quinta-feira, 18 de abril de 2019

Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro. Era uma vez... Um planeta azul chamado Terra!




Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
Era uma vez... Um planeta azul chamado Terra!

Prólogo: - Crônica utópica tirada da minha imaginação. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera coincidência.

               A vista era maravilhosa, debaixo daquele enorme castanheiro em um banco simples de madeira feito por ele mesmo estava sentado Baden-Powell. Gostava de todas as tardes ficar ali, olhando seu planeta azul que se destacava no infinito entre milhares de estrelas no céu. Suas lembranças ainda estavam vivas. Morava em uma Colônia que tão singelamente batizaram de “Fraternidade”. Era uso fruto dos Escoteiros que um dia partiram para as estrelas. Lord Baden-Powell fazia questão de receber todos com um sorriso com um aperto de mão um abraço dos que chegavam da terra. Sorrindo dizia que armassem a barraca no campo mais verde, nas campinas mais floridas onde o jorro de uma nascente ou cascata acontecia, e árvores frutíferas que proliferavam. Absorto em seus pensamentos Lord Baden-Powell não viu chegar seu amigo Kenneth Maclaren. Amigos de longa data desde a Guerra do Transvaal e do primeiro acampamento em Brownsea. Ele sorria ao pensar nos demais amigos que moravam e se reuniam ali.

                Recebi seu recado General – Disse Kenneth. Baden-Powell sorriu. Sabia que ele teve muitas propostas de outras colônias no céu, mas recusou todas. Era um amigo de verdade. – Sabe Kenneth, preciso de um favor seu – As suas ordens meu General! – Baden-Powell riu e prosseguiu. Tem vários anos que não vou a terra e não sei como vai o escotismo por lá. Você sabe que breve irei para uma colônia de mais luz e nem sei se posso ajudar os Escoteiros terrenos. Se você tiver condições tire uma semana e faça um périplo na terra observando. Tente ver como está o método o aprender fazendo e se o sistema de patrulha está perfeito. Veja também se eles mantem muitas das tradições que deixamos. – Seu pedido é uma ordem general. Irei nesta semana mesmo. Kenneth se despediu não sem antes deixar lembranças a Lady Olave St. Clari Soames, a esposa de BP. Logo que ele partiu Lord Baden-Powell avistou uma tropa de chefes em curso comandada por seu outro grande amigo Chefe John Thurman. Ele sabia que John um antigo diretor de Gilwell Park era mestre em cursos deste tipo. Mesmo com alguns problemas sua colônia tinha muita gente boa. 

                   Na semana seguinte Kenneth o procurou. – Já de volta? Disse BP. Já General. Não trago boas notícias. BP não disse nada. Amigo vamos conversar em nosso ponto de reunião. Você sabe que eu amo sentar embaixo daquele castanheiro. – Eu sei General o senhor fez uma réplica de um que existia em Mafeking. Lembro que o senhor adorava ficar lá sentado pensando sobre as próximas batalhas. Pois é, mas me conte. - Para dizer a verdade General não tenho muito para contar. Desde a última vez que estive na terra que o escotismo não é mais o mesmo. Estão fazendo grandes modificações. Existe uma liberdade tal que mais parece uma indisciplina assistida. Países que se dizem modernos abrem mão em varias questões que em sua época não iriam acontecer. Uma liderança mundial chamada de WOSM ou OMME tem aprontado poucas e boas.

                  BP. Já sabia deste pormenor. Não havia como mudar. – BP balançou a cabeça convidando-o a continuar. Olhe General rodei vários países, mas demorei mais no Brasil. Sei que o senhor nunca esteve lá e fez muito bem. Eu até que gostei de muitos chefes que estão atuando, são voluntários de valor e tentam ao seu modo educar a mocidade. Pena que lutam só. As autoridades brasileiras desconhecem o movimento. Dizem que eles só sabem vender biscoitos e ajudam a atravessar idosos nos sinais de trânsito. Muitas cidades aproveitam deles para plantar árvores, limpar praças, ajudar nas calamidades e carregar viveres para os necessitados. Eu sei que a ajuda ao próximo é bem vinda. Mas acampamentos? Técnicas Escoteiras? Quase nada. Eles dão enorme valor aos encontros nacionais e internacionais e gastam fortunas com taxas para estarem presentes.

              – Me diga falou BP sabe se o escoteirinho de Brejo Seco conseguiu ir em um Jamboree? Nem pensar General. A taxa que cobram é só para ricos. Me contaram-me que os lideres gostam de cobrar. Afinal eles tem agora uma organização que dizem ser perfeita. Adoram taxar tudo que fazem e até cobram também do que os outros fazem. Tem uma loja que só eles podem vender seus produtos e os preços não são acessíveis. Os mais pobres e humildes não tem vez. A palavra de ordem é: - Escotismo é para ricos! - BP pensou: - Coitado do escoteirinho de Brejo Seco. – Olhe General, a direção escoteira brasileira se apropriou de muitos termos e programas que o senhor fez. Registrou tudo como se fossem os donos. Surgiram outras associações e são tratadas a ferro e fogo. Todas levadas às raias dos tribunais de justiça. Esqueceram do sexto artigo e estão esquecendo da fraternidade. Do nosso uniforme que usamos lá na terra muito foi alterado.

                 Fazem questão de praticar um escotismo moderno, estão tentando apagar o passado, as tradições e só se preocupam com o presente. Os novos chefes a gente sabe, passa a ser um hábito de comportamento e formação. Criaram novo uniforme e quer saber general? São mais de dezoito tipos a escolher. Disseram que um antigo poderia ser usado, mas não vendem as peças em sua loja. É comum colocar o lenço amarrado nas pontas e se dizer Escoteiro. Tem muita coisa general. Muita mesmo. Eles agem sem consultar ninguém. Não há transparência do que fazem. Pesquisas? Nunca existiram. Felizmente boa parte dos chefes são pais novos e desconhecem as tradições.

                  Lord Baden-Powell olhou para o seu planeta azul. Rezou muito. Pediu ao Senhor que suas idéias não fossem desvirtuadas, que o amor e a fraternidade através do escotismo seja em forma de uma grande fraternidade mundial. Lady Olave chegava com John Thurman. Este sorriu e disse – Eu já sabia General. Em 1954 antes de vir para cá, deixei para eles uma mensagem onde escrevi com todos os meus conhecimentos adquiridos. O chamei de os Sete Perigos. Disse tudo que poderia acontecer. Falei sobre administração, sobre centralização, Seriedade demasiada, falei sobre exclusividade transparência e austeridade. Disse o que o senhor pensava sobre o escotismo entre os pobres. Falei da sua simplicidade e do prazer do rapazes que faziam um escotismo simples. E terminei dizendo que os únicos capazes de por o escotismo a perder são os próprios chefes e dirigentes. Finalizei dizendo que se nos tornarmos arrogantes, complacentes e a nos fazermos passar por demasiado auto-suficientes, então - e apenas com essas coisas - poderemos arruinar o Movimento.

                 Lord Baden-Powell perguntou ao seu amigo Kenneth: Sabe me dizer se o Vado Escoteiro já chegou? – Não General, ele ainda vai ficar na terra por mais algum tempo. Ele anda meio “pitimbado” mas escreve sobre escotismo e muitos não gostam do que diz. Os chefões e dirigentes nem dão bola ao que ele comenta. BP não disse mais nada. Era hora do grande cerimonial de Bandeira que todas as tardes acontecia em sua colônia. Pelo menos ali a disciplina, a fraternidade e o respeito era comemorado em todos os dias da semana. – Parou cumprimentou a todos na enorme ferradura e ao comando de arriar a bandeira fez sua saudação Escoteira com orgulho.  Ele sabia que nunca deu procuração a ninguém para falar em seu nome. Afinal o escotismo não tinha dono, ele era dos que quisessem seguir sua cartilha. Olhou de novo o planeta azul ajoelhou e pediu ao Senhor que fizesse da Terra e do Brasil um mundo feliz para todos os Escoteiros!