quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro. A morte da árvore frondosa que eu tanto amei.



Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
A morte da árvore frondosa que eu tanto amei.

Nota - Eu vi minha vida ramificando-se diante de mim como a figueira verde da história. Na ponta de cada galho, como um figo gordo e roxo, um futuro maravilhoso acenava e piscava. Um figo era um marido, um lar feliz e filhos, outro era uma poetisa famosa e consagrada, outro era uma professora brilhante... 

                        Eu a descobri por acaso. Não mais que a um quilômetro da minha residência. No final da Rua dos Afonsos. Nada que uma pequena caminhada para chegar até ela. Vi que era uma linda figueira. Enorme, Copada, uma sombra incrível ela produzia. Estava no meio do nada. Um matagal no final de rua. Apaixonei-me por ela. Durante três dias limpei o mato e o lixo em volta de sua sombra. Alí a gente se escondia. Pensei em plantar gramas e flores. Eu plantei uns chapéus de couro, lírios, flor de laranjeira, crista de galo e todas se deram bem.

                       Era meu cantinho. Era gostoso e perfumado. As tardes pegava um livro, jogava nas costas uma cadeira de praia e lá ia eu. Sentava-me, refastelava com aquela sombra gostosa e sem nenhum barulho eu viajava em meu livro nas páginas de sonhos que me levavam a terras longínquas de um mundo fantástico. Li uma dezena de livros acobertados pela sombra daquela árvore que passei a amar.

                       Eu ficava horas e horas sentado ao pé da árvore. Eu sabia que a amizade é como a sombra na tarde ela cresce até com o ocaso da vida. Tom Jobim dizia que quando uma árvore é cortada ela renasce em outro lugar. Eu gostaria quando morrer ir para este lugar, onde as árvores vivem em paz. Minha bela vida de tardes sombreadas durou pouco. Um ano depois quando lá cheguei encontrei uns homens da prefeitura. Faziam medidas aqui e ali. – Oi! O que é isto? Perguntei. - A nova avenida. Isto aqui vai ficar mais agradável. Muitos carros, ônibus, novas casas, shoppings edifícios enormes você vai gostar!

                       Olhei para ele amargurado. Não sabia o que dizia. Ele não sabia que a civilização não trás a felicidade. E minha árvore? Perguntei. Vai ser cortada. Ela fica bem no meio do caminho e se no meio do caminho tem uma árvore ela não pode ficar! – O que posso fazer para vocês deixarem ela viva? – Nada meu amigo. Nada.

                                   Demorou seis meses. Vi com tristeza em uma manhã de segunda, caminhões, tratores a caminho do meu sonho das tardes assombreadas. Minha árvore ia partir. Senti um aperto no coração. Disseram-me um dia que um ancião é uma grande árvore que, já não tendo nem frutos e nem folhas ainda vive preso a terra como ela. Ainda bem que estou "Velho". Logo, logo também irei partir. A natureza não é mais a mesma. Não há respeito. Em nome da civilização ela é jogada como lixo em todos os lugares. A árvore quando está sendo cortada, observa com tristeza que o cabo do machado é de madeira. Deu-me vontade de chorar. Iam rir de mim, o Velho chorando por uma árvore?

                      Eu sabia que a árvore não prova a doçura dos próprios frutos; o rio não bebe suas próprias ondas; as nuvens não despejam água sobre si mesmas. A força dos bons deve ser usada para benefício de todos. Minha amiga partiu para onde Deus lhe reservava um lugar em seu jardim do Éden. Eu sabia que todo jardim começa com uma história de amor, antes que qualquer árvore seja plantada ou um lago construído é preciso que elas tenham nascido dentro da alma. Quem não planta jardim por dentro, não planta jardins por fora e nem passeia por eles.

                     Voltei para minha casa tristonho, ainda tinha minha varanda meu canto. Mas que saudades da minha linda árvore que um dia amei e que achei que iria viver para sempre presa nas minhas saudades acreditando que durar para sempre!