quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Eu sou e serei um Caqueano até morrer!


Eu sou e serei um Caqueano até morrer!

            Peço desculpas aos amigos que usam outro uniforme. Principalmente a Vestimenta. Afinal tem gosto para tudo. Tenho que admitir que a vestimenta é uma realidade. Mas eu sou mesmo um caqueano. É um novo termo que criei para dizer do que gostam e usam o uniforme caqui. Me sinto bem quando vejo alguém vestido com o caqui. E se for homem e de calças curtas meu coração explode de alegria. Adorei quando vi as meninas, as moças as senhoras decidirem também usar o caqui. Ficaram lindas demais! Afinal eu sou um Velho Escoteiro, amante do seu passado, e que acredita na tradição escoteira.

           Sou mesmo um caqueano da gema. Trago dele grandes recordações. Nunca esqueci lá em Malacacheta, uma cidade perdida no rincão das Minas Gerais, menos de quinhentas almas na época, nossa patrulha adentrou na cidade, o sol nascendo, paramos em um local que devia ser uma praça. Eis que surge um menino. Um reles menino raquítico barriga d’água a nos olhar espantado. Calado nos olha e dá um berro enorme: São Escoteiros! E sai correndo para chamar o arraial e ver a invasão que acontecia pela escoteirada. Escoteirada? Apenas sete meninos ávidos de aventuras. Como ele nos reconheceu? Seria por sermos lindos de morrer? Seria por causa das bicicletas serem autênticas importadas do estrangeiro? Seria pelas bandeirolas esvoaçando pelo ar? Ou seria pelo uniforme, aquele caqui saudoso e o chapelão fincado nas cabeças da escoteirada?

           Não foi só em Malacacheta. Foi lá pelos idos de 1956 descendo o Velho Chico (rio São Francisco) em uma gaiola a vapor, coisa de caroneiros, eu e mais três seniores descemos em Juazeiro para conhecer a cidade e eis que um montão de meninos apareceram para gritar: - Viva! São escoteiros do Brasil! E aquele Velho Sanfoneiro Seu Neném da Maria em Pirapora que quando nos viu gritou: - Eu também já fui um! Eu também já fui um! E pulava e sorria e gritava! Pois é tenho mesmo que ser um caqueano até morrer. De calça curta moço! Sem ela é como se estivesse sem uniforme! Quantas lembranças, eternas lembranças de um tempo que me faz bem ao recordar. Camiseta? Só o lenço? Só o chapéu! Never, nunca mesmo.

             Afinal só eu estou certo? E os outros não? Nem pensar. São questões pessoais. Cada um é cada um e sabe o que vestir. Lembro-me em 1954 fomos convidados para acampar com os escoteiros de Conselheiro Pena, era um Grupo novo com menos de um ano de atividade. Meu Velho São Jorge adorava excursionar. Levávamos nossa tralha e claro nossa banda. Era um orgulho chegar à estação, formar de mochila as costas e a tralha em cima de um caminhão da prefeitura e sair pelas ruas da cidade com a banda do Munir a marchar. Os escoteiros de lá nos esperavam. Todos de caqui comprido. Ninguem de calça curta. Olharam-nos espantados. Quando no campo começamos a montar acampamento, eis que eles se misturaram perguntando: - Porque a calça curta? – Meninotes só sabíamos responder: Tradição. B-P usava. - E quem era B-P? Nosso fundador uai!

          E eis que cada patrulha de lá enviou um mensageiro a cidade para trazer tesouras. Para que? Eles em fila deixavam cortar a calça para ficar curta como nós! Meu dileto e prezado amigo, isto foi no passado onde as tradições tinham valor. Nunca usei calça comprida exceto quando em 1976 o Escoteiro Chefe Darcy Malta e sua trupe da UEB resolveram adotar o traje. Era bonito, de tergal e alguns usavam camisa de linho. Sempre impecáveis. Tinha até jaleco e paletó. Mas a coisa desandou. Novos lideres da UEB passaram a mudar. O traje esculhambou. O chapéu a loja escoteira não mais comprava dizendo que a Prada fechou. Entonse... Um sábio Dirigente autorizou o uso do Jeans. A cor? Era cinza chumbo, depois ficou verde, azul e preta. A bagunça começou. Ainda bem que os do ar e mar não aceitaram imposições de mudança.

           E os anos passando, até que a casta dos nobres dirigentes, liderada por uma chefe, vendeu a ideia da vestimenta. A casta aprovou. Afinal eles seriam os únicos a fabricar e vender. Encheriam as burras de dinheiro que a sede nacional precisava. O lucro foi estupendo. – Um outro sábio escreveu lá no POR: - Pode usar camisa fora da calça, sandália e a cor da meia fica a critério de cada um. Outro gritou! E o chapéu? Cururu capeta! Vamos vender chapéus de pano australianos e outros que dão bom lucro. E vamos obrigar todos a usar? Um sabido riu e disse: Calma, vamos mostrar que somos democráticos. A Assembleia do grupo decide se vai ser a vestimenta ou o uniforme caqui. Deixem que a molecada pequena também vote! E Buuu! Acabou a tradição. O caqui? Na loja não vende mais. E a turma deu risadas, pois sabiam que estavam com a faca e o queijo na mão. Logo, logo tudo ia mudar.

              Eu gosto de perguntar e ninguém tem a resposta. Porque a UEB não fez uma pesquisa junto aos Grupos Escoteiros sobre uniformização? Porque não perguntou a ninguém se seria válido? Porque até mesmo nas Assembleias Nacionais nunca deram motivo para discutir a nova uniformização? Porque manteve toda discussão e confecção em sigilo absoluto? Afinal a escolha teve ou não uma consulta com os jovens? Eu ofereci um prêmio ao Escoteiro que dissesse sim. E porque ela foi apresentada em uma Assembleia lá no norte do país onde a participação de muitos conselheiros foi pequena? E para que o desfile de modas digno de um Faschion Week? É... A UEB pode tudo. Até mesmo mudar o que lhe der na telha sem dar satisfação a ninguém. Afinal quem tem a coragem de reclamar e exigir?   

            Nunca vou deixar de fazer meu marketing do meu caqui querido, apesar de saber que os resultados serão pífios. Aceito aqueles que querem a vestimenta. É um direito. Eu enquanto viver vestirei meu caqui em todas as atividades Escoteiras onde comparecer. Sempre garboso e bem uniformizado com aprendi desde menino. Sei que ele vai desaparecer, são favas contadas. Quem viver verá. Outro dia pensei em ir a Portugal conhecer minha segunda pátria Mas sei que a UEB vai exigir que eu use a vestimenta. Normas internacionais diz ela. Verdade? Esta é a liberdade que nos é oferecida? Não adianta dizer que com um terço do preço da vestimenta se faz um uniforme caqui e também o brim azul dos lobos. Sabiam que a durabilidade do caqui é três vezes maior que a vestimenta? E olhe não desbota, não pega fogo fácil, e nem se compara a confecção de terceira qualidade da vestimenta. Eita disciplina “bunita”!


               Sei que a UEB nunca vai fazer marketing do Uniforme Caqui e do azulão de brim dos lobos. Ela sabe que a vestimenta faz parte de sua nova tradição e é rentável.  Quanto tempo mais? Levamos mais de 100 anos para criar uma e a UEB vai levar menos de dez anos para acabar com ela. Como diz o poeta, um povo sem o conhecimento da sua história, origem e cultura é como uma árvore sem raízes!