terça-feira, 9 de outubro de 2018

Conversa ao pé do fogo. Como vivíamos antes de 1960?



Conversa ao pé do fogo.
Como vivíamos antes de 1960?


Eis uma pergunta interessante. Muitos jovens ao lerem esta crônica vão argumentar: - “Ora, vivi da mesma maneira que viveram nossos antepassados”. Será mesmo? Vamos ver se o raciocínio está certo. Vejamos como era a existência antes dos inúmeros eventos que surgiram nestes 68 anos e sem as mordomias científicas de hoje.

Nós nascemos antes da televisão, antes da penicilina, da vacina Sabin, da comida congelada, da fralda descartável, do Xerox, do plástico, das lentes de contato e da pílula. Nós nascemos antes do radar, do cartão de crédito, fissão de átomos, raio lazer e canetas esferográficas. Antes da máquina de lavar pratos, cobertores elétricos e ar condicionado e do homem na lua.

Nós nascemos antes dos direitos humanos, da mulher que trabalha fora de casa, da terapia de grupo, dos SPAS e dos Flats. Nós nunca tínhamos ouvido falar em vídeo cassete, DVD, computadores, vídeo games, celulares de ficção científica, “danoninhos” e rapazes de brinco e tatuagens. Nós nascemos antes dos antibióticos, dos transplantes de coração e do Viagra.

Todavia, mesmo sem este remédio a população decuplicou. Era uma época de famílias numerosas, oito a doze filhos... As moradas só possuíam um banheiro e é fácil de imaginar a fila de espera pela manhã. Casávamo-nos primeiro e só depois morávamos juntos. O casamento não era descartável. Os casais viviam junto durante muitos anos e acreditem, com os mesmos parceiros!

Gente estranha não?

Sexo era tabu. Motel? Tornar-se-ia apelido pejorativo de Hotel. Éramos tão inocentes que acreditávamos na existência de Papai Noel... E que a cegonha era mãe de todos os bebês. Nos nossos dias fumavam-se cigarros livremente. Erva era usada para fazer chá, coca era refrigerante, pó era sujeira, Biquíni era uma ilha do Pacífico e sacanagem era palavrão. Embalo era como se fazia para crianças ir dormir, Lambada era chicotada.

Fio dental servia para higiene bucal e malhar era coisa de ferreiro. Nós fomos à última geração tão boba, a ponto de que se precisava de um marido para ter um bebê. Além disto, éramos tão ingênuos que cedíamos lugar para uma senhora sentar na condução e pagávamos a despesa quando saíamos com a namorada.

Fazíamos escotismo a pé, andávamos quilômetros para encontrar um bom local de campo. Fazíamos nossas barracas, nossas mochilas, trabalhávamos ajudando vizinhos ou engraxando para comprar um chapéu, um Vulcabrás um cantil ou um canivete ou uma faca escoteira. Nosso transporte era uma carretinha de madeira que nos levávamos a alhures para admirar um nascer ou um por do sol.

Tínhamos um lampião a querosene, fazíamos pioneirías com cipós, lavávamos nosso uniforme no campo, completavam nossa alimentação com pesca, frutos do campo, abóboras, mandiocas e sopas de Lobrobô ou couve. Levávamos em nossas mochilas apenas o necessário, pois sempre usávamos as estrelas como barraca. Tínhamos uma porção a levar como intendência que chamávamos de ração A ou B ou C.

Éramos mateiros para ascender um fogo com boas achas para brasa e colocar ali uma banana verde uma cebola, uma batata, enrolar o pão do caçador para depois de tostado se deliciar? Como era gostoso fazer um churrasco no campo de patrulha. Não vale? Vale sim, uma noite fria, um bom fogo mateiro, caçar uns patos do mato ou marrecos, quem sabe uma carninha de tatu, uma cobrinha bem limpa e cortar em rodelas pequenas ficadas em espetinhos, ou de um belo Gavião que voou baixo e se danou? Bom demais.

 . Bem sei que hoje isto não pode, mas quantos patos selvagens ainda existem por aí? Naquela época dava sopa nas lagoas o Pato-do-mato, pato-crioulo, pato-bravo, cairina, pato-selvagem e o pato-mudo. Haja patos para encher a “pança” dos escoteiros. Risos. Não pode? Bem o respeito à natureza e a liberdade dos animais e pássaros precisam ser respeitados. Mas naquela época nós Escoteiros vivíamos da natureza selvagem. Na mochila não faltava meio quilo de sal, um vidro de gordura de porco, (quase não havia óleo de cozinha) eu gostava de uns dentes de alho e dependendo o lugar a acampar isto bastava. Lista de mantimentos? Meu Deus! Nem pensar.

A geração de hoje, talvez olhe para nós com cara de espanto, tentando saber como sobrevivíamos com tão poucos recursos e manias estranhas e esquisitas... Bem, nós nos contentávamos com o que tínhamos. Tínhamos o bonde e as praias despoluídas. Quando não era possível ir à Miami, fazíamos passeios à Ilha de Paquetá, Petrópolis, Santos ou Guarujá. Tínhamos as brincadeiras de rua, os bailes de formatura, as novelas da Rádio Nacional.

Curtíamos o delicioso namoro no portão, com todo respeito. E as favelas eram apenas temas de belas músicas. Também fazíamos passeios ao Joá, e ao Pico do Jaraguá ou na Barra que era então um grande areal. Existiam muitos terrenos baldios, onde a garotada se divertia e jogava pelada. E o mais importante, andávamos pelas ruas sem medo de assalto ou sequestro.

Parece muito pouco, quase nada comparado com a trepidante época atual. Com os roubos na Petrobrás, políticos desavergonhados, impeachment, Partidos sem postura e sem honra. Mas éramos felizes, inocentes, românticos e sem a terrível competição de hoje. Não é de espantar que estejamos hoje confusos e haja tamanha lacuna entre as gerações.

Mas nós vivíamos! Sim, nós vivíamos e continuaremos a viver, apesar das próximas invenções. Qualquer dia destes vamos ver como eram os escoteiros de 1950, outra época, outros tempos, mas era bom demais!  (baseado na postagem de Henrique Nigri).