Crônicas de um Velho Escoteiro.
Velhos amigos quarenta e cinco anos
depois.
Esta
noite de natal acordei ainda escuro, eram quatro e quinze da matina. Acordei
suado, não é normal, mas tive um sonho, e fora um sonho lindo; Sentei em minha
cama e me lembrei do sonho que tive. Um sonho do passado, dos amigos que
ficaram em minhas páginas da história. Um sonho que me mostrou duas partes do
escotismo que vivi e ainda vivo. O antes menino Escoteiro e o depois dirigente
escoteiro. Eu era um Matuto Escoteiro vindo do interior cheguei a Belo
Horizonte Minas Gerais em fins de 1965. Virgem ainda das benesses do poder.
Desconhecia por completo. Já tinha feito meus cursos e nele conheci alguns da
corte, mas minhas amizades eram com a plebe. Acreditava e ainda acredito que
somos todos irmãos e ninguém é melhor que ninguém. Mas a hierarquia tinha de
existir, sem ela muitas diretrizes ficavam no limpo. Logo comecei a participar
do Grupo Escoteiro Walt Disney sediado no Alto da Serra no Convento dos Dominicanos.
Vou pular as vezes que a policia do exército invadia o Convento a procura de
comunistas. Muitas histórias ainda para contar das vezes que tivemos que
encerrar as pressas às reuniões por causa do cerco do exército ao Convento.
Muito bem armado a lutar com meia dúzia de franciscanos.
No inicio do ano seguinte foi realizado um acampamento Distrital,
chamado de ADIP (acampamento distrital de patrulhas). Foi expedido convites
para muitos estados. Disseram-me depois que eram mais de doze presentes. Acredito
que foram mais de 800 participantes isto sem contar o Staff. Uma mordomia hoje
onde chefes pagam para trabalhar e naquela época não. Era tudo muito simples.
Patrulhas tinham de estar completas para participar. Uma hora antes da abertura oficial fui
procurado. Perguntaram-me se podia assumir um Sub Campo Senior. O titular não
apareceu. Nunca soube quem me indicou. Claro que aceitei. Os jovens seniores ficaram
meus amigos em menos de seis horas. Eram mais de 25 patrulhas. Conversas com
monitores, abraços e aperto de mão nos campos de patrulha, enfim meu Velho
estilo de fazer amizades. Fiquei o tempo todo ao lado deles. No último dia me
carregaram nos ombros quando deram o debandar. Fiquei sem palavras. Voltei à
velha rotina do Alto da Serra no Convento com seus militares em volta sempre a
procurar comunistas. Eis que recebo uma cartinha. Do Escoteiro Chefe me
convidando para no dia tal, hora tal participar de uma conversa com ele. Porque
não? O que queria de mim? Não vou entrar em detalhes, mas saí de lá nomeado
Comissário Regional do Estado de Minas Gerais, uma espécie de Presidente hoje.
E
agora José? O que fazer? Não entendia nada do riscado. Meu primeiro dia na sede
regional foi só de perguntas. A sede tinha não mais que uns 32 m2 com uma
escrivania, uma máquina de escrever, um armário de aço e uma poltroninha que
cabia dois. Foi lá que conheci a Chefe Conceição. Funcionária nossa cedida pela
Secretaria de educação. Chefe de Lobos e IM. Mulher notável. A chamávamos
carinhosamente de Vovó Conceição. Foi meu braço direito por longos oito anos ou
mais. Não sabia nada e perguntei a ela o que deveria fazer. Risos. Assim
começou minha participação na corte dos nobres. E o Blair? Ficamos amigos no
ADIP e estava triste com uma acusação infundada. Disse a ele – Estou com você para
o que der e vier. Ficou ao meu lado por todos os anos que labutei como Regional.
Está lá em Minas até hoje dando seus cursos. Entende pacas de escotismo! Coloca
no chinelo muitos dos formadores cheios de gogó e presunção. Com ele os cursos
aumentaram. Estávamos sempre juntos. Agora éramos três e aparece o Marcial. Oh
Marcial! Difícil encontrar um cara como ele. Sempre com um sorriso, sempre
pronto a viajar comigo para o interior. No seu fusquinha torramos todo tipo de
estrada poeirenta naquele estado. Gostava das akelás, mas quem não gosta? A
equipe crescia, veio o Marco Antonio. Ajudou-me a convidar figuras
representativas para formar a diretoria, na época chamada de Comissão
Executiva. Os quatros estão aqui representando os demais em foto anexa. Lembro
que éramos jovens, meninotes ainda fazendo escotismo de gente grande.
Muito diferente dos dias de hoje. Não havia egoísmo,
não havia a palavra não, não havia o disse me disse, em qualquer lugar que estivéssemos
presentes campeava a fraternidade e a lealdade. Fizemos acontecer centenas de
cursos, os Conselhos Regionais anuais (hoje chamados de Assembléia) “eita” povo
que gosta de mudar. A fazer indabas locais, distritais e regionais. Em uma
delas em Ouro Preto devíamos ser mais de quinhentos chefes. Desculpe, sei que
hoje é diferente tem muito mais, mas era o início da década de setenta. Era
gostoso demais. Uma amizade que nunca mais encontrei em tanta gente reunida.
Para aquela época uma apoteose. Antes os Conselhos eram de duas três horas no
máximo. Passamos para dois dias e finalmente três dias. Dois anos no interior e
um na capital. Lembro que poucos estados tinham esta forma de ação em conselhos.
Não tenho fotos em separados de outros da equipe que comigo colaborava. Luiz
Flávio um IM “supimpa” em lobos. Hoje dizem ser um grande psicólogo na capital,
Ronaldo Armond, um cabeludo de ouro com suas calças curtinhas de Escoteiro do
Ar. Também me disseram ser famoso advogado na capital e Presidente da ordem em
Minas. Não posso esquecer os que já se foram para as estrelas, meu compadre
Vander, sua esposa Chefe Lucia, mulher incomparável. Padre Geraldo, Chefe João
que virou padre e foi para o céu. Tem outros, mas fico nestes agora. Éramos uma
equipe formidável. Esqueça picuinhas, maldades, incompreensões, egoísmo, isto
não existia entre nós. Foram oito anos juntos lutando pelo crescimento de um
estado. Com eles aprendi muito e sei que muitos nunca esqueceram aqueles
momentos felizes que passamos juntos.
Tivemos presidentes e diretores que deram muito de suas vidas ao
escotismo de minas. O Coronel Aragão o presidente com seu bigodinho sempre
disposto a ajudar. Com ele fomos ao Palácio da Liberdade diversas vezes de
calças curtas é claro. Não posso menosprezar a turma de Juiz de Fora, que
sempre estava pronta a ajudar em tudo que fosse necessário. Uma fraternidade
sem igual. Não sei se hoje ainda é assim em Minas. Antes soube que nunca houve
uma equipe como a nossa depois não sei. Foi um escotismo de linha de frente.
Sem dinheiro, a região não tinha um tostão furado. Quantas vezes todos nós nos cotizávamos
para fazer uma extravagancia. Fizemos mil amigos. Na capital e no interior. Não
medimos esforços aos pedidos que recebíamos para visitar uma cidade. Uma época
em que grandes chefes nos davam toda a amizade e sempre presente a nos ajudar.
Não posso esquecer a Chefe Maria Pérola Sodré. Seus cursos, em mesmo fiz dois de lobinhos com
ela. Época que os executivos profissionais da UEB eram presentes. Não ficavam
lustrando cadeiras em salas atapetadas. O Hélio foi um deles. Grande cara. Ninguém
esquece. Mas o baluarte de todo este trabalho se chamava Darcy Malta. Um amigo
de verdade.
Fiquei
oito anos como Regional. Ali aprendi muito do escotismo. Foi minha escola
apesar de ter vivido grandes momentos deste o tempo que ingressei em 1947 para
nunca mais sair. Outras atividades profissionais me levaram a terras distante.
Parei em São Paulo onde estou até hoje. Aqui colaborei enquanto me deixaram colaborar.
Sou mineiro, me orgulho do que fizemos pelo escotismo em nosso estado. Sem esta
equipe eu não seria nada. Maria da Conceição Mendes, Blair de Miranda Mendes, Marcial
Muzzi, Marco Antonio Gonçalves a vocês meu Arrê! Vocês representam uma época de
ouro do escotismo Mineiro. Sempre Alerta!