domingo, 18 de agosto de 2013

Ser ou não ser eis a questão! Será que vale a pena?



Crônica de um Chefe Escoteiro.
Ser ou não ser eis a questão!
Será que vale a pena?

Todos os dias em me pergunto. Vale a pena continuar a postar aqui? Sou insistente e não desisto fácil, mas estou ficando cansado. Os resultados por desconhecer não me dão muita consistência. Muitos me chamam de contador de histórias, bem é verdade eu escrevo muitas histórias. Mas só isto? E os meus artigos mostrando novos caminhos? Alguns sugerindo, outros comentando, outros dando palpites como fomos, como estamos e como seremos. Verdade? Não. Como fomos talvez sim. Como estamos sim e como seremos é difícil pensar. Mas voltemos ao contador de histórias. Quem sabe meus artigos também não são histórias? Aí eu me pergunto será que sirvo só para isto? Contar histórias? Risos.

        É difícil tentar levar aos novos chefes ideias que não sejam as que eles conhecem e fazem agora. Dezenas de cursos dão a eles novos caminhos. Eu sei que os resultados para eles não virá facilmente. Não sei se entendem. São firmes em suas ideias e acreditam no que fazem e olhe não estão errados. Afinal não viveram como era antes e a não ser por ouvir falar e não acreditam que era melhor que hoje. E nem pode. Tudo seria ótimo e formidável no agora, no que fazemos. Quando pergunto quantos tem alcateias completas, se alguém conheceu alcateias masculinas e femininas separadas e também completas comparar com as mistas de hoje? E as patrulhas? Unidas por muitos e muitos anos? Fizeram grandes atividades ao ar livre conforme prescrito no programa e método de Baden Powell? Ou só podem dizer que ouviram falar?

      Fico pensando no contador de histórias que sou. Lobinho por quase quatro anos, Escoteiro por mais de quatro anos, sênior mais ou menos três anos, pioneiro dois anos, Chefe de Alcateia três anos, Chefe de tropa dez anos, de seniores dois, anos, mestre pioneiro... Putz só seis meses. Várias vezes Diretor Técnico, aos trancos e barrancos consegui a IM lobo, Escoteiro e Chefe de Grupo. Dois cursos avançados. Duas vezes Comissário Distrital, Muitas vezes assistente regional, Comissário Regional por sete anos, membro da Equipe de Formação por muito e muito tempo, tendo a honra de dirigir mais de duzentos cursos e ter conhecido mais de cinco mil alunos amigos escoteiros em vários deles. E as cidades e estados e alguns países que visitei? E os cursos, Indabas, Acampamentos distritais que fiz com eles? E hoje? Um aposentado. Como dizem por aí, ele é um simples contador de história. Sabem? Eu gosto disto. Dizem que contar histórias é uma arte. Mas será que sou arteiro? Risos. Mas eu me preocupo com o resultado. Não o seu resultado em seu grupo (detesto esta palavra meu grupo, ninguém é dono de ninguém) e sim o resultado final da formação que estamos dando aos jovens quando eles se tornarem adultos.

      Sabe o resultado que cobro? Este humilde contador de histórias pensa pequeno. Pelo menos quinhentos mil escoteiros em nosso país. Muito? Temos setenta e poucos mil e nossos lideres dão risadas. Isto é motivo de orgulho? A população brasileira que nasceu nos últimos quarenta anos supera em mais de mil por cento os novos que chegaram ao escotismo. Será que temos gente que foi Escoteiro em todas as camadas sociais nos representando e falando bem da gente? Isto não são resultados? Temos? Quantos CEOS (altos executivos) que nos apoiam nas quinhentas maiores empresas brasileiras? Alguns deles visitam o grupo onde nasceram? Alguns deles são escotistas? Isto se eles foram escoteiros que fique bem claro. Quantos professores reconhecidos em seu meio e na sociedade literária falam bem de nós? E na politica? Esta é difícil. Não gosto dela. A maioria deles pelo que fazem não da para acreditar que possam ter sido escoteiros. Ali não se vê nunca o espírito Escoteiro. Pode até ter um e outro, mas são poucos. Mais difícil ainda é ver os resultados que esperamos nos órgãos governamentais. Apesar de sermos apolíticos, vivemos da fonte de renda paga por todos associados. Começando em cinco reais em algum grupo, tanto para a região e o saldo da UEB. Enquanto em outros países grandes ex-escoteiros doam somas valiosas ao movimento e centenas de profissionais Escoteiros trabalham incessantemente na busca de sócios beneméritos aqui nada disto acontece.

       Mas que seja eu sou mesmo um simples contador de história. Meus sessenta e cinco anos de escotismo me deram outra visão. Não as mesmas dos amigos escotistas que tem o mesmo tempo de movimento que tenho. Eles estão em outro patamar. Quem sabe mais elevado que o meu. Mas isto é bom, é democrático. Daria tudo para ver todos pensando e sugerindo dentro dos princípios da democracia. Ficar pensando que minhas ideias são as melhores é formidável. Será mesmo? Não. Não sou o dono da verdade. Já olhou para dentro do grupo em que colabora e viu os resultados dos últimos dez anos? Sei que muitos tem o que se orgulhar e outros não. Meus amigos, minhas amigas, abram um leque, pois o escotismo não é isto que está acontecendo hoje. Não é. Estão esquecendo em muito o que deveria ser. Eu não contento com pouco. Não mesmo. Não sou de bater palmas para dirigentes. Eles tem a obrigação de acertar. Estão representando milhares de associados. O contador de histórias que sou não deve conhecer muito como poderíamos acertar e diferenciar. E eu concordo com quem pensa assim de mim. Nunca em minha vida fui de tomar decisões só. Sempre fiz questão em minha vida escoteira e familiar tomar decisões em conjunto.

         Acho que é por isto que o contador de historias não é bem visto quando escrevo algum que não agrada. Peço desculpas. Já pensei em parar várias vezes. Sempre me perguntando se está valendo a pena. Não sei se vale. Nada mudou e acho que nada vai mudar. Desculpe dizer, mas a aceitação do hoje nunca vai mudar o amanhã e o passado foi enterrado sem homenagens. Seguir a pista é ótimo, mas fazer a pista também. Muitos só sabem seguir a pista. Esqueceram-se de aprender a fazer o caminho a evitar. É certo isto? E sabem? Continuo pensando, será que vale a pena continuar? Ou seria melhor ser somente um contador de historias? Bah! Contador de histórias mais parece um contador de causos nas lindas praças das belas cidades onde os velhos como eu se reúnem. Contar, narrar apenas para divertir. Risos.


         Desculpem mas ainda estou pensando se vale a pena. O corpo esbelto do Chefe Escoteiro do passado (risos) e das fotos de hoje não mostra seu cansaço, sua saúde e até quando tudo isto vai durar. Mas apesar das mil histórias e contos que contei nada tem a ver com Sherazade que para não ser degolada contava uma história atrás da outra para o Rei da Pérsia. As mil e uma noites poderão ser um dia meus contos, mas eu juro que aprendi um pouco de escotismo e como fazê-lo. Afinal nem sei por que estou dizendo isto, todos não dizem que eu sou um bom Contador de Histórias?


terça-feira, 13 de agosto de 2013

Se não tens ouro esqueça. Nunca será um Escoteiro!

Para os pobres, é dura lex, sed lex. A lei é dura, mas é a lei.
Para os ricos, é dura lex, sed latex. “A lei é dura, mas estica”.



 Se não tens ouro esqueça. Nunca será um Escoteiro!

           Existe um velho ditado não escrito que diz: Nem tudo que reluz é ouro, nem tudo o que balança cai. Interessante e curioso é que o último desses versos repete textualmente uma máxima de Montaigne, que diz: - Tout ce qui branle ne tombe pas. Em síntese nada a ver com o que pretendo escrever. Risos. Mas é interessante, pois folheando frases e fotos aqui e ali ainda vejo esporadicamente meninos maltrapilhos com um lenço no pescoço e dizeres lindos como – Eles também querem ser escoteiros. Têm aqueles outros que já estão em um patamar mais elevado. Ganharam ou adquiriram uma camiseta com dizeres do grupo (a propaganda é a alma do negócio) e assim se apresentam como escoteiros. Mas não duvidem eles são realmente escoteiros e já vi alguém dizendo que não é o uniforme que faz o Escoteiro. Pode ser e concordo. Mas precisa ser e não parecer ser. Não é assim que dizem da donzela ou da mulher de Cesar?

          Eu não tenho dados concretos, mas imagino que mais da metade de nossos Grupos Escoteiros são de origem humilde. Lutam com dificuldade e alguns deles a gente se orgulha em conhecer e visitar. Dá gosto. Estão bem apresentados e fazem da sua postura um marketing que leva o nome Escoteiro aos Píncaros da Gloria. Orgulhamo-nos quando o vemos. Mas cada caso é um caso e não vou generalizar. Em nome da pobreza tem alguns que se comprazem em se contradizer e insistir na pobreza. Não é difícil fazer escotismo sem meios financeiros. Os erros natos de alguns dirigentes é querer mostrar quantidade em vez de qualidade. Sabemos por principio que qualquer grupo bem estruturado começou com poucos. Isto faz parte da formação escoteira. Se vamos trabalhar com monitores eles sim serão os primeiros e os demais virão com o tempo.

          Sabendo onde colocar os pés, e alçando voo aos poucos qualquer grupo Escoteiro poderá ter tudo àquilo que precisa. No passado estas discussões atuais de que para ser Escoteiro tem de ser rico não existia. Conheci meninos cujos pais não tinham nada e os filhos sempre bem uniformizados e com sua tralha escoteira completa. Compete ao Escotista preparar cada um para que ele acredite em si mesmo, que ele aprenda a andar com suas próprias pernas e ele claro irá dar valor ao que adquiriu com seu próprio suor. Não sou muito a favor de sempre dizer que eles nada tem e precisam de ajuda. Parece esmola. Conheci centenas de grupos que todos pagavam sua taxa mensal sem problema. Taxa esta que era acessível aos participantes. Foi combinada e decidida por todos.

         Aprender com os outros é bom. Que são diferentes cada comunidade uma com as outras é real, mas isto não significa que o Grupo Escoteiro não possa trabalhar com o manancial existente nela. Centenas de grupos espalhados em todos os estados brasileiros fazem atividades escoteiras ao ar livre sempre. Acampamentos, excursões, atividades aventureiras enfim, nunca se apertaram por ser pobres. Portanto não sou muito de ter comiseração com os que choram e não procuram aprender como acertar. Participei de três grupos escoteiros em comunidades carentes e fizemos esplêndidas atividades escoteiras. Conheci jovens que demoraram meses e meses para adquirir seu uniforme, mas adquiriram. Como líder de uma região escoteira fizemos juntos com diversos chefes grandes atividades regionais. Facilitamos o mais possível. O intuito não era e nunca foi o de fazer caixa para a região e sim dar aos jovens o sonho de conhecer centenas de irmãos e confraternizar em todas as atividades típicas escoteiras.

          Que me desculpem alguns chefes hoje vejo muitos deles que não dão conta do que podem fazer e realizar. Um Velho ditado diz que quem quer faz quem não quer arruma uma desculpa. Muitas vezes em cursos que participei vi alunos apresentando centenas de problemas em seus grupos de origem. Sempre comentava sobre a velha história escrita por Helbert Hubbard que escreveu há muitos anos um artigo que ficou marcado para sempre e até hoje serve de exemplo em todas as nações. Hoje grandes personalidades dão como exemplo, e surpreendentemente é exaltada em cursos de dirigentes, de Diretores, de CEOS e tantos outros. Trata-se da Mensagem a Garcia. Um herói da Guerra de Cuba foi o protagonista de tudo. Vejamos uma parte do artigo:

- Quando irrompeu a guerra entre a Espanha e os Estados Unidos, o que importava a estes era comunicar-se rapidamente com o chefe dos insurretos, Garcia, que se sabia encontrar-se em alguma fortaleza no interior do sertão cubano, mas sem que se pudesse precisar exatamente onde. Era impossível comunicar-se com ele pelo correio ou pelo telégrafo. No entanto, o Presidente tinha que tratar de assegurar-se da sua colaboração, e isto o quanto antes. Que fazer? Alguém lembrou ao Presidente: "Há um homem chamado Rowan; e se alguma pessoa é capaz de encontrar Garcia, há de ser Rowan". Rowan foi trazido à presença do Presidente, que lhe confiou uma carta com a incumbência de entregá-la a Garcia. De como este homem, Rowan, tomou a carta, meteu-a num invólucro impermeável, amarrou-a sobre o peito, e, após quatro dias, saltou, de um barco sem coberta, alta noite, nas costas de Cuba; de como se embrenhou no sertão, para depois de três semanas, surgir do outro lado da ilha, tendo atravessado a pé um país hostil e entregando a carta a Garcia - são coisas que não vêm ao caso narrar aqui pormenorizadamente. “O ponto que desejo frisar é este: Mac Kinley deu a Rowan uma carta para ser entregue a Garcia; Rowan pegou a carta e nem sequer perguntou:” Onde é que ele está?”“.

Hosannah! Eis aí um homem cujo busto merecia ser fundido em bronze imarcescível e sua estátua colocada em cada escola do país sem esquecer também que todos os grupos escoteiros mereceriam tal estátua. Não é de sabedoria livresca que a juventude precisa, nem instrução sobre isto ou aquilo. Precisa, sim, de um endurecimento das vértebras, para poder mostrar-se altivo no exercício de um cargo; para atuar com diligência, para dar conta do recado; para, em suma, levar uma mensagem a Garcia.

               O General Garcia já não é deste mundo, mas há outros Garcias por aí. A nenhum homem que se tenha empenhado em levar avante um Grupo ou uma tropa escoteira, em que a ajuda de muitos se torne precisa, têm sido poupados momentos de verdadeiro desespero ante a imbecilidade de grande número de homens, ante a inabilidade ou falta de disposição de concentrar a mente numa determinada coisa e fazê-la. Não quero de maneira nenhuma culpar aos nossos dignos chefes escoteiros de até hoje não terem conseguido levar a mensagem a Garcia. Claro sei de muitos que assim o fazem sem se mostrarem ser possuídos de liderança incomum. Nosso movimento sofre de uma letargia crônica. Achamos que temos de nos preocuparmos com o atual e muitas vezes deixamos de programar o futuro, pois só ele nos trará os resultados esperado. Deixo o final do meu artigo para o próprio Helbert Hubbard fechar com chave de ouro suas observações e que cada Chefe se coloque na pele daqueles que são citados não como uma empresa, mas sim como se fosse o seu Grupo Escoteiro ou sua tropa:

- Leitor amigo, tu mesmo podes tirar a prova. Estás sentado no teu escritório, rodeado de meia dúzia de empregados. Pois bem, chama um deles e pede-lhe: "Queira ter a bondade de consultar a enciclopédia e de me fazer uma descrição sucinta da vida de Corrégio". Dar-se-á o caso do empregado dizer calmamente: "Sim, Senhor" e executar o que se lhe pediu? Nada disso! Olhar-te-á perplexo e de soslaio para fazer uma ou mais das seguintes perguntas: Quem é ele? Que enciclopédia? Onde é que está a enciclopédia? Fui eu acaso contratado para fazer isso? Não quer dizer Bismark? E se Carlos o fizesse? Já morreu? Precisa disso com urgência? Não será melhor que eu traga o livro para que o senhor mesmo procure o que quer? Para que quer saber isso?

- E aposto dez contra um que, depois de haveres respondido a tais perguntas, e explicado a maneira de procurar os dados pedidos e a razão por que deles precisas, teu empregado irá pedir a um companheiro que o ajude a encontrar Garcia, e, depois voltará para te dizer que tal homem não existe. Conheço um homem de aptidões realmente brilhantes, mas sem a fibra precisa para gerir um negócio próprio e que ademais se torna completamente inútil para qualquer outra pessoa, devido a suspeita insana que constantemente abriga de que seu patrão o esteja oprimindo ou tencione oprimi-lo. Sem poder mandar, não tolera que alguém o mande. Se lhe fosse confiada uma mensagem a Garcia, retrucaria provavelmente: "Leve-a você mesmo".

Hoje este homem perambula errante pelas ruas em busca de trabalho, em quase petição de miséria. No entanto, ninguém que o conheça se aventura a dar-lhe trabalho porque é a personificação do descontentamento e do espírito de réplica. Refratário a qualquer conselho ou admoestação, a única coisa capaz de nele produzir algum efeito seria um bom pontapé dado com a ponta de uma bota de número 42, sola grossa e bico largo. Sei, não resta dúvida, que um indivíduo moralmente aleijado como este, não é menos digno de compaixão que um fisicamente aleijado. Entretanto, nesta demonstração de compaixão, vertamos também uma lágrima pelos homens que se esforçam por levar avante uma grande empresa, cujas horas de trabalho não estão limitadas pelo som do apito e cujos cabelos ficam prematuramente encanecidos na incessante luta em que estão empenhados contra a indiferença desdenhosa, contra a imbecilidade crassa e a ingratidão atroz, justamente daqueles que, sem o seu espírito empreendedor, andariam famintos e sem lar.

Dar-se-á o caso de eu ter pintado a situação em cores demasiado carregadas? Pode ser que sim; mas, quando todo mundo se apraz em divagações quero lançar uma palavra de simpatia ao homem que imprime êxito a um empreendimento, ao homem que, a despeito de uma porção de empecilhos, sabe dirigir e coordenar os esforços de outros e que, após o triunfo, talvez verifique que nada ganhou; nada, salvo a sua mera subsistência. Também eu carreguei marmitas e trabalhei como jornaleiro, como, também tenho sido patrão. Sei, portanto, que alguma coisa se pode dizer de ambos os lados.

          Nosso movimento precisa de uma sacudidela, de mostrar a todos nós que não estamos vendo tudo que precisamos ver. Que o ouro que dizem por aí que precisamos para ser Escoteiro esteja dentro das próprias ideias, dos próprios passos e tenho certeza que fazendo isto iremos ter um escotismo forte e unido não só em quantidade, mas também em qualidade.

Essa história de que o dinheiro não dá felicidade é um boato espalhado pelos ricos para que os pobres não tenham muita inveja deles.



domingo, 11 de agosto de 2013

A TODOS OS PAIS AMIGOS OU NÃO.



A TODOS OS PAIS AMIGOS OU NÃO.

Gostaria de escrever a história de cada um. Impossível. Impossível também colocar a foto de todos. Sei o que é ser pai Escoteiro, viver o escotismo e dar aos filhos o amor que eles esperam de nós. Não é fácil. Minha homenagem a todos que aqui no Facebook compartilham de minha amizade. Sinto-me honrado em ter tantos amigos pais. FELIZ DIA DOS PAIS CAROS PAIS ESCOTEIROS!

Ele era o meu pai

Não tivemos um relacionamento muito próximo. Talvez pela época, onde o respeito e a palavra senhor fazia parte do nosso vocabulário. Pequenos momentos talvez. Ele me contou diversos fatos de sua vida. Não muitos porque se fosse hoje eu queria saber muito mais. Não foi um pai diferente dos outros e nem tampouco excepcional. Mas para mim foi aquele que admirei e admiro até hoje. 

Quando pequeno, não sabia o que se passava não me preocupava com o dia, a semana, o ano. Ia à escola e depois era só brincar. Na minha casa morava eu, minhas duas irmãs, minha mãe. Achava que éramos uma família feliz apesar de pobre. De uma pequena cidade só lembro-me de uma casinha branca, próximo ao cemitério. Por dentro não me lembro de nada. De outra cidade, lembro-me da casa, de madeira, fundos para o rio e embaixo em um porão com piso de terra, alguns pobres aproveitavam a seca do rio para ali morarem. Quando chovia o rio invadia tudo. Também éramos muito pobres, pois em volta de uma pequena mesa, sentávamos em caixotes para as refeições.

Graças a Deus que nunca passamos fome. Dificuldades sim. Elas existiam e eu pequeno não tomava conhecimento. O café da manhã, o almoço e o jantar sempre existiram. Meu pai nesta época era Seleiro, aquele que fazia selas para cavalos e outros apetrechos afins.  Eu pequeno, 06 para 07 anos não ajudava a não ser aos sábados e domingo. Nestes dias ajudava a engraxar os sapatos de vários clientes do meu pai. Tornei-me um excelente engraxate. Lembro-me do Grupo Escolar, do colégio, mas não me lembro de meu pai em momento algum me chamando a atenção ou brigando comigo. Era calmo e ponderado. Nunca em tempo algum me encostou a mão e por muito poucas vezes falou mais alto.

Sei que as manas e ele com muito sacrifício compraram um terreno e construíram um barracão em um bairro na periferia da cidade. Nele tinha o meu quarto próprio. Eu gostava de morar ali. Apesar de não ter ainda água encanada da rua, havia uma cisterna com uma bomba manual. Todos que tomavam banho teriam que usar a bomba por mais de 100 vezes. Assim, mantínhamos a caixa cheia e o serviço feito por todos. Meu pai alugou um salão próximo ao centro. Ali montou uma oficina de rádio. Tinha estudado por correspondência e já era um perito no assunto. Achava que meu pai era muito inteligente. Tentei fazer o mesmo curso, mas não deu certo. Talvez porque não era bom aluno ou quem sabe não era o que queria fazer. Após as aulas ia trabalhar com ele e ver se aprendia alguma coisa na prática.

Ele me deixava ficar com a quantia dos serviços que realizava. Muito poucos por sinal, mas dava para ir ao um cinema, acampar e namorar. Nesta época já trocávamos idéias e ele com sua sapiência me mostrava algumas diretrizes da vida. Conversamos pouco. Foi ali que alguns fatos de sua vida me foram relatados, com parcimônia é claro. Uma de quando moramos em uma fazenda de um tio meu, eu ainda com três para quatro anos, (não me lembro de nada a não ser da casa, pois posteriormente passei algumas férias lá) e o que ele fazia nunca soube.

Uma vez comentou comigo sobre a revolução de 32 (constitucionalista). Ele jovem ainda se alistou. No inicio tudo era festa para ele e seu amigo um tal de Sebastião Barrigada. Andaram por aqui, por ali, até que foram levados de caminhão a uma pequena cidade já dentro do território paulista. No primeiro confronto, foi só correria. Os paulistas inventaram uma matraca que imitava perfeitamente o pipocar de uma metralhadora ponto 30. Quando começou o barulho foi um Deus nos acuda. Depois virou rotina, ninguém mais tinha medo, pois já sabiam o que era. Estavam em uma tarde em uma trincheira, deitados e o matraquear das metralhadoras pipocavam ali e lá. Seu amigo ficou em pé e começou a chingar os paulistas e rindo dizendo que com a mineirada eles não eram de nada. Meu pai gritou para o Bastião deitar. Ele não obedeceu. Achava que era mais uma piada dos paulistas. Em dado momento o Bastião deitou de vez. Meu pai disse para ele, você deita ou não deita? E olhando viu que ele tinha um grande buraco na testa e do outro lado pedaços de seu miolo jaziam por todo o lado. Foi de estarrecer ele disse.

Não contou mais de sua luta, da sua militância política da revolução enfim de muitas outras coisas que eu gostaria de saber.  Sabia que ele gostava do partido da UDN e odiava o PSD. Porque não sei. O tempo passou. Ele ficou doente, quase morreu. Minhas irmãs o levaram para a capital. Lá achavam que ele teria melhores chances. Depois ficamos sabendo que era diabete. Pouco conhecida na época. Muitos anos depois, morando na mesma cidade, aos domingos me dirigia a casa dele, passava lá o dia inteiro, mas conversávamos pouco. Acho que não havia assuntos, mas quanta coisa poderia ter sabido se tivesse perguntado.

Sua vida foi sem sobressaltos. Doente, andava aqui e ali fazendo pequenas caminhadas. O que sentia não perguntei. Devia ter perguntado. Ele nada dizia. Morreu em uma semana qualquer há muitos e muitos anos. Fui ao enterro e chorei. Pensava no meu pai e o quanto poderíamos ter conversado. Hoje, espírita que sou acho que ele não deve ter tido dificuldades para alcançar um lugar melhor para ficar. Senti e sinto falta do meu pai. Hoje com quatro filhos e muitos netos, me pergunto por que não ficamos mais próximos. Ele era assim e eu também. Ainda sou meio taciturno com os meus filhos. Herança? Não sei. Quero me aproximar e não consigo. O mundo é assim. O livre arbítrio nos faz escolher caminhos que nem sempre são aqueles que deviam ser escolhidos. Faz parte do nosso crescimento.


Um dia vou me encontrar com ele. As perguntas que não fiz a farei. Se as respostas forem a que espero ótimo se não forem paciência. Este era o meu pai. Um homem calado, bondoso, amigo que me deixou fazer o que queria. Nunca em tempo algum me fez qualquer admoestação. Que ele seja feliz onde quer que esteja e que na sua próxima encarnação encontre de novo a felicidade que merece.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

O Chifre de Kudu.

Conversa ao pé do fogo.
O Chifre de Kudu.



             O Kudu (Tregelaphus strepsiceros) é uma espécie de antílope cujo habitat vai desde a África do Sul á Etiópia. Um touro Kudu pode chegar a uma altura de 1,5 metros e tem uma coloração que vai de um cinzento avermelhado até quase azul. As suas características de visão aguçada, bom sentido de audição, olfato apurado e grande velocidade fazem dele um animal difícil de capturar. Seguindo uma tradição que remonta há 90 anos, as patrulhas são chamadas a reunir com o toque tradicional do chifre de Kudu, durante os cursos da Insígnia de Madeira. Pode parecer estranho que o chifre de um antílope africano, do tipo usado pelos Matabeles como clarim de guerra no século XIX, seja usado para chamar Escuteiros e Chefes por esse mundo fora. Mas foi precisamente com um toque deste chifre que os primeiros Escoteiros foram acordados.

Quando reuniu os primeiros escoteiros em Brownsea, Baden-Powell lembrou-se do chifre de Kudu que tinha trazido das guerras contra os Matabeles, e usou-o para dar um toque de aventura e divertimento ao acampamento. De facto, foi durante o acampamento experimental de Brownsea, em Poole Harbour, no verão de 1907, que Baden-Powell colocou ao serviço do Escotismo, e pela primeira vez, o chifre de Kudu. William Hillcourt, um dos grandes pioneiros do Escotismo, o mesmo que escreveu o resumo da história de BP no final do «Escotismo para Rapazes», descreve assim a primeira alvorada em Brownsea:

"O dia começou ás 6h da manhã, quando BP acordou o acampamento com o som esquisito do longo chifre de Kudu em espiral - o clarim de guerra que tinha trazido da sua expedição à floresta de Somabula durante a Campanha Matabele de 1896".

John Thurman, grande nome do Escotismo britânico, conta como BP conheceu o chifre de Kudu:

"Como coronel em África, em 1896, Baden-Powell comandou uma coluna militar na Campanha Matabele. Foi num raid pelo rio Shangani abaixo que ele primeiro ouviu o som do chifre de Kudu. Ele andava confundido pela rapidez com que os alarmes eram espalhados entre os Matabeles, até que um dia se apercebeu que eles usavam o chifre de Kudu, o qual tinha uma grande potência sonora. Era usado um código. Assim que o inimigo era avistado, o alarme era tocado no Kudu, para todos os lados, e assim transmitido por muitas milhas em pouco tempo."

Depois da ilha de Brownsea, o chifre de Kudu voltou para a casa de BP onde permaneceu silenciosamente durante 12 anos, enquanto o movimento que ele anunciara se tornava moda e se espalhava pelo mundo fora. Então, em 1919, Baden-Powell entregou o chifre ao Parque de Gilwell para ser usado nos primeiros cursos para treino de Chefes. William Hillcourt comenta assim o início do uso do chifre de Kudu no Parque de Gilwell, na floresta de Epping, Inglaterra, a oito de Setembro de 1919:
"O primeiro acampamento para treino de chefes feito em Gilwell começou a oito de Setembro. Seguiu o padrão que BP tinha usado com os rapazes em Brownsea, 12 anos atrás. O sistema de patrulhas foi novamente posto á prova com 19 participantes divididos em patrulhas e vivendo uma vida em patrulha. A instrução tomou a mesma forma que em Brownsea. Cada dia um assunto novo era introduzido e aplicado em demonstrações, prática e jogos. O chifre de Kudu dos Matabeles que tinha sido usado para chamar os rapazes em Brownsea foi usado para todos os sinais."

              Dez anos mais tarde, aos 72 anos de idade, Baden-Powell levou consigo o chifre de Kudu para a abertura do 3º Jamboree Mundial, em Arrowe Park, Birkenhead, Inglaterra, a 28 de Julho de 1929. Foi constatado, pela experiência de Arrowe Park, que fazer soar o chifre de Kudu é um desafio. Os resultados, no entanto, foram tão impressionantes quanto se poderia desejar, segundo as palavras de William Hillcourt:

            "O dia da abertura do 3º Jamboree Mundial começou com uma forte chuvada que aumentou com o passar do dia; mas, à hora prevista... o tempo tornou-se «ameno». BP tinha trazido consigo para Arrowe Park o velho chifre de Kudu dos dias da guerra com os Matabeles que tinha sido usado para acordar os acampados em Brownsea no primeiro acampamento de escuteiros do mundo e para abrir o primeiro curso para chefes no Parque de Gilwell. Levou-o aos lábios para dar um toque que haveria de ecoar pela extensa parada em frente dele, mas, com o excitamento, os lábios recusaram-se a fazer o que deviam. O som do chifre não passou de um fraco «pff». No entanto, como que chamados para a ação pelo chifre, a marcha começou, com os contingentes a desfilarem atrás de contingentes em frente da plateia, com as bandeiras de quase todas as nações civilizadas desfraldadas ao vento, com milhares de pessoas a aplaudirem cada nação entusiasticamente.”.


             Ainda hoje o chifre é usado para reunir chefes em cursos de formação em todo o mundo. Para todos os que seguem as pegadas do fundador, é um viver do Escotismo no seu melhor.