A História do Kim
Extrato do livro "Escotismo para Rapazes", de Lord Baden-Powell
Palestra de Bivaque Nº1 - "As aventuras de Kim”.
Extrato do livro "Escotismo para Rapazes", de Lord Baden-Powell
Palestra de Bivaque Nº1 - "As aventuras de Kim”.
“Um bom exemplo
daquilo que um Escoteiro pode fazer encontra-se na história do Kim, da autoria
de Rudyard Kipling”.
Kim, ou, para
lhe darmos o nome completo, Kimball O’Hara, era filho de um sargento de um
regimento irlandês da Índia. O pai e a mãe morreram-lhe quando era criança e
ele ficou entregue aos cuidados de uma tia. Por companheiros tinha só rapazes
indígenas e pôde, assim, aprender
a falar a língua deles e a conhecer todos os seus costumes. Ele e um velho
sacerdote ambulante tornaram-se grandes amigos e juntos percorreram todo o
norte da Índia. Um dia, Kim encontrou por acaso o antigo regimento do pai, em
marcha, e quando fazia uma visita ao acampamento foi preso por suspeita de
furto. Encontraram-lhe a certidão de nascimento e outros documentos e o pessoal
do regimento, vendo que ele lhe pertencia, tomou conta dele e mandou-o educar.
Mas, todas as vezes que conseguia ir passar férias fora, Kim vestia-se à moda
indiana e andava entre os indígenas como se fosse um deles.
Passado tempo
conheceu um certo Lurgan, negociante de joias antigas e de curiosidades, o qual, devido ao
conhecimento que tinha dos indígenas, pertencia aos serviços de informação
governamentais. Este homem, descobrindo que Kim conhecia tão bem os hábitos e
costumes indígenas, viu que ele poderia vir a ser um elemento valioso dos
serviços de informação. Deu-lhe por isso lições sobre a maneira de observar e
fixar pequenos pormenores, coisa muito importante na preparação de um
explorador.
Preparação de
Kim
Lurgan começa
por mostrar a Kim uma salva cheia de pedras preciosas de variedades diferentes.
Deixou-lhes ver durante um minuto, depois cobriu-as com um pano e perguntou-lhe
quantas e que qualidade de pedras vira. A princípio Kim não conseguia
lembrar-se senão de algumas, e
não sabia descrevê-las com exatidão, mas com alguns ensaios não tardou há fixar
tudo muito bem. E o mesmo se fez com muitas espécies de objetos. Por fim,
depois de ter aprendido muitas outras coisas, Kim foi nomeado agente do serviço
secreto, e recebeu uma senha secreta – a saber, um medalhão ou distintivo para
trazer ao pescoço e uma curta frase que, dita de certo modo, indicava que ele
pertencia ao serviço.
Kim nos
Serviços Secretos
Uma vez que Kim
viajava de comboio encontrou um indígena que estava muito ferido na cabeça e
nos braços. Explicou ele aos outros passageiros que tinha caído de uma carroça
quando se dirigia para a estação. Mas Kim, como bom escuta, notou que os
ferimentos eram fundos e não apenas esfoladelas, como seriam se tivesse caído
do carro, e não o acreditou.
Enquanto o
homem apertava a cabeça com uma faixa, Kim reparou em que ele trazia um
medalhão como o seu, que por isso lhe mostrou. O homem introduziu logo na conversa algumas
palavras secretas e Kim respondeu com os devidos termos. O desconhecido
retirou-se depois com Kim para um canto e explicou-lhe que estava a desempenhar
uma missão secreta, e fora descoberto e perseguido por inimigos que quase o
mataram. Provavelmente sabiam que ele ia no comboio e, portanto, haviam de
telegrafar aos amigos ao longo da via férrea a preveni-los da sua ida.
Precisava de comunicar certa informação a um oficial da polícia e evitar que os
inimigos o apanhassem, mas não sabia como havia de consegui-lo, se estes
estivessem já prevenidos da sua vinda. Kim resolveu-lhe o problema.
Há na Índia
muitos mendigos sagrados que vagueiam pelo país. São tidos por muito santos e
toda a gente os ajuda e lhes dá esmolas e de comer. Andam quase nus, cobrem-se
de cinza e pintam na cara certos sinais. Kim lembrou-se,
por isso, de disfarçar o homem de mendigo. Para isso, misturou farinha e cinza
que tirou de um cachimbo, despiu o amigo e esfregou-o todo com a mistura.
Também lhe aplicou nas feridas, de modo que estas não se notavam. Finalmente,
com o auxílio de uma pequena caixa de tintas que trazia consigo, tacou-lhe na
testa os sinais apropriados, e puxou-lhe o cabelo para baixo, para lhe dar o
aspecto desgrenhado e hirsuto do de um mendigo e cobriu-lhe de pó, de modo a
que a própria mãe não seria capaz de reconhecer o disfarçado.
Daí a pouco
chegaram a uma grande estação. No cais descobriram o oficial da polícia a quem
se devia fazer a comunicação. O mendigo disfarçado foi de encontro ao oficial,
que o descompôs em inglês. O mendigo respondeu-lhe com um rosário de insultos
na língua indígena, no meio dos quais introduziu as palavras secretas. O
oficial logo percebeu por elas que o mendigo era um agente. Fingiu que o
prendia e levou-o para a esquadra policial, onde lhe pôde falar à vontade e
ouvir o que ele tinha a dizer-lhe.
Mais tarde Kim
conheceu outro agente dos serviços – indígena educado – e pôde prestar-lhe
valioso auxílio na captura de dois oficiais que faziam espionagem. Estas e
outras aventuras de Kim merecem bem ser lidas, porque mostram quais os valiosos
serviços que um jovem explorador pode prestar ao seu país em ocasiões de
emergência, se estiver devidamente preparado.
A moral dessa história, caro leitor, é que hoje
em dia precisamos ficar atentos a todas as conquistas humanistas, as quais
permitem que a educação seja inclusiva, ecumênica, antirracista ou
etnocêntrica, e instauradora da noção de que não há povos ou culturas superiores
ou inferiores; mas, ao mesmo tempo, nunca devemos deixar que se perca o
crescimento da imaginação e da sensibilidade que o desejo pela aventura carrega
consigo. Os Grandes Jogos mudam, mas os pequenos Kims, cada um na sua medida,
sempre estarão aí para o que der e vier.