ali.
Recebi seu recado General –
Disse Kenneth. Baden-Powell sorriu. Sabia que ele teve muitas propostas de
outras colônias no céu, mas recusou todas. Era um amigo de verdade. – Sabe
Kenneth, preciso de um favor seu – As suas ordens meu General! – Baden-Powell
riu e prosseguiu. Tem vários anos que não vou a terra e não sei como vai o
escotismo por lá. Você sabe que breve irei para uma colônia de mais luz e nem
sei se posso ajudar os Escoteiros terrenos. Se você tiver condições tire uma
semana e faça um périplo na terra observando. Tente ver como está o método o
aprender fazendo e se o sistema de patrulha está perfeito. Veja também se eles mantem
muitas das tradições que deixamos. – Seu pedido é uma ordem general. Irei nesta
semana mesmo. Kenneth se despediu não sem antes deixar lembranças a Lady Olave
St. Clari Soames, a esposa de BP. Logo que ele partiu Lord Baden-Powell avistou
uma tropa de chefes em curso comandada por seu outro grande amigo Chefe John Thurman.
Ele sabia que John um antigo diretor de Gilwell Park era mestre em cursos deste
tipo. Mesmo com alguns problemas sua colônia tinha muita gente boa.
Na semana seguinte Kenneth o
procurou. – Já de volta? Disse BP. Já General. Não trago boas notícias. BP não
disse nada. Amigo vamos conversar em nosso ponto de reunião. Você sabe que eu
amo sentar embaixo daquele castanheiro. – Eu sei General o senhor fez uma
réplica de um que existia em Mafeking. Lembro que o senhor adorava ficar lá
sentado pensando sobre as próximas batalhas. Pois é, mas me conte. - Para dizer
a verdade General não tenho muito para contar. Desde a última vez que estive na
terra que o escotismo não é mais o mesmo. Estão fazendo grandes modificações.
Existe uma liberdade tal que mais parece uma indisciplina assistida. Países que
se dizem modernos abrem mão em varias questões que em sua época não iriam
acontecer. Uma liderança mundial chamada de WOSM ou OMME tem aprontado poucas e
boas.
BP. Já sabia deste pormenor. Não
havia como mudar. – BP balançou a cabeça convidando-o a continuar. Olhe General
rodei vários países, mas demorei mais no Brasil. Sei que o senhor nunca esteve
lá e fez muito bem. Eu até que gostei de muitos chefes que estão atuando, são
voluntários de valor e tentam ao seu modo educar a mocidade. Pena que lutam só.
As autoridades brasileiras desconhecem o movimento. Dizem que eles só sabem
vender biscoitos e ajudam a atravessar idosos nos sinais de trânsito. Muitas
cidades aproveitam deles para plantar árvores, limpar praças, ajudar nas
calamidades e carregar viveres para os necessitados. Eu sei que a ajuda ao
próximo é bem vinda. Mas acampamentos? Técnicas Escoteiras? Quase nada. Eles
dão enorme valor aos encontros nacionais e internacionais e gastam fortunas com
taxas para estarem presentes.
– Me diga falou BP sabe se o
escoteirinho de Brejo Seco conseguiu ir em um Jamboree? Nem pensar General. A
taxa que cobram é só para ricos. Me contaram-me que os lideres gostam de
cobrar. Afinal eles tem agora uma organização que dizem ser perfeita. Adoram
taxar tudo que fazem e até cobram também do que os outros fazem. Tem uma loja
que só eles podem vender seus produtos e os preços não são acessíveis. Os mais
pobres e humildes não tem vez. A palavra de ordem é: - Escotismo é para ricos!
- BP pensou: - Coitado do escoteirinho de Brejo Seco. – Olhe General, a direção
escoteira brasileira se apropriou de muitos termos e programas que o senhor
fez. Registrou tudo como se fossem os donos. Surgiram outras associações e são
tratadas a ferro e fogo. Todas levadas às raias dos tribunais de justiça. Esqueceram
do sexto artigo e estão esquecendo da fraternidade. Do nosso uniforme que
usamos lá na terra muito foi alterado.
Fazem questão de praticar um
escotismo moderno, estão tentando apagar o passado, as tradições e só se
preocupam com o presente. Os novos chefes a gente sabe, passa a ser um hábito
de comportamento e formação. Criaram novo uniforme e quer saber general? São
mais de dezoito tipos a escolher. Disseram que um antigo poderia ser usado, mas
não vendem as peças em sua loja. É comum colocar o lenço amarrado nas pontas e
se dizer Escoteiro. Tem muita coisa general. Muita mesmo. Eles agem sem
consultar ninguém. Não há transparência do que fazem. Pesquisas? Nunca
existiram. Felizmente boa parte dos chefes são pais novos e desconhecem as
tradições.
Lord Baden-Powell olhou para o
seu planeta azul. Rezou muito. Pediu ao Senhor que suas idéias não fossem
desvirtuadas, que o amor e a fraternidade através do escotismo seja em forma de
uma grande fraternidade mundial. Lady Olave chegava com John Thurman. Este
sorriu e disse – Eu já sabia General. Em 1954 antes de vir para cá, deixei para
eles uma mensagem onde escrevi com todos os meus conhecimentos adquiridos. O
chamei de os Sete Perigos. Disse tudo que poderia acontecer. Falei sobre
administração, sobre centralização, Seriedade demasiada, falei sobre
exclusividade transparência e austeridade. Disse o que o senhor pensava sobre o
escotismo entre os pobres. Falei da sua simplicidade e do prazer do rapazes que
faziam um escotismo simples. E terminei dizendo que os únicos capazes de por o
escotismo a perder são os próprios chefes e dirigentes. Finalizei dizendo que se nos tornarmos arrogantes, complacentes e a nos fazermos
passar por demasiado auto-suficientes, então - e apenas com essas coisas -
poderemos arruinar o Movimento.
Lord Baden-Powell perguntou ao
seu amigo Kenneth: Sabe
me dizer se o Vado Escoteiro já chegou? – Não General, ele ainda vai ficar na
terra por mais algum tempo. Ele anda meio “pitimbado” mas escreve sobre
escotismo e muitos não gostam do que diz. Os chefões e dirigentes nem dão bola
ao que ele comenta. BP não disse mais nada. Era
hora do grande cerimonial de Bandeira que todas as tardes acontecia em sua colônia.
Pelo menos ali a disciplina, a fraternidade e o respeito era comemorado em
todos os dias da semana. – Parou cumprimentou a todos na enorme ferradura e ao
comando de arriar a bandeira fez sua saudação Escoteira com orgulho. Ele sabia que nunca deu procuração a ninguém
para falar em seu nome. Afinal o escotismo não tinha dono, ele era dos que
quisessem seguir sua cartilha. Olhou de novo o planeta azul ajoelhou e pediu ao
Senhor que fizesse da Terra e do Brasil um mundo feliz para todos os
Escoteiros!