sexta-feira, 26 de julho de 2013

O passado não tem valor?


Conversa ao pé do fogo.
O passado não tem valor?

                Tenho visto nas andanças e leituras que faço uma forte corrente a discutir sobre o escotismo moderno. Claro que não se começou hoje, pois há tempos os defensores desta ideia vêm fazendo mudanças em toda a estrutura escoteira. Dizem que isto faz parte de todas as escolas em todas as áreas e não se atualizar é ficar parado no tempo, dizem eles. Acredito que não estão errados. Não podemos ficar sem nos atualizar. Elas são necessárias e fazem parte do nosso crescimento. Já mudaram algumas vezes o programa escoteiro, mudaram o uniforme, alguns símbolos foram mudados e devem vir por aí outras mudanças. Para os novos tudo bem para os antigos a descaracterização.

                    Alguém um dia me interpelou sobre isto. Respondi que não discordava de atualizações desde que feitas sem tirar o mérito da formação do passado. Interessante que a maioria que sugere ou comenta estas mudanças não participaram do escotismo do passado. Combatem pelo que ouviram falar. Agora eles dizem que uma discussão sadia deveria existir e até alguns dizem que os jovens devem participar desta discussão. Claro, isto é importante, mas o jovem viveu escotismo do passado? Deram a ele oportunidade de viver o sistema de patrulhas em seu apogeu? Ele viveu uma época de aprender a fazer fazendo, pois a chefia dava ampla liberdade? E os resultados foram motivos de indagação na sociedade local?

                    Não discuto a modernidade. Discuto estas alterações e mudanças feitas sem nenhuma experiência válida para dizer – Vamos mudar! Soube que nos EEUU há tempos atrás a Boy Scout discutiu certas mudanças na vida da tropa. Para que ela se realizasse precisavam ver como seria o resultado final. Um profissional foi contratado e durante dez anos colocou em prática as mudanças em uma tropa. Porque dez anos? Porque precisavam ver os resultados quando o jovem participante atingisse a idade adulta. Infelizmente não é assim que fazem os nossos dirigentes. Planejam, discutem entre si e põe em pratica para então ver os resultados. Se deu certo ótimo se não deu muda-se de novo.

                   Os associados em todas as suas categorias não tem mais condição de pensar. Os adultos pensam por eles. Ou então fazem consultas com poucos sem dar a eles condições de análise do que era e o que vai ser. Contar histórias do passado não vale. Cada um tem uma maneira de contar para que os ouvintes interpretem a sua maneira e concordem. Eu tenho duvidas se o jovem soubesse como foi vivendo por um tempo o que era e comparar com novas ideias ou quem sabe ele mesmo sugerir. Foi uma época sui-gêneris. Um escotismo de desafio. Onde ele teria que aceitar situações aventureiras para vencer. Tentar sempre até ver onde acertar. Uma segunda e primeira estrela nunca poderia ser retirada. Dizer ao lobo que ele teria que crescer, pois ao entrar era um pata-tenra sem rumo e isto seria o começo. Ele teria que aprender a ser um lobo de verdade. Conquistando sua primeira e sua segunda estrela para então almejar seu cruzeiro do sul.

                        Acabar cum uma segunda e primeira classe? Nunca. Alterar os desafios das provas de acordo com os dias atuais sim. Os seniores ainda teriam suas eficiências. Ah! Mas me dizem que isto existe. Existe? Hoje você olha para um jovem escoteiro e escoteira e não sabe em que pé está seu crescimento escoteiro. Assusta-me alguém pedir ajuda na internet sobre especialidades, cordões e até nome de patrulha, grito etc. E os demais? Mudanças são válidas, mas cada uma tem de ser bem analisada, discussão ampla e dar tempo ao tempo.

                   Na década de 80 participei de uma comissão junto as Bandeirantes do Brasil visando uma unificação honesta e sadia visando à coeducação. Elas sempre desconfiando de nós. Durante quatro meses fizemos reuniões quinzenais. Sem menos esperar elas se afastaram dando como terminado os trabalhos. Uma semana depois vários grupos foram autorizados a terem o elemento feminino. Ficamos nós da comissão com “cara de tacho”, pois nem nos perguntaram nada. Começava aí a coeducação tão apregoada hoje. Antes só tropas e alcateias separadas por sexo e únicas. Em menos de um ano foi aprovado mista para lobos e mais um ano todos eram mistos. Experiências? Nunca foram feitas. Os dirigentes nunca perguntaram. Avançamos na modernidade, coisa que até hoje na maioria das casas dos jovens os filhos de sexos diferentes ainda não tem a liberdade que encontram no escotismo.

                         Tenho ouvido relatos de situações incríveis nas tropas escoteiras, sêniores e guias e os pioneiros me assustam mais ainda. Mudar sim, mas mudar com o pé no chão é melhor. Não é o que fazem. São poucos os jovens que passaram pelo escotismo e hoje na vida adulta comentam das vantagens da formação escoteira. Não temos respaldo na sociedade e nem nos meios educacionais. Somos vistos com brincadeiras de criança e em alguns casos nos consideram atrasados e ineficázes. Não sei realmente onde vamos parar. Aquele escotismo de aventuras, de descobertas, do amor dos membros de uma patrulha, de saber que ser escoteiro era ser um irmão e amigo de todos, do respeito aos escoteiros, aos mais velhos, tantas coisas que uma página só não daria para escrever tudo.


                          A corrente do modernismo corre contra o tempo. Ela persegue o esquecimento dos antigos e busca nos novos o apoio irrestrito que precisa. É um jogo sem volta. Tantas coisas acontecendo e tantos esquecendo que muitas coisas do passado não eram de todo ruim. Não teremos mais orgulho de uma saudação escoteira no cerimonial? Claro dirão. Teremos sim. Mas sem perder os amigos da patrulha que se vão? Claro meu caro, estamos mudando para isto. Mudando? Passado que se foi. Patrulhas que ficavam juntas por anos e anos. Mudanças que vieram para jogar por terra uma época que valeu mesmo a pena ser escoteiro.