Crônicas
de um Chefe Escoteiro.
Leis,
regras, normas, artigos, parágrafos e outros “escambal”!
O mundo é feito de regras,
normas, artigos, leis, decretos, parágrafos e até me assusto com tudo isso.
Nada podemos fazer sem pensar que podemos infligir alguma delas. Claro. São
necessárias. Assim dizem. E no escotismo então? Uma parafernália. Cada dia que
passa mais normas, mais regras, mas artigos dizendo o que podemos e não podemos
fazer. Não satisfeitos os nossos dirigentes criaram uma tal de Comissão de
Ética. Li e não gostei. Achei meio ameaçador. Ela põe por terra nossa
fraternidade. Até pensei comigo: - E quem um dia julgará nossos dirigentes
pelos seus erros, se cometerem? Os amigos do Rei? No final da década de cinquenta, uns sábios de
nossa liderança criaram o nosso POR. Princípios, Organizações e Regras da União
dos Escoteiros do Brasil. Antes havia um manual técnico que definia o que pode
e o que não podia fazer. O POR se tornou nossa bíblia, lindo! Um grande livro.
Muitas páginas, completo. Diz tudo sobre nossa atuação na sede, no campo e no
decoro Escoteiro. Foi mudando, mudando e a direção nacional não satisfeita de
novo adaptou novas regras as suas páginas. Sei que muitas coisas estão
evoluindo e a adaptação é necessária. Mas cá prá nós, você já o leu todo?
Tem hora que me sinto cerceado. Se hoje estivesse à frente de uma sessão
escoteira não sei se me desincumbiria bem das minhas responsabilidades. Aquele
escotismo alegre e solto onde o jovem corria pelos campos sem dizer posso ir,
sem dizer se precisa de autorização, se tem taxa hoje está todo mudado. Nada se
faz sem pensar nas leis, regras, artigos, parágrafos ou o escambal. Certo? Sei
não! Têm tantos por aí exigindo direitos que podem aparecer no escotismo alguém
a exigir os seus. “Quero meus honorários”! Quero meus direitos! Quero minha
Insígnia! Quero meu Tapir de Prata! Quero meus tacos! Que se faça justiça! Vou
processar quem for contra mim! Saudades dos velhos tempos. Oi Romildo! E aí?
Vamos acampar sábado? Era assim. Colocava minha mochila, ração A ou B, uma meia
lona da barraca e dizia para minha mãe e meu pai: - Estou indo, volto domingo
sem horário para chegar! E lá íamos nós cantando pelos campos o Rataplã! Hoje?
Adeus liberdade juvenil.
Pense comigo se você quiser ser voluntário no escotismo, vai ter de
enfrentar tantas normas regras e lei que ficará desnorteado. Tem de dar
autorização de imagem, tem de preencher fichas e mais fichas no SIGUE e ainda
pagar por isto. Voluntário que paga? Isto mesmo. Paga taxas, paga mensalidades
e ainda tira do bolso para os seus meninos pobres que não podem pagar! Isto é um
escambal. Antes não. Os chefes vinham dos pioneiros, que vinham dos seniores,
que vinham dos escoteiros, que vinham dos lobinhos... Um escambal de “beleza”
mesmo. Difícil isso hoje. Muitos são pais e quando os filhos dão adeus eles vão
atrás. Prefiro nem comentar. Mas se queres mesmo ser um voluntário “pagante”,
preencha a ficha, leia as normas, as leis e observe bem se não tem letrinhas
miúdas (ou tem?). Se tiver nem pense em se socorrer no PROCON. Será
malhado, esculhambado, julgado e expulso. Mas se topou e aceitou “beleza”. Vais
receber um “Tutor ou assessor pessoal” Será o responsável pelo seu
desenvolvimento. (que luxo! não tínhamos isto no passado). Ele vai lhe
orientar, pois aprendeu em um curso como agir e sabe tim tim por tim tim. É um
bamba! Tem respostas para tudo. Mas cuidado com ele. Pode querer vir a ser seu
dono e dirigir seu destino Escoteiro. Brincando. Nada disto. Todos eles são
gente boa. (acredite quem quiser eu não. kkkkkkk).
De muitos tutores e assessores
que vejo atuando a maioria ou são os Presidentes ou Diretores Técnicos do
próprio grupo. Para mim nada mudou tudo igual como antes há não ser o nome. Nada
de novo no Front. Ontem os Chefes de Grupo ficavam de olho! Hoje eles são
Diretores Técnicos e ainda estão de olho em você. Sabemos que não existem
muitos “sabichões” para te levar ao mau caminho. Ops errei bom caminho. Um belo
dia você vão lhe ensinar a amarrar a ponta do lenço, colocar um chapéu
esquisito e já estará uniformizado e promessado. Irão lhe dizer que se quiseres
reclamar procure o local certo. Uma tal de Assembleia. O duro é você chegar lá
e sentir um “bobo” da corte. Ficar deslumbrado, ver tantas medalhas, tantos
chefões e até gagueja quando lhe dão Sempre Alerta! Mas não tenha receio, eles
só sabem dar o SAPS! Mas ainda bem que lá não tem os de lenço, sem uniforme e
com um belo chapéu australiano. Aí você vai para casa e se pergunta: - Valeu a pena, meu? Seu Comissário do
Distrito grita: - Valeu sim! - Escoteiros avante! O amanhã será nosso!
Rataplã!
Acampar virou um nome
proibido. Acampar? Deus me livre. Não tem o pedido de autorização para o Comissário
do distrito? Não tem que preencher um escambal de normas no SIGUE? E se for
sair do seu Estado de origem, já pediu autorização dos estados onde vai passar?
E fora do Brasil? Isto deve ser feito em quatro vias. Uma para o grupo, uma
para o distrito uma para a região e uma para a direção nacional. Com firma
reconhecida! E depois? Uma autorização por escrito dos pais, cópia do seguro,
detalhar estradas, conduções e como vai alimentar todo mundo. Tudo isto sempre
em quatro vias e claro com firma reconhecida. Preste atenção, fora do Brasil só
com a tal nova vestimenta. E tome cuidado. Se houver um gritinho mais alto do
chefe, os pais podem processá-lo. Se um pai for advogado é melhor não acampar
mesmo. Fique em casa vendo TV que vai ganhar muito mais. Risos.
Depois meu Chefe novato você vai fazer centenas de cursos de
aperfeiçoamento burocrático, como manusear o SIGUE, como agir com o tal
voluntário que apareceu no seu grupo, como entender os estatutos da juventude,
o papel dos nossos lideres (eles gostam de um elogio!). Haja papel e tempo para
fazer o processo de Cruzeiro do Sul, Liz de Ouro, Escoteiro da Pátria, Insígnia
de BP, Condecorações, Cordões de Eficiência e o escambal. Quer um conselho? Melhor
contratar um contador para isso e que seja bom e entendido em internet. Nunca
vi tantos processos. Aguarde pacientemente sentado o ok do assistente
distrital, regional e nacional. É mesmo? E ainda dizem que o escoteiro tem uma
só palavra. Mas enfim, isso é a modernidade. Cada dia recebendo novas normas,
novos programas. – “A partir desta data, fica determinado que a determinação
anterior não vai determinar mais nada!”.
Eu meus amigos prefiro ficar
em casa. Minha saúde não é a mais mesma. Meu escotismo era outro. Um escotismo
alegre e sem amarras. Onde existia uma juventude que sabia dos seus sonhos e
ideais, onde todos falavam o mesmo idioma, onde nos encontrávamos para contar
histórias, onde os fins de semana eram nos campos e campinas, a subir montanhas
dormindo sob as estrelas. Hoje não se pode mais. É papel que não acaba mais, ou
melhor, é SIGUE que não acaba mais. Temos que ficar de olho para não infligir
alguma norma. Meus olhos se confundem quando leio tanto as tais normas, leis,
decretos, regras, artigos, parágrafos... Isso é um escambal. No bom
sentido. Enfim, sempre me lembram de que o mundo é outro. Tudo é mais
moderno. Deve ser. Mas quer saber? As estrelas que via quando menino ainda
estão no mesmo lugar. O nascer e o por do sol ainda são no leste e oeste com
poucas variações. As belas nascentes ainda existem e os carrapatos formigas
ainda adoram os Escoteiros. Dizem que os sonhos dos jovens hoje são outros.
Será? Não tem mais aquela “pitada” de aventura? O que mudou? Deus meu! Tudo!
Agora temos leis,
regras, normas, artigos, parágrafos e outros “escambal”! Santa Edwiges me
proteja do mal amem!
"A verdade é que muita gente cria regras para não ter de tomar
decisões."
(Mike Krzyzewski).