Eu
sou e serei um Caqueano até morrer!
Peço desculpas aos amigos que usam
outro uniforme. Principalmente a Vestimenta. Afinal tem gosto para tudo. Tenho que
admitir que a vestimenta é uma realidade. Mas eu sou mesmo um caqueano. É um
novo termo que criei para dizer do que gostam e usam o uniforme caqui. Me sinto
bem quando vejo alguém vestido com o caqui. E se for homem e de calças curtas
meu coração explode de alegria. Adorei quando vi as meninas, as moças as
senhoras decidirem também usar o caqui. Ficaram lindas demais! Afinal eu sou um
Velho Escoteiro, amante do seu passado, e que acredita na tradição escoteira.
Sou mesmo um caqueano da gema. Trago
dele grandes recordações. Nunca esqueci lá em Malacacheta, uma cidade perdida
no rincão das Minas Gerais, menos de quinhentas almas na época, nossa patrulha
adentrou na cidade, o sol nascendo, paramos em um local que devia ser uma praça.
Eis que surge um menino. Um reles menino raquítico barriga d’água a nos olhar
espantado. Calado nos olha e dá um berro enorme: São Escoteiros! E sai correndo
para chamar o arraial e ver a invasão que acontecia pela escoteirada.
Escoteirada? Apenas sete meninos ávidos de aventuras. Como ele nos reconheceu?
Seria por sermos lindos de morrer? Seria por causa das bicicletas serem
autênticas importadas do estrangeiro? Seria pelas bandeirolas esvoaçando pelo
ar? Ou seria pelo uniforme, aquele caqui saudoso e o chapelão fincado nas
cabeças da escoteirada?
Não foi só em Malacacheta. Foi lá
pelos idos de 1956 descendo o Velho Chico (rio São Francisco) em uma gaiola a
vapor, coisa de caroneiros, eu e mais três seniores descemos em Juazeiro para
conhecer a cidade e eis que um montão de meninos apareceram para gritar: -
Viva! São escoteiros do Brasil! E aquele Velho Sanfoneiro Seu Neném da Maria em
Pirapora que quando nos viu gritou: - Eu também já fui um! Eu também já fui um!
E pulava e sorria e gritava! Pois é tenho mesmo que ser um caqueano até morrer.
De calça curta moço! Sem ela é como se estivesse sem uniforme! Quantas
lembranças, eternas lembranças de um tempo que me faz bem ao recordar.
Camiseta? Só o lenço? Só o chapéu! Never, nunca mesmo.
Afinal só eu estou certo? E os outros não?
Nem pensar. São questões pessoais. Cada um é cada um e sabe o que vestir. Lembro-me
em 1954 fomos convidados para acampar com os escoteiros de Conselheiro Pena,
era um Grupo novo com menos de um ano de atividade. Meu Velho São Jorge adorava
excursionar. Levávamos nossa tralha e claro nossa banda. Era um orgulho chegar à
estação, formar de mochila as costas e a tralha em cima de um caminhão da
prefeitura e sair pelas ruas da cidade com a banda do Munir a marchar. Os
escoteiros de lá nos esperavam. Todos de caqui comprido. Ninguem de calça
curta. Olharam-nos espantados. Quando no campo começamos a montar acampamento,
eis que eles se misturaram perguntando: - Porque a calça curta? – Meninotes só sabíamos
responder: Tradição. B-P usava. - E quem era B-P? Nosso fundador uai!
E eis que cada patrulha de lá enviou
um mensageiro a cidade para trazer tesouras. Para que? Eles em fila deixavam
cortar a calça para ficar curta como nós! Meu dileto e prezado amigo, isto foi
no passado onde as tradições tinham valor. Nunca usei calça comprida exceto
quando em 1976 o Escoteiro Chefe Darcy Malta e sua trupe da UEB resolveram
adotar o traje. Era bonito, de tergal e alguns usavam camisa de linho. Sempre
impecáveis. Tinha até jaleco e paletó. Mas a coisa desandou. Novos lideres da UEB
passaram a mudar. O traje esculhambou. O chapéu a loja escoteira não mais
comprava dizendo que a Prada fechou. Entonse... Um sábio Dirigente autorizou o
uso do Jeans. A cor? Era cinza chumbo, depois ficou verde, azul e preta. A
bagunça começou. Ainda bem que os do ar e mar não aceitaram imposições de
mudança.
E os anos passando, até que a casta dos nobres dirigentes, liderada por
uma chefe, vendeu a ideia da vestimenta. A casta aprovou. Afinal eles seriam os
únicos a fabricar e vender. Encheriam as burras de dinheiro que a sede nacional
precisava. O lucro foi estupendo. – Um outro sábio escreveu lá no POR: - Pode
usar camisa fora da calça, sandália e a cor da meia fica a critério de cada um.
Outro gritou! E o chapéu? Cururu capeta! Vamos vender chapéus de pano australianos
e outros que dão bom lucro. E vamos obrigar todos a usar? Um sabido riu e
disse: Calma, vamos mostrar que somos democráticos. A Assembleia do grupo
decide se vai ser a vestimenta ou o uniforme caqui. Deixem que a molecada pequena
também vote! E Buuu! Acabou a tradição. O caqui? Na loja não vende mais. E a
turma deu risadas, pois sabiam que estavam com a faca e o queijo na mão. Logo,
logo tudo ia mudar.
Eu gosto de perguntar e ninguém tem
a resposta. Porque a UEB não fez uma pesquisa junto aos Grupos Escoteiros sobre
uniformização? Porque não perguntou a ninguém se seria válido? Porque até mesmo
nas Assembleias Nacionais nunca deram motivo para discutir a nova
uniformização? Porque manteve toda discussão e confecção em sigilo absoluto? Afinal
a escolha teve ou não uma consulta com os jovens? Eu ofereci um prêmio ao Escoteiro
que dissesse sim. E porque ela foi apresentada em uma Assembleia lá no norte do
país onde a participação de muitos conselheiros foi pequena? E para que o
desfile de modas digno de um Faschion Week? É... A UEB pode tudo. Até mesmo
mudar o que lhe der na telha sem dar satisfação a ninguém. Afinal quem tem a
coragem de reclamar e exigir?
Nunca vou deixar de fazer meu
marketing do meu caqui querido, apesar de saber que os resultados serão pífios.
Aceito aqueles que querem a vestimenta. É um direito. Eu enquanto viver
vestirei meu caqui em todas as atividades Escoteiras onde comparecer. Sempre
garboso e bem uniformizado com aprendi desde menino. Sei que ele vai
desaparecer, são favas contadas. Quem viver verá. Outro dia pensei em ir a Portugal
conhecer minha segunda pátria Mas sei que a UEB vai exigir que eu use a
vestimenta. Normas internacionais diz ela. Verdade? Esta é a liberdade que nos
é oferecida? Não adianta dizer que com um terço do preço da vestimenta se faz
um uniforme caqui e também o brim azul dos lobos. Sabiam que a durabilidade do
caqui é três vezes maior que a vestimenta? E olhe não desbota, não pega fogo
fácil, e nem se compara a confecção de terceira qualidade da vestimenta. Eita
disciplina “bunita”!
Sei que a UEB nunca vai fazer marketing do
Uniforme Caqui e do azulão de brim dos lobos. Ela sabe que a vestimenta faz
parte de sua nova tradição e é rentável.
Quanto tempo mais? Levamos mais de 100 anos para criar uma e a UEB vai
levar menos de dez anos para acabar com ela. Como diz o poeta, um povo sem o
conhecimento da sua história, origem e cultura é como uma árvore sem raízes!