domingo, 26 de junho de 2016

“A morte lhe cai bem”.


Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro “Gagá”.
“A morte lhe cai bem”.

             Juro por Deus que não sei como fui parar em Curitiba. Dizem que é uma linda cidade, mas o frio lá é de lascar. Meu pulmão reclama e diz que vai parar de me dar ar para respirar. Mas lá estava eu, na sede da UEB, ou melhor, EB (até hoje não sei por que da mudança, o U era União e como apareceram outras associações Escoteiras não bem vindas, não havia mais razão de ser União, ou existe outra explicação?) – Bem pelo menos não fui de boa vontade. Detesto empáfia, corro de vaidade e soberba. Altivez arrogância e presunção eu passo longe. Não que lá na sede central da EB tem gente assim. Soube que tem muita gente boa, trabalhadora e honesta. Afinal é a terra do Moro um juiz que moralizou o Brasil. Continuando, não fui por cortesia. Fui obrigado. Ameaçaram matar meu papagaio se não acompanhasse os dois profissionais escoteiros que trabalham lá. Eram jovens simpáticos, não os meus tipos de Chefe, mas dava para o gasto. Um deles com um bastão maior que o meu e o outro com seis apitos pendurados no pescoço e oito tacos enfiados em um cadarço. Se ele começasse a apitar seria um inferno na minha rua.

             Com a dinheirama que eles tem em caixa nem de avião fomos. Levaram-me em um fusca Velho, verde e amarelo que queimava óleo “prá dedéu”. A viagem foi um inferno. Levei meu aparelho de inalação e queria a toda hora parar em um posto para inalar. Eles achavam que eu estava fazendo pirraça. Meus aparelhinhos pulmonares não ajudavam. Enfim dois dias de viagem para fazer 400 quilômetros. Fusca é fusca, mas aquele era um fusca de araque. Achei a sede nacional bonita. Bem cuidada. Pudera a dinheirama entrava a rodo. Eu sabia das taxas de tudo. Perguntei se havia taxa para entrar como o Edir Macedo cobrava no seu novo templo. Eles fecharam a cara e me jogaram em uma saleta. – Aguarde! “A Comissão de Ética” já vai chegar. O que? Comissão de Ética? O que eu fiz? Sou inocente. Juro por Deus e Nossa Senhora. Sou apenas um Velho Chefe Escoteiro Gagá e dizem que pé de chinelo dos bons! Eles nem respostas deram.

            Ouvi vozes em uma sala ao lado. Quem seriam? O DEN? O CAN? Este povo não trabalha e só faz reunião? – Uma voz disse: - Precisamos aumentar as mensalidades e taxas conforme o dólar! – Outro disse, nem pensar, o dólar sobe e desce e não podemos arriscar. Nosso caixa está ficando baixo! E o Euro? Ou melhor, a Libra? – Bah! Então era assim as decisões? Não prometeram transparência? Eu sabia que isto nunca existiu na UEB, Cacilda, esqueci, agora é EB. – Outro disse: Ele já chegou? – Tente usar a técnica da CIA nele. Se não der certo veja o manual da KGB. – Minha nossa! Seria eu? – Bem não demorou e entrou um deles. Vestido com a indefectível vestimenta, calça bombacha, tênis branco, camisa fora da calça, com aquele ar de Velho Lobo todo poderoso me olhou de alto a baixo. Pensei comigo: - Atuo como o Velho Vado Escoteiro bom de briga, ou fico naquela de santinho do pau oco? Ele sentou a minha frente. – Chefe, anda dizendo que seus escritos são melhores que da EB, diz também que é de graça, comenta sobre patrulhas, monitores, comenta sobre Baden-Powell como se fosse o tal. E termina dizendo: - Tudo de graça!  

           Olhei para ele e não disse nada. – Sabe que está tirando o pão da UEB? E o leite das crianças? Nossa cantina tem tudo, os melhores livros escritos por gente que sabe o que queremos. Precisamos vender. Já temos mais de nove funcionários para atender a todo Brasil. E vem você com esta conversa mole de PDF, gratuito, como se você fosse o papa do escotismo! Agora vem com um papo que nossa vestimenta é mal feita, desbota, não tem uma boa confecção. O que pretende? Acha que este caqui fajuto que veste serve para alguma coisa? Se ele custou cem reais e daí? Nossa vestimenta tem 19 tipos, cada um com um preço. Com quaisquer trezentas pilas você adquire um. Compra quem quiser! – Olhei para ele. Ele me olhou. – Quem quiser? Perguntei. Ele virou a cara. – Continuei compra que precisa, não tem outro lugar para vender e nem pode fazer! – Ele se levantou e gritou: Entre a comissão! A técnica da CIA e da KGB não adiantou. Mande entrar também um soldado graduado do Estado Islâmico. Se possivel aquele que usa a espada para decepar pescoço de chefes escoteiros fajutos!

           Meu Deus! Onde estava? Na Síria? No Iraque? Em Fallujah? – Tentei fugir e não deu. Um deles disse? Amarre-o bem. Use um nó de escota, outro de arnês. Se precisar um volta do fiel triplo. Nas pernas um nó de frade e outro de volta da ribeira bem apertado. Para ele não fugir, faça um Balso pelo seio com alças corrediças. Leve-o na Ponte das Bandeiras sobre o Rio Tietê. Cubra-o com folhas de bananeiras e enfie em sua goela uma porção de abobora seca. Depois jogue-o no rio. Deixe que as piranhas nos livre dele! – Chefe Doutor Mortalha, no Tietê não tem Piranhas! Disse um membro da Comissão. – Então faça-o viver o som da mata ouvindo o rio feder em seus ouvidos. Faça-o cantar embaixo d’água no meio da sujeira. Dizem que lá tem capivara e Jacaré, quem sabe eles o comem vivo? – Minha Nossa Senhora! B-P que me proteja. Morro gritando ou morro como herói? A porta abriu. O Presidente entrou. O presidente da EB e não o Michel Temer o interino brasileiro. – Cala-te ele gritou. Morra como homem! Chefe Doutor, eu sou só um Velho Escoteiro e olhe fajuto mesmo! Ele sorriu. Aquele sorriso que só Hitler sabia como fazer.


          Gritava e gritava. Berrava: - Tietê não! Me leve para o São Francisco, lá em Pirapora. Lá eu conheço as barrancas, as fazendas os peixes e as embarcações. Eles riam a valer. – Célia como sempre a me salvar – Marido! Marido! De novo não! Precisa acabar com estes pesadelos infernais! Acorda! Acorda! – Minha linda Célia sempre me salvando. Levantei suado. Não sei por que dormi com meu caqui querido. Celia preciso a partir de hoje só dormir com meu bastão de ponteira de aço ao meu lado. Ela sorriu aquele sorriso que só ela sabe dar. Acalmei. Escotismo? Bom demais, mas sempre digo Vado Escoteiro, fale menos e escreva mais!

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Procura-se um Presidente.


Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro Gagá.
Procura-se um Presidente.

                 Era para ser outro artigo: - Procura-se um Presidente para o Brasil. Presidente? Não serve o da União dos escoteiros do Brasil? – Não. Não serve. Ele foi escolhido por uma comissão de poucos e não eleito por muitos. Basta os Presidentes interinos, substitutos ou sob a tutela de militares. Pensei em Joaquim Barbosa aquele ministro que mandou para a prisão uma cambada que se achava protegida por um manto da impunidade. Mas ele não ia servir. Não era da boquinha, dos conchavos com deputados e senadores, não era de dar colher de chá a empreiteiros e enganadores. Ele nunca seria Presidente. Quem então? Difícil dizer e escolher. Se procurarmos na tal União Parlamentar Escoteira iremos tomar um susto. Quantos lá estão sendo processados na Lava Jato? Não sei e nem quero saber. Lá não tem ninguém que preste e se tem ele já devia ter tomado seu rumo para ser Chefe Escoteiro em uma tribo indígena no Xingu. Pensei em sugerir uma Grande Assembleia Nacional dos Escoteiros onde todos poderiam participar, com voz voto eleger e ser eleito. E você Escoteiro, acredita nisto?

                 Será que nossos irmãos escoteiros iriam “topar”! – Não sei. A turma de chefes mais esperançosa e benemérita sempre iria nos lembrar do velho “mantra” – Precisamos trabalhar com os meninos, dar a eles um pouco de alegria e paz no coração. É lindo isto, mas só isto basta? Não adianta insistir nesta tecla. Os novos que chegam estão aprendendo a filosofar, a obedecer sem discutir, a ter um tutor ou assessor e a lavagem cerebral é perfeita. Pensei em fazer um curso de Assessor. Seria para mim o máximo. Já pensou? Voltando ao chefe que um dia chega à conclusão que nem tudo está certo e que algo precisa mudar. Aí ele olha para o Brasil. Afinal ele é um trabalhador, um homem honesto e mesmo não tendo sido Escoteiro aprendeu com seus pais o que é honra caráter e palavra. Nas suas andanças vê as enormes discrepâncias entre grupos e chefes que praticam a ideologia de B-P. Sente na pele que o escotismo para todos tão apregoado não é. Preocupa-se em ver que um movimento tão nobre e idealista, cheio de fraternidade está se tornando elitista, onde poucos decidem os destinos da Associação.

                  Ele então olha em volta. Olha a politica do estado brasileiro. Olha quantos políticos maus caráter temos nos postos chaves da nação. Sente-se humilhado por ver patrícios usando de prerrogativas para enriquecerem e permanecerem eternamente no poder. Isto assusta. Ele se pergunta: - Onde vamos arrumar um Presidente que dê jeito em nosso pais? Ele é um homem ou uma mulher inteligente. Lê jornais, ouve comentários na TV, conversa com seus amigos no seu trabalho. Não acredita mais em santinhos, em promessas e se pergunta: - Afinal porque um Politico se interessa em indicar ou até brigar para colocar um protegido seu em alguma benesse governamental? É seu papel? Ele foi eleito para isto? Sua mente corre velozmente e volta ao escotismo. E nós? Onde vamos chegar? Como só 0,5% do nosso efetivo tem direito a escolher nossos dirigentes? Porque não todos? Mas ele sabe que é uma voz sozinha na escuridão. Os conhecedores, políticos escoteiros tem a resposta na ponta da língua. Afinal porque isto? Para meia dúzia usufruir do poder?

                     Ele é novato, não tem ainda a experiência mateira e nem lhe contaram tudo das tradições que são deslocadas ou alteradas em nome de uma nova concepção escoteira. Lê um artigo Escoteiro em uma rede social onde o autor dizia que uma Chefe Escoteira quase foi a única a decidir o novo uniforme a quem chamaram de vestimenta. Tinha tudo à mão. Ideias, sugestões, o dom da palavra e melhor ainda trabalhava em uma organização que podia lhe dar uma mão. E que mão. Como não tinha experiência com antigos escoteiros e estes todos sabem que não tem direito a opinar convenceu a alguns poucos a mudar. Nem pensou em tradição. Mudou e pronto. – Foi bom para você a mudança? Só faltou o cigarrinho que hoje está afastado das hostes Escoteiras. Um truste foi formado. Só um tinha direito em confeccionar e vender. Mais de 80.000 clientes cativos. Mas e dai Chefe? Ele perguntou. E o Presidente?

                       Ninguem respondeu. Presidente de que, do Brasil ou da UEB? Quem? Quem? Quem poderia mudar a estrutura, dar liberdade, dar direitos e dizer que a democracia é assim, o que é meu é seu. Meus direitos são os seus direitos. A duvida dele é a minha. Quanto tempo ele ainda vai ficar no escotismo eu não sei. Nas minhas andanças em trilhas diminutas da minha vida escoteira vi muitos abandonando a estrada do escotismo. Milhares? Quem sabe sim. Por quê? Não me pergunte. Pergunte a UEB, ou melhor, EB. Mas e finalmente precisamos ou não de um Presidente? – De que? Do Brasil ou da UEB? Da UEB é perda de tempo. São três em uma comissão que não foram eleitos e pouco mandam. Foram escolhidos por outra comissão eleita por 0,5% do nosso efetivo nacional. O que se passa no reino de Abrantes nem eu sei. A historia conta que um General encontrou seu país sem governo, Um Principe regente que fugiu para o Brasil (logo o Brasil?) Ele assumiu o poder rindo. Quem lhe perguntasse como iam as coisas, a resposta na ponta da língua: - Está tudo como dantes no quartel d’Abrantes!     


                       Mas e então Chefe, onde vamos achar um presidente? Do Brasil ou da UEB? O primeiro vai ser difícil o segundo meu amigo depende de você! 

terça-feira, 21 de junho de 2016

O custo para ser chefe vale à pena?


Conversa ao pé do fogo.
O custo para ser chefe vale à pena?

         Não é um tema interessante? Não sei. Pode ser que sim para alguns e não para outros. Mas eu lhe pergunto quanto você gasta para ser Chefe Escoteiro? Ou uma Chefe Escoteira? Muito pouco? Razoável? Além do que pode gastar? Os amigos devem estar estranhando porque entrei nesse tema. Por quê? Olhem, tenho tentado defender por todos os meios o que os dirigentes de Regiões, distritos ou a própria UEB fazem. Contam-me cada uma. Não vou repetir aqui todas aqui, mas as principais se referem à tecnocracia de alguns dirigentes, ou mesmo a “arrogância de outros” “ou o profissionalismo de muitos” pensando que os gastos são absorvidos com facilidade pelos chefes escoteiros. Acho que somos os únicos voluntários que gastam do seu próprio bolso para ajudar e colaborar com os filhos dos outros. Outros? Bem tem muitos que dizem que vale a pena.

         Verdade. Para alguns pode não ser muito. Para outros, que no fim do mês olham as contas de água, luz, telefone, gás, internet, prestação A, B e C, colégio ou material didático dos filhos ficam deveras assustados. E o salário? Sumindo! Alguns perderam o emprego e agora José? E mesmo assim vem aquele curso, aquele Jamboree, o acampamento, aquela atividade linda programada pelo Distrito. Soube e não sei se é verdade que jovens em um grupo que os pais perderam o emprego e não podem pagar a mensalidade foram dispensados. Como fazer? - Grupos Escoteiros devem estar estruturados para isso. São eles que arcam com essas despesas, dizem os impolutos chefes de grupos bem estruturados. Verdade mesmo? Vocês acreditam nisso? Eu não. Pode ser que uns privilegiados o façam, mas a grande maioria não.

         Se a esposa, ou a família não participa, sempre existe aquele ressentimento. Você devia pagar isso, comprar aquilo e não ficar gastando com o escotismo. Mas o menino não tinha condições! Tinha de ajudá-lo. E o curso? Precisava fazer. E assim vai. - Família! Eu acho que eu vou ao Jamboree. São apenas uns três mil reais e olhe cobrirá boa parte quem sabe pago menos, pois vou me oferecer para ser Staff! Se calcularem bem não é caro. Ele esqueceu-se das despesas de transporte, alimentação ida e volta e tantas outras. E o curso? A diária é mínima. Já me disseram que é menor do que uma diária de um hotel quatro estrelas! Afinal preciso “tirar” minha Insígnia da Madeira. Será que ele não está enganando a si próprio? Já calculou quando vai gastar logo no inicio do ano, onde tantas contas para pagar estão sobre a mesa e mesmo assim acha que dá para fazer o tal curso ou ir naquela atividade escoteira?

            Finalmente ele chega lá, e vê tantos figurões, gente linda, bem uniformizada, (?) de lenço da Insígnia, batendo no peito, sorridente bom emprego, agora chefão e o coitado do novo Chefe diz para si próprio – Agora sim, vou aprender tudo! Desculpem a brincadeira. Sem ofensas aos bravos membros formadores da UEB. Bravos sim. Sei do trabalho insano que fazem para ajudar o Escotismo Brasileiro. Conheço vários que se sacrificam muito para ajudar em um curso por ano, com duas ou três palestras. Um trabalhão. Posso falar de cátedra, fui um deles no passado. Sofri como eles. E claro, gastei do meu bolso como eles! Recompensa? Ver o sorriso, o abraço de alunos se confraternizando e dizendo que não é mais que um até logo, anotações de telefone e endereço e ao ir para casa dizer: Escreva-me! Adorei conhecer você! Ele vai para casa pensando: - “Foi um lindo curso”. Dou risadas é na avaliação final. Poucos discordam. Só elogios. Entendo, ainda não receberam o certificado de aprovação. Vá discordar por quê? Risos. 

          Sem criticas. Sou “danado” para criticar. Risos. Não estou lá agora. Nem sei como é. Mas sei como era. Lutava para baratear a taxa. Brigava mesmo por isso. Aqui em Sampa havia um executivo profissional na região. Ele andava. Visitava supermercados. De uniforme, ganhava muita coisa do cardápio. Eu mesmo convidava pais ou outros chefes para ajudar na cozinha quando cursos onde não se usavam barracas. O pau de toda obra era a Patrulha de Serviço. Jovens de grupos que nos ajudavam. Grandes jovens. Devíamos muito a eles na época. A região não nadava em dinheiro, mas sempre dava um jeitinho para ajudar. (agora sei que algumas têm um caixa supimpa) Eu mesmo fiz curso sem pagar nada. Fazíamos um escotismo sem pretensão de sobrar valores da taxa para a região. (e com uma prestação de contas perfeita). E hoje, ainda é assim?

          Estão rindo? Outra época? Deve ser. Hoje os profissionais substituíram os amadores do passado. Acho que eu era um amador. Podem dizer assim, eu gostava mesmo de ser um amador. De conseguir auxilio em todos os lugares para ajudar aos jovens a participar de atividades regionais, ou mesmo distritais. Foram diversas. Uma taxa “pequenina, infinitamente pequena”. Com orgulho lá estavam patrulhas de toda a região ou do distrito. Muitos que abandonam o escotismo sempre reclamam do alto custo. Todos já disseram e eu repito, quando Baden Powell fundou o escotismo, era para os jovens humildes e pobres. Hoje ele virou elitista, só se pensa “naquilo”! (lucro).

           Perguntem aos chefes escoteiros do Brasil. Perguntem aos que se foram. Principalmente a muitos Insígnias da Madeira que não mais estão na ativa.  Não perguntem a mim. São eles que comentam sempre. Das dificuldades de um Escotista hoje ser um participante ativo em todas as atividades nacionais, regionais e distritais. (sem considerar a de grupo). Claro que muitos vão dizer – Eu amo o escotismo, trabalho por ele e acredito que posso ajudar. Portanto não reclamo em gastar! Certo. Cada um faz o que gosta e eu aceito. Tremo todo quando vejo lá o valor da tal taxa. Convidam-me para muitas comemorações, atividades, mas a danada da taxa está lá. Ufa! Haja tostões para pagar em todos os convites. 

             Ei! Será que não dá para diminuir um pouco estas taxas? Não? Vocês as acham pequenas? Um aqui do meu estado disse que são menores que diárias de hotéis. Risos. Hotéis? Só para quem não conhece como é. Acampamento, barracas, cozinha de barro e lona, fraternidade em patrulha, todos ajudando e a comida saindo. Bom demais... Quanto foi? Não importa, dizem que isto é passado, hoje não tem almoço grátis. Isto eu sei, mas perguntem ao Escoteirinho de Brejo Seco e o seu Chefe o Zé das Quantas. Quanto podem gastar. – Chefe, sou carroceiro, ganho pouco, mas sou honesto e trabalhador. Tenho honra e caráter. Procuro ser amigo dos meus escoteiros e ajudar em tudo que posso, mas não dá para pagar para eles! Parodiando minha Avó, “quem pode, pode, quem não pode se sacode”! Enquanto isto encha os bolsos se quiser ser um voluntário e colaborar para a formação de nossa juventude Escoteira.


Eu não sou pobre, apenas um rico em dificuldade...

sábado, 18 de junho de 2016

Se precisar... Chamem os Escoteiros!


Hoje tem reunião, alegria de montão.
Se precisar... Chamem os Escoteiros!

             Hoje tem reunião, alegria de montão. Lembrei-me desta história que um dia contei ao chegar a um grupo escoteiro – Alguns Chefes riram e disseram: Isto nunca vai acontecer. Acho que o senhor está criando uma história que não é real. Bem real ou não aconteceu. E como as histórias das mil e uma noites que servem para nos mostrar um novo caminho para o sucesso. Conto a história como se ela tivesse existido, afinal não é bom sonhar? Claro com os pés no chão. Aqui nas minhas parcas letras eu faço dos meus sonhos a minha realidade.  É bom demais contar e ver que a realidade pode sim transformar o impossível no autêntico. Vamos logo aos entretantos e aos finalmente. Em 1976 viajava para Santana dos Verdes Mares para encontrar um Velho amigo. Na BR-245 no quilômetro 567 uma luz vermelha acendeu no painel. Fiquei preocupado e logo na frente uma placa indicava que eu estava próximo à cidade de Sonhos Dourados. No trevo tomei o rumo da cidade. Precisava encontrar um eletricista e voltar a minha viagem para Santana dos Verdes Mares.

             Fiquei maravilhado com o pórtico na entrada da cidade. Estava escrito – Sonhos Dourados – 35.000 habitantes onde a felicidade existe. Não esqueçam, precisando chamem os Escoteiros! Caramba! O que é isto? Precisava saber tudo sobre os escoteiros da cidade. Afinal sou metido a escritor e uma cidade assim não pode ficar oculta. Vi uma placa onde dizia: Hotel Baden Powell. Parei. Uma moça sorridente me recebeu na recepção. Na lapela uma linda flor de lis. – Pois não Senhor? – Moça, um quarto só para hoje. Não era para pernoitar, o plano era consertar o carro e partir, mas senti um aroma Escoteiro no ar. Após os transmites legais perguntei a ela onde encontraria um eletricista – No final da Rua Senhor. Procure o Chefe Robin, ele conhece e bem. Ele é Escoteiro? Sim senhor ela respondeu. Ele me recebeu efusivamente. Não me apresentei como Escoteiro, mas o danado trabalhava no meu carro e perguntava. – Conhece o Movimento Escoteiro? Dizer o que? Afinal não juramos dizer sempre a verdade? Apresentei-me e ele me cumprimentou com a esquerda, fez uma saudação e falou alto – Seja bem vindo Chefe a nossa cidade!

            O carro ficou pronto e ele não me deixou ir embora. Pegou o telefone e ligou para vários chefes. Chefe5 todos querem conhecê-lo. Vamos para o Restaurante do Chefe Joel. Já lanchou? Não me deixou falar mais nada. Pegou sua C-10 e lá fomos nós. Parece brincadeira, mas é verdade. Contei por alto uns 45 adultos e todos uniformizados. E olhe não parava de chegar outros. Uma festa. Abraços, saudações, e até beijinhos da turma feminina. Uma grande mesa em forma de “U” foi montada. Aos poucos me contavam sobre a cidade e os Escoteiros. Eram seis associações escoteiras, uma da UEB, uma da FET, uma AEPB, uma dos Escoteiros Florestais, uma dos Tradicionais e os Desbravadores. – Olhe Chefe, aqui tem também uma Companhia Bandeirante e somos bons amigos. Hoje não encontrei nenhuma delas, mas antes de partir o senhor vai conhecer sem sombra de dúvida. Que coisa. Quem podia imaginar?

           Fiquei na cidade por dois dias. Passei um telegrama para o Chefe que ia visitar em Santana dos Verdes Mares e disse que logo chegaria. Todas as associações escoteiras tinham o máximo respeito uma das outras e se consideravam irmãos. Napolitano uma espécie de líder de todos, entrando nos seus 90 anos me disse que só a UEB era contra, mas ali no grupo ninguém ligava. Acampavam juntos, faziam atividades juntos e o respeito da cidade pelos Escoteiros, desbravadores e bandeirantes era enorme. As atividades da UEB eles não participavam, mas não havia ressentimentos ao contrário nas atividades que eles programavam todos iam em peso. Era supimpa nos cursos das outras associações. Pena que os cursos da UEB não autorizavam a participação deles. E depois dizem que o sexto artigo diz que somos amigos e irmão dos demais escoteiros. Estava comovido e revoltado. Meu Deus! Não dizem que somos irmãos e amigos de todos? O que os meninos têm com esta forma de atuação? O que eles devem pensar da filosofia escoteira? Da Fraternidade que tanto falamos?

           Pois é Chefe. Já estiveram em nossa cidade dirigentes da UEB tentando tudo para que todos adotassem o escotismo Uebeano. Olhe que todos aqui na cidade receberam a todos de braços abertos. Mas eles foram irredutíveis. Pedimos para que abrissem uma exceção e eles recusaram. Mas quer saber? Não nos preocupamos com isto. Aqui somos felizes assim. A cidade inteira sabe que pode contar com os escoteiros. Tudo começou quando a Favela do Circo Feliz pegou fogo. Quase cem famílias ao relento. Sem perceber todas as organizações deram as mãos. Os mais velhos a construir casas de madeira. Os menores de casa em casa com sacolas recebendo roupas e víveres. Mais de quatrocentos adultos trabalhando dia e noite. O prefeito era Escoteiro, o delegado também. Doutor Fontes o Juiz idem. A cidade em peso veio ver e era tanta gente querendo ajudar que muitos chefes tiveram de organizar todos em patrulhas. Risos. Aprendemos a lição e hoje sempre fazemos boas ações em conjunto. Não vou dizer que não houve dissidências, houve sim. E não foram poucas, no entanto aqueles que nasceram com espírito Escoteiro se mantiveram firmes na irmandade.

            Um dos chefes saiu do grupo e resolveu fundar outro dentro das normas da associação que não queria confraternizar conosco. Não teve procura. A cidade em peso ficou sabendo. Nenhum pai queria matricular o filho lá. Ainda estão vivos. É um Grupo Escoteiro pequeno. Tentamos ser amigos e eles irredutíveis a nos chamar de traidores. Tudo bem até o dia que a sede deles pegou fogo. Lá estávamos nós a ajudar. Doamos material de sapa, barracas, mesas, cadeiras, cordas bandeiras, enfim eles viram que no escotismo somos todos irmãos. Não se admite o contrário. Fiquei em Sonhos Dourados dois dias. Sempre volto lá anualmente. Estive no Jamboree que organizaram. Um espetáculo. Quase tudo grátis. Mais de 15.000 participantes. Uma pena que os da UEB são caros e até Chefia do Staff paga. E olhe vi com estes olhos que a terra a de comer que era tudo na base do Sistema de Patrulhas. Não como alguns acampamentos nacionais ou regionais onde a preocupação é divertir individualmente.


             Bem meus irmãos escoteiros. Apenas uma história. Uma lenda? Um sonho? Mas seria lindo se fosse real. Já pensou se todos nós fossemos um só e irmãos escoteiros? Divergir por escolhas que não a nossa? Aceitar a disciplina que não concorda? Afinal onde foi parar a lei escoteira, em uma só associação? É incrível que alguns ainda digam que somos todos irmãos e na realidade a imposição e ameaças destroem tudo aquilo que acreditamos ser fraternal. Pena que acordei do meu sonho. A cidade de Sonhos Dourados não existia. Mas eu daria a minha vida que ela e todas as que possuem escotismo tivessem também aquele amor, aquele respeito e saber que seja o que formos somos sim, todos irmãos!

quarta-feira, 15 de junho de 2016

O Primeiro Grupo de Gilwell.


Conversa ao pé do fogo.
O Primeiro Grupo de Gilwell.

“John Thurman Chefe de campo de Gilwell Park”. 1943/1969.
“Talvez pareça um contratempo dizer que o espírito de um homem permaneça depois que ele tenha desaparecido”. Porem no caso de B-P e a forma que ele influiu em Gilwell, constituem-se em uma grande verdade. É o espírito da tolerância, da alegria e camaradagem, de reflexão de preparação e generosidade, que se esboçou em seu livro Escotismo para Rapazes e que através dos anos tem se espalhado de Gilwell para o mundo... Portanto o lugar trata de manter vivo o espírito do melhor ensinamento de B-P. que se manterá vivo não por sentimentalismo, mas sim porque uma mensagem eterna, e todo mundo atual precisa da medicina que ele nos forneceu de forma tão generosa. –

     Todos os escotistas que conquistaram a Insígnia da Madeira (IM), em quaisquer pais reconhecidos pela Organização Mundial Escoteira (WOSM), passam a ser membros do 1º Grupo de Gilwell, do qual B-P é reconhecido como Chefe de Grupo Perpétuo. É um grupo único, bastante original, que rompe todas as regras e normas do mundo, não possuindo Assembleias, Diretoria, Conselheiros e Programa. Reúne-se  uma vez ao ano em Gilwell no primeiro ou segundo fim de semana de setembro. Muito de seus membros nunca participaram ou visitaram e talvez nunca o façam, porém se sentem orgulhosos em integrar este grupo.  Não são seres superiores e nem devem se sentir como tais, mas sim por terem despendidos esforços significativos na participação de um esquema de capacitação e experimentando uma forma impar de vida no campo. (É comum quando em alguma atividade se reúnem vários chefes portadores da IM realizarem um encontro do Primeiro Grupo de Gilwell).

     A Insígnia da madeira, em si, não tem nenhum valor, são duas contas de madeira, pendentes em um cordão, porem, para todos que a conquistaram, é um sinal de orgulho, pois representa a universalidade de Gilwell e de seu treinamento, que embora tenha sofrido atualizações ao longo dos anos e adaptações à realidade de cada pais, se mantém impregnado pelo espírito de fraternidade e eficiência como idealizou   B-P.

               Em 1919, durante o 1º curso de chefes no Parque de Gilwell, Inglaterra, curso este, chamado de Curso Oficial de Treinamento de Escoteiros, surgiu uma questão importante nos pensamentos de Baden-Powell. Qual seria o distintivo especial que deveria ser fornecido aos escotistas que fossem aprovados neste curso. Baden-Powell disse: “—Não permitiremos dar a eles então, qualquer distintivo normal, daremos justamente um pedaço de madeira com uma correia de couro que chamaremos de “woodbadge” – Insígnia da Madeira.” Para os adultos no Movimento Escoteiro, Gilwell é sinônimo de formação e conhecimento. Escotistas em mais de 120 países trabalham para alcançar sua Insígnia da Madeira nos Cursos de Gilwell, de acordo com a tradição iniciada por Baden-Powell em 1919. Ao receber sua IM, os Chefes Escoteiros passam a pertencer ao 1° Grupo de Gilwell, o maior Grupo Escoteiro do mundo, do qual B-P é o Chefe Perpétuo.

O Colar de contas.
                Então Baden-Powell elaborou com uma tira de couro que lhe foi dada por um amigo africano e, uma das contas do colar original do Rei Dinizulú. Um símbolo de conclusão desse curso, que durou, do dia 08 de setembro de 1919, uma segunda-feira até 19 de setembro do mesmo ano, sexta-feira, e determinou aos alunos que confeccionassem a sua segunda conta, ficando convencionado que seria chamada de “Insígnia da Madeira” lembrando o material da qual era feita. Sendo utilizada, conjuntamente, com um lenço e um anel de lenço constituído de um nó chamado de cabeça de turco, criados por Baden-Powell e Francis “Skipper” Gidney, o primeiro Chefe de Campo do Parque Gilwell, visto que, não era costume usar lenço escoteiro e anel de lenço, e sim, gravatas. Os primeiros colares foram utilizados sob o chapéu escoteiro, hábito logo substituído para utilizá-lo em volta do pescoço.

Significado e valores associados.
A partir do significado simbólico que lhe é atribuída, é possível anunciar um conjunto de valores associados à Insígnia que devem estar sempre presente ao Escotista, seu portador. Um primeiro grupo de valores é a da idoneidade: seu portador deve ser um Escotista formado e qualificado para exercer a missão de educador, com uma competência reconhecida através da pratica de um escotismo de alta qualidade. Um segundo grupo de valores tem a ver com a idoneidade moral: sendo o Escotismo um método de educação baseados na pratica de princípios morais expressos na Lei e na Promessa Escoteira, o educador que é chamado a aplicar tal método não pode, ele mesmo, deixar de ser um exemplo de vivencia desses princípios essa é, por conseguinte, uma condição a exigir aos portadores da Insígnia da Madeira.

Um terceiro grupo, decorrente do anterior, tem a ver com a firmeza do compromisso assumido, como segue uma responsabilidade de aplicação das suas competências ao serviço dos jovens. Uma responsabilidade de auto avaliação continua e permanente, no sentido desenvolver cada vez mais aquelas competências e de dar cada vez mais testemunho daqueles valores; uma responsabilidade de disponibilidade pessoal e de abertura, sem a qual os anteriores não são possíveis. A IM não é um salvo conduto para quem deseja ser um líder de uma região ou da nacional para exercer cargos eletivos ou não. Isto deve ser pela competência ou conhecimentos de sua área de atuação. Por tudo isto, finalmente, a Insígnia da Madeira deve ser vista como um desafio e nunca como uma distinção ou  premio.

O uso como peça do traje ou uniforme Escoteiro.
 O uso do colar e do arganel são apropriados em todas as circunstancias em que seu portador se apresente em traje e/ou uniforme regulamentar. Em atividades dirigidas, primeiramente, aos jovens, sugere-se que os portadores da IM NÃO DEVEM USAR O LENÇO DE GILWELL, devendo limitar-se a usar o colar e o arganel com o lenço regulamentar do órgão (grupo, distrito, região e/ou nacional) que representa em reuniões, atividades ou eventos em vez do Lenço de Gilwell. O uso do lenço de Gilwell é exclusivamente em atividades de formação no sentido amplo, isto é, nas ações para formação propriamente ditas e ainda nas reuniões, cursos e atividades que de alguma forma tenha ligação com a formação de Escotistas, restrito ou não a portadores da IM.

Da IM, que compreende as terceiras e quartas contas, permanecem  de propriedade da Associação Nacional, a quem seu portador deve devolver quando solicitado por quem o nomeou.

segunda-feira, 13 de junho de 2016

O Grande Acampamento no céu.


Crônicas escoteiras.
O Grande Acampamento no céu.

                 Abri os olhos devagar. Parecia que estava dormindo há muito tempo e o que via não era conhecido mesmo nas minhas andanças na Terra. Avistei uma floresta, mas cujo verde estava desbotado. Lembrei-me de algum na terra, mas não sabia o que era. A SSE um grande numero de barracas, muitas mal armadas e algumas caídas no chão. Barracas eram bom sinal e me aproximei. Sorri contente, pois vi que era um acampamento Escoteiro. Gigantesco. Chefes ali aqui e lá. Quantos chefes nem dava para contar. Poucos me deram sempre alerta. Pareciam estar preocupados com outras coisas. Um zum zum no ar me chamou atenção. Alguém disse que iria ter a abertura oficial da Assembleia dos Escoteiros do Além. Ops! Que isto? Estava morto? Belisquei-me e não senti nada. Era mesmo um defunto vagando e fui parar ali. Havia placas, havia hot door espalhados por toda área do acampamento em muitos idiomas sinal que era um acampamento internacional. Vi faixas da BSA Boy Scouts of America, da CES Confederação Europeia de Escotismo, AEBP Associação des Ecalireurs B-P do Canada, da AGESCI Associazione Guides e Scouts Cattolici Italiano, ASDE Federação de Asociaciones de Scout de Espanha, da OWS Ordem of World Scout e outras centenas delas.

                     Estava espantado. Seria que tinha chegado ao tal Grande Acampamento do céu? Um Chefe do Sudão parou em minha frente e com aquela fleuma inglesa sapecou no seu inglês aristocrático perfeito (eu falava todos os idiomas) – Senhor Chefe Osvaldo, o Mestre Baden-Powell quer vê-lo imediatamente. Nossa! Era ele! Atendi prontamente. Mesmo com as pernas atrofiadas saí correndo. B-P me chamou tá chamado! Era meu mestre e atender correndo seria um ato disciplinar. Sua barraca era uma das poucas bem armadas, de um verde limão lindo de morrer (Ops eu já estava morto!). Entrei ele veio me abraçar. Não sem antes juntar os cascos, na melhor apresentação de um General Inglês e sapecar um delicioso Be Prepared! – Sorrindo completou – Você sabia que na Inglaterra escolheram esta saudação só porque as duas primeiras letras era B_P e gargalhou a moda de oficiais britânicos.

                      Sente aqui Chefe. Sentei em um banco feito da melhor peroba rosa que já vi, bem feito, cipós descascados, amarras no ponto e a mesa um lindo tampão com uma costura de arremate incrível. Precisava aprender. Mas ele me interrompeu – Chefe eu acho melhor o senhor colocar sua mochila e partir. Aqui não é seu lugar. Assustei. Já tinha comentado antes com amigos escoteiros na terra que não iria ficar ali, se passasse pelo acampamento era para dar um abraço e um sempre alerta aos meus amigos que já se foram. Iria ver meu mestre dizer quanto o admiro e lhe dar um abraço apertado do tipo dos Zulus quando se encontravam. Afinal era meu mestre Mundial. – Porque partir Mestre? - Se ficar vai se aborrecer. Os bons partem logo e os snobes, arrogantes e fúteis acham que ainda estão na terra atuando para serem os lideres sem ouvir os demais interessados. Veja você, tem gente da Inglaterra, da França, da Itália dos Estados Unidos e porque não do Brasil lutando para serem o Escoteiro Chefe do Espaço Sideral.

                     Nossa! Aqui também? – E sabe Chefe disse B-P a turma do Brasil tem anos que está preparando um tal de Regimento Interno, onde os eleitos se perpetuam no poder, onde só eles podem determinar sem consultar, sem ver os interesses e onde ninguém pode escolher seu líder. – Pensei que nunca poderia imaginar tal coisa. – Continuou B-P eu não moro aqui. Estou numa galáxia muito distante. Venho aqui vez ou outra vez se salvo alguma alma escoteira de boa vontade e espírito Escoteiro. Olhe lá na Galáxia de Andrômeda, tem um planeta que eu chamo de Xangri-lá, onde todos são felizes. É lá Chefe que os meninos escoteiros e chefes puros do coração quando vem para o céu vão morar. É lá que é o verdadeiro Grande Acampamento eterno. Veja eles com seus chapelões, seus lenços brilhantes, observe seus sonhos, sua imagem de anjo do céu. São valorosos escoteiros e seus chefes com coração sublime lá estão também.

                      Fiquei sério. Olhei B-P e disse – Vou seguir seu conselho. Vou partir para Andrômeda. Acho que lá me sentirei bem fazendo um escotismo simples, de amor, de paz e respeito entre os homens. Acho que lá encontrarei a verdadeira fraternidade escoteira e meus amigos que vieram na minha frente. Já ia sair quando na porta quatro chefões brasileiros me deram voz de prisão. – Por quê? Não interessa disseram. Vais direto para a Comissão de Ética da Ordem Capetória mundial. – O que eu fiz? Eles riram e enquanto riam uma fumaça negra saia de suas narinas. Vestimentados, cada um de uma cor, mas desbotados, de sandálias ainda tinha dois deles só com um lenço vermelho pegando fogo no pescoço um pelado e outro de short. – Você se acha o tal, se acha que pode criticar a turminha da liderança brasileira, acha que pode resolver o problema Escoteiro no Brasil. O Grande Conselho discutiu e lhe condenou morar para sempre no Acampamento do Inferno! Mama mia! Desta vez entrei pelo cano.

                      - Olhei para B-P e ele tinha sumido. Ele me avisou. As forças do mal eram maior que ele. Eu sabia disto. Na terra muitos se achavam mais que ele. Criticavam, procuravam seus defeitos, diziam que o tempo do bom velhinho já passou. Os tais doutores pedagogos agora se achavam acima do Grande Lider, aquele que foi aclamado por milhões de escoteiros como o Escoteiro Chefe Mundial. Tentei correr, levei uma bastonada na cabeça. Não tinha como reagir, estava sem meu bastão de ponteira de aço, sem meu cabo que se transformava em um chicote mortal. Desarmado me fizeram como uma armação de bigas, como se fosse um grande jogo para eles. Fui arrastado e sem ninguém para ajudar. B-P tinha me prevenido. Agora via que ali a subserviência, o medo da admoestação das ameaças não eram simples palavras. Todos tinham um medo enorme. Sem perceber me Lembrei da terra.


                          Gritava a mais não poder. Mesmo Velho rouco e sem voz tentei abençoá-los, pois sempre me diziam que devemos abraçar nossos amigos e inimigos, tentei cantar uma canção escoteira, daquela que quando nas dificuldades eu cantava em meus acampamentos e nas minhas jornadas: - ♫♫ Põe tuas mágoas bem no fundo do bornal e sorri! O que importa é vencer o mal por isto mantem sua alegria! – Não adiantou. Arrastavam-me como se eu fosse uma bola em um jogo de críquete. Eu berrava, gritava gemia e pedia a Deus para me salvar. Alguém me beliscava, dizia que me amava para que eu parasse de gritar. Acordei! Era minha querida Célia a me abraçar. Chorava, ela perguntou o que tinha sonhado. Nem pensar Célia, nem pensar. Neste grande acampamento no céu nunca mais... Nunca mais...

quarta-feira, 8 de junho de 2016

O frio chegou para ficar.


Conversa ao pé do fogo.
O frio chegou para ficar.

                      Nada contra o frio. Dependendo a hora e lugar ele é benvindo. Mas hoje com meus 75 anos cheio de “pobremas” o frio me faz mal e muito mal. O homem do Jaleco branco disse que o pulmão não gosta. Eu sei disto. Começo a sentir falta de ar, fraqueza e a tremer como se fosse meu dia de promessa. Encho-me de roupas meias e o escambal. Até ganhei um aquecedor, mas o danado manda a conta de luz nas alturas. Prefiro os acampamentos. Nada que uma boa fogueira não pode resolver. A tarde apareceu um solzinho meio perdido no céu. Corri até o passeio e me refastelei. Fechei os olhos e voltei ao passado a lembrar das minhas andanças mochileiras com meu chapéu de abas largas a enfrentar a poeira o calor e o frio. Celia ao meu lado se assustou. Comecei a dar belas gargalhas. Pequenas nuances surgiram na minha mente em noites de frio escoteirando. Vejamos algumas que lembrei.

- Um acampamento de Tropa e muitos chefes novatos. Eu tinha facilidades em arregimentar pais e eles acreditavam na minha performance escoteira comprando a filosofia com amor. O local um pé de serra, uma mata, uma lagoa e o sol que se escondia às três da tarde nas montanhas. Eu sempre gostei de inventar “patacas” para dar um sabor ao acampamento e a vida mateira. Contei para eles que fazia questão do banho das três e meia da manhã. Era meu conto predileto que muitos acreditavam. Olhavam-me cismados e pensando se era verdade. À tardinha uma névoa sobrevoava a lagoa. As patrulhas em seus campos faziam o jantar. Lá fomos nós uma Tropa de doze chefes para o banho do dia. Era um local onde uma enorme queda d’água trazida por bambus gigantes jorravam uma verdadeira cachoeira. Ao cair levantava nevoas geladas que assustavam qualquer um. A tarde se foi e escurecendo o frio era dos meus velhos conhecidos. Acho que a temperatura já tinha chegado à casa dos dez graus. Mostrei que era o herói e entrei naquela cachoeira gelada. Foi demais. Todos me seguiram reclamando.  

                    Foi então que no retorno disse que haveria outro banho ali às três e meia da manhã. Olharam-me estupefatos. - Vai mesmo Chefe? – Chamo vocês às três e quinze. Tem o ritual do sabão mágico! Um silencio sepulcral. – Chefe, de manhã a temperatura vai estar em dois ou três graus! – E dai? Falei. Acendemos um fogo para uma conversa gostosa, mas ninguém falava nada. Fomos dormir por volta das onze e meia da noite. Ouvia gostosamente eles em duas barracas Bangalô reclamando – Eu não vou! Isto é um absurdo! Se ser Escoteiro é assim acho que isto é coisa de doido! – Outro mais comedido dizia: - Ficará mal para nós com o Chefe. Ele acredita em nós – E assim foi à conversa até que todos dormiram. As três e quinze soltei uma bomba de um tiro que ribombou por toda área onde estávamos. Levantaram espavoridos. – Eu sorrindo, de tanga e toalha nos ombros só disse: - Chegou a hora, vamos todos em fila para nosso banho mágico – Quem foi? Meia dúzia os demais diziam que preferiram sair do escotismo. Dei boas gargalhadas e voltei a dormir.

                   Outra vez foi um curso próximo a Belo Horizonte. Um local durante o dia lindo. Três nascentes que faziam a água borbulhar saindo do chão. Pareciam estar fervendo. Puro engano, mais fria que um picolé de geladeira. Eram 26 alunos. Só uma cidade compareceu com nove. O Distrital um professor universitário me contou que o escotismo abriu seu coração para sempre. No primeiro dia (eram quatro dias de curso) um frio de lascar. De manhã encontrei boa parte em volta de uma fogueira enrolado em seus cobertores – Chefe, tá demais, deste jeito vamos virar gelo do ártico. Mostrei para eles meu fogão reflector – Façam um eu disse e vão dormir só de short! O dia passou. As barracas de nylon eram muito finas. Região pobre ainda sem um bom material de campo. O curso estava sendo divertido, lembro que o Chefe João de Juiz de Fora (padre João) naquele curso não deu um sorriso sequer.

                    Eis que no amanhecer do terceiro dia ao dar o sinal de alvorada vi que somente 14 alunos compareceram para a física. Procuramos os demais barracas vazias. Ronaldo e Blair assistentes do curso disseram que tinha ouvido algum deles sobre desistir. O curso não parou. Mesmo com 14 fomos em frente. Que eu saiba foi o primeiro curso Escoteiro onde os alunos se amotinaram e deixaram o campo de batalha. Encontrei-os novamente dois meses depois em uma Indaba. Cabeça baixa quase choraram ao me dizer: - Chefe, não aguentei. Maldito que sou por desistir. Disse a todos que deveríamos ter feito o fogo reflector e ninguém se interessou. Acharam que dava para aguentar forrando o chão com jornais e às duas da manhã levantei encontrando os demais já arrumados com mochilas nas costas. Parti chorando Chefe. Bati de leve em suas costas. – Acontece meu amigo, acontece. Mas até hoje quando conto esta história dou belas gargalhadas.

                    Tenho muitas histórias de frio em acampamentos e atividades aventureiras. São dezenas. As de chuva são as minhas preferidas. Principalmente quando um raio partia alguma arvore gigante. Adorava ver o barulho dela caindo sobre as outras. Sempre imitava os madeireiros que gritavam: - Madeiraaa! Já passei muito frio. Já tentei uma vez dormir em uma rede que demorei seis meses engraxando para comprar. Sentia-me um herói. A primeira noite um frio de lascar. Sorri e fiz um pequeno fogo do lado direito, não resolveu. Fiz o segundo do lado esquerdo. Não resolveu. Fiz o terceiro nos pés e também não resolveu. Passei boa parte da noite alimentando as fogueiras até que uma chuva temporal desabou. Teimoso fiquei ali na chuva, pois meus companheiros de patrulha me preveniram. – Vado Escoteiro vai esfriar. Não vai aguentar. Sorria para eles como a dizer que não sabiam com quem estava falando. Voltar atrás? Nunca.


                          Enfim, ainda não sabia da frase de Napoleão: - A primeira qualidade de um comandante é cabeça fria para receber uma impressão correta das coisas. Não deve deixar-se confundir quer por boas quer por más notícias. Entre os tempos de sol, de lua e frio gosto de repetir para mim mesmo: É no meio de um inverno que aprendo que dentro de mim sempre existiu um verão inesquecível. Até outro dia, sempre me faz bem se lembrar das dificuldades do passado. Elas nunca são esquecidas. Mas o frio hoje está de lascar!

domingo, 5 de junho de 2016

Sem medo de ser feliz. Farda, uniforme, traje e beca. Tem mais?


Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
Sem medo de ser feliz.
Farda, uniforme, traje e beca. Tem mais?

(Segundo o Gerente da Loja Nacional sobre a vestimenta desbotar e descosturar, ele explicou ao Conselho Consultivo na última NA: - (fato narrado por um amigo Escoteiro) – “É a reação química do suor com o sol que desbota a camisa”. Quá! Explicação idiota, uma tolice sem tamanho, está é a explicação da UEB?).

               Nossa! Chega! Pare e diga adeus há este tema. Já encheu! – Risos. Eu? Eu não, eu cheguei para ficar, aplaudir, dizer que não fui eu, nem o Zebedeu. Quem foi então? Calma já vou explicar. Foram tantos artigos que perdi a conta quando escrevi sobre a bombástica Vestimenta imposta pela UEB. Se alguns reclamam um grande número aplaude. Eu Velho Chefe Escoteiro não me contenho. Se que alguns tem vontade de me mandar sumir. Pois é, a vestimenta não aparece como sinônimo de farda no Google. Mas sendo veste pode ser irmã do Traje. Bem isto importa? Porque volto na mesma tecla? Vou explicar – Centenas de comentários, centenas de curtidas e dezenas de compartilhamento quando displicentemente comentei sobre a confecção e o tecido da vestimenta que estava desbotando. E quem disse que ninguém se importava? Sei que muitos não estavam satisfeitos. Os comentários foram unânimes. Ai me perguntei: - Mas ninguém reclama? A UEB e sua Loja não tomam conhecimento? Que raios de direção é esta que vende e finge não saber de nada?

               Não sei se é verdade, mas se for o moço da loja é um perfeito idiota ou acha que os seus clientes também são. - “É a reação química do suor com o sol que desbota a camisa” disse ele. Não confirmo. Contaram-me. A Loja deve estar indo bem. Enquanto a maioria do comercio fecha as portas e demite a loja já tem mais de nove funcionários. Bem afinal são mais de 80.000 clientes cativos sem direito a reclamar. Vejo o estrago que esta vestimenta está fazendo aos olhos do publico. Os defensores dizem que tem norma aprovando, outros dizem que gostam e os mais abençoados por Deus trocando de vestimenta a cada seis meses. Um amigo me perguntou se alguém procurou o PROCON para reclamar. Não dizem que é um órgão de defesa do consumidor? Risos. Pago para ver. Outro dia li que só em uma Comissão de Ética de um estado tem mais de trinta chefes sendo julgados. Deus do céu! Que medo! Que boquinha é esta que vão perder?

               A mulher de Cesar não basta ser honesta. Tem de parecer honesta! – Traduzindo a apresentação pessoal do Escoteiro não pode ter imitações ou mesmo se sujeitar a uma apresentação que não condiz com a realidade de uma sociedade como a nossa. É de doer ver tantos chefes mal uniformizados, ou melhor, vestimentados. Agora se ele virou cinzento, descosturado, perde a cor ninguém pode reclamar a não ser no seu grupo é de enlouquecer. E olhe tem alguns que insistem em defender o indefensável. Um Chefe me disse que já tentaram me levar para o Conselho de Ética muitas vezes. – Mas amigo, não tenho registro! Estou Velho demais para entrar nesta fria de megalomania de gente que não tem o que fazer! Vão acampar, vão pegar estrelas no céu, vão fazer um ninho de águia e sem estar de julgar um Salomão de araque! Sorri e bati três vezes no meu bastão na forquilha dizendo: “Pé de Pato mangalô três vezes!”. Posso contar uma história? Urra! Eu juro palavra de Escoteiro que é verdade.

               No meu tempo (lá vem o paspalho do Velho Escoteiro com suas patacoadas) risos. Mas no meu tempo uniforme era coisa séria. Não se vestia sem promessa. O Chefe não cansava de repetir ou você está ou não está. Não tem meio termo. A gente orgulhava no dia da Promessa que o Chefe colocava o distintivo de noviço, vinha o Chefe do Grupo com o lenço e o monitor com distintivo de patrulha. Caramba! Que orgulho. E o abraço? E o aperto de mão? E o grito de patrulha com todas ao mesmo tempo? Três meses esperando por este dia. Agora sim se pensava, agora eu não estou mais Escoteiro. Eu sou Escoteiro. Um tempo que chegar à sede mal uniformizado não tinha conversa. Vá para casa. Volte quando estiver digno em sua apresentação pessoal. Hoje? Amigos chefes alguns de vocês tem culpa. Não tem aqueles que guardam o uniforme na sede? E aqueles que só colocam o lenço? Estamos virando uma terra de ninguém. Repetir que não temos apoio, não somos reconhecidos como um movimento sério de educação. Como podemos nos apresentar em público assim?

                De uma ideia até palatável, quando se discutiu a unificação dos uniformes no Brasil houve aplausos. Agora o que temos? Tecido de segunda qualidade, confecção péssima. Preço acima das possibilidades de muitos. E B-P fez o escotismo mais para os humildes. Hoje? Nem pensar. A apresentação deixa a desejar. Será que os chefes não se preocupam mais com o garbo? Com a apresentação? Têm-se um uniforme para usar uma vez por semana e lá estão todos de camiseta, chefes com o lenço no pescoço e mais nada. – Por um lenço agora é ser Escoteiro? Os exemplos vem de cima. Em cursos de formação não se exige, cada um veste o que quer. O que ele vai pensar se os lideres não dão exemplo? Não existe mais as inspeções gerais nas tropas e alcateias? Passamos ao largo na apresentação pessoal? Uma justificativa que não me convence. Gostaria de ver um instituto de pesquisa junto ao publico o que ele pensa de nós.

                  Enquanto isto quem pode vai trocando sua vestimenta. A UEB e sua Loja adorando, pois as vendas só aumentam. E sabe o que me contaram? Nas autorizações provisórias os donos do poder local dizem maravilhas da vestimenta e condenam o uniforme caqui. Falam até em deixar que cada um vote para escolher. Cada um quem cara pálida? Se o grupo está começando quem vai votar? A diretoria? Alguns chefes? E os meninos que ainda não estão presentes? Não adianta repetir a frase do Chefe Italiano que jocosamente me perguntou se os chefes usam seu direito e o código de defesa do consumidor. E quem se habilita? Difícil isto acontecer. Na calada da noite tem advertências, ameaças e alguns dizendo que se não está satisfeito peça prá sair. São gente da pior espécie que se acham escoteiros e que tratam seus voluntários com empregados e não com gente de bem. Por isto mesmo a uma debandada geral.

                  Não entendo bem os novos voluntários. Aceitam tudo em nome de uma disciplina que encanta quem participa. Não posso reclamar? Discordar? – Não chefe, se não concorda peça demissão. Dizer o que? O direito de discordar de falar de dizer o que pensa é inalienável. Eu não fiz a promessa brincando. Levo a sério o escotismo que faço. Errar é humano, mas persistir é burrice. Não tenho intenção de ofender ninguém. Meu único objetivo é ver um escotismo forte, unido em torno de um ideal democrático e cada um tenha seus direitos respeitados.

Desbotou? Descosturou? Calma – “É a reação química do suor com o sol que desbota a camisa”. E vá dormir com um barulho destes!

quinta-feira, 2 de junho de 2016

A História do Kim


A História do Kim
Extrato do livro "Escotismo para Rapazes", de Lord Baden-Powell 
Palestra de Bivaque Nº1 - "As aventuras de Kim”.

“Um bom exemplo daquilo que um Escoteiro pode fazer encontra-se na história do Kim, da autoria de Rudyard Kipling”.

Kim, ou, para lhe darmos o nome completo, Kimball O’Hara, era filho de um sargento de um regimento irlandês da Índia. O pai e a mãe morreram-lhe quando era criança e ele ficou entregue aos cuidados de uma tia. Por companheiros tinha só rapazes indígenas e pôde, assim, aprender a falar a língua deles e a conhecer todos os seus costumes. Ele e um velho sacerdote ambulante tornaram-se grandes amigos e juntos percorreram todo o norte da Índia. Um dia, Kim encontrou por acaso o antigo regimento do pai, em marcha, e quando fazia uma visita ao acampamento foi preso por suspeita de furto. Encontraram-lhe a certidão de nascimento e outros documentos e o pessoal do regimento, vendo que ele lhe pertencia, tomou conta dele e mandou-o educar. Mas, todas as vezes que conseguia ir passar férias fora, Kim vestia-se à moda indiana e andava entre os indígenas como se fosse um deles.

Passado tempo conheceu um certo Lurgan, negociante de joias antigas e de curiosidades, o qual, devido ao conhecimento que tinha dos indígenas, pertencia aos serviços de informação governamentais. Este homem, descobrindo que Kim conhecia tão bem os hábitos e costumes indígenas, viu que ele poderia vir a ser um elemento valioso dos serviços de informação. Deu-lhe por isso lições sobre a maneira de observar e fixar pequenos pormenores, coisa muito importante na preparação de um explorador.

Preparação de Kim
Lurgan começa por mostrar a Kim uma salva cheia de pedras preciosas de variedades diferentes. Deixou-lhes ver durante um minuto, depois cobriu-as com um pano e perguntou-lhe quantas e que qualidade de pedras vira. A princípio Kim não conseguia lembrar-se senão de algumas, e não sabia descrevê-las com exatidão, mas com alguns ensaios não tardou há fixar tudo muito bem. E o mesmo se fez com muitas espécies de objetos. Por fim, depois de ter aprendido muitas outras coisas, Kim foi nomeado agente do serviço secreto, e recebeu uma senha secreta – a saber, um medalhão ou distintivo para trazer ao pescoço e uma curta frase que, dita de certo modo, indicava que ele pertencia ao serviço.

Kim nos Serviços Secretos
Uma vez que Kim viajava de comboio encontrou um indígena que estava muito ferido na cabeça e nos braços. Explicou ele aos outros passageiros que tinha caído de uma carroça quando se dirigia para a estação. Mas Kim, como bom escuta, notou que os ferimentos eram fundos e não apenas esfoladelas, como seriam se tivesse caído do carro, e não o acreditou.

Enquanto o homem apertava a cabeça com uma faixa, Kim reparou em que ele trazia um medalhão como o seu, que por isso lhe mostrou. O homem introduziu logo na conversa algumas palavras secretas e Kim respondeu com os devidos termos. O desconhecido retirou-se depois com Kim para um canto e explicou-lhe que estava a desempenhar uma missão secreta, e fora descoberto e perseguido por inimigos que quase o mataram. Provavelmente sabiam que ele ia no comboio e, portanto, haviam de telegrafar aos amigos ao longo da via férrea a preveni-los da sua ida. Precisava de comunicar certa informação a um oficial da polícia e evitar que os inimigos o apanhassem, mas não sabia como havia de consegui-lo, se estes estivessem já prevenidos da sua vinda. Kim resolveu-lhe o problema.

Há na Índia muitos mendigos sagrados que vagueiam pelo país. São tidos por muito santos e toda a gente os ajuda e lhes dá esmolas e de comer. Andam quase nus, cobrem-se de cinza e pintam na cara certos sinais. Kim lembrou-se, por isso, de disfarçar o homem de mendigo. Para isso, misturou farinha e cinza que tirou de um cachimbo, despiu o amigo e esfregou-o todo com a mistura. Também lhe aplicou nas feridas, de modo que estas não se notavam. Finalmente, com o auxílio de uma pequena caixa de tintas que trazia consigo, tacou-lhe na testa os sinais apropriados, e puxou-lhe o cabelo para baixo, para lhe dar o aspecto desgrenhado e hirsuto do de um mendigo e cobriu-lhe de pó, de modo a que a própria mãe não seria capaz de reconhecer o disfarçado.

Daí a pouco chegaram a uma grande estação. No cais descobriram o oficial da polícia a quem se devia fazer a comunicação. O mendigo disfarçado foi de encontro ao oficial, que o descompôs em inglês. O mendigo respondeu-lhe com um rosário de insultos na língua indígena, no meio dos quais introduziu as palavras secretas. O oficial logo percebeu por elas que o mendigo era um agente. Fingiu que o prendia e levou-o para a esquadra policial, onde lhe pôde falar à vontade e ouvir o que ele tinha a dizer-lhe.

Mais tarde Kim conheceu outro agente dos serviços – indígena educado – e pôde prestar-lhe valioso auxílio na captura de dois oficiais que faziam espionagem. Estas e outras aventuras de Kim merecem bem ser lidas, porque mostram quais os valiosos serviços que um jovem explorador pode prestar ao seu país em ocasiões de emergência, se estiver devidamente preparado. 


A moral dessa história, caro leitor, é que hoje em dia precisamos ficar atentos a todas as conquistas humanistas, as quais permitem que a educação seja inclusiva, ecumênica, antirracista ou etnocêntrica, e instauradora da noção de que não há povos ou culturas superiores ou inferiores; mas, ao mesmo tempo, nunca devemos deixar que se perca o crescimento da imaginação e da sensibilidade que o desejo pela aventura carrega consigo. Os Grandes Jogos mudam, mas os pequenos Kims, cada um na sua medida, sempre estarão aí para o que der e vier.