terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

A sede própria. Sonho ou realidade?


Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
A sede própria.
Sonho ou realidade?

                                Existe um sonho de todo Chefe que participa ou organiza um Grupo Escoteiro em conseguir a sede própria. Isto é fato relevante, pois não podemos confiar em nossas autoridades que nos cedem locais de reunião. Toda vez que existe mudanças nos cargos nas organizações que colaboram conosco muitos Grupos Escoteiros vão para o olho da rua. Quantos de nós não fomos despejados? Quantos lutam para educar os filhos que não são seus em um pátio cedido, uma área gramada e quantos não guardam o material que conseguiram a duras penas em suas próprias casas? Sabemos que isto é um fato. Não se discute que a grande maioria tem sedes que não são próprias, mas que não podem confiar nos proprietários, diretores ou religiosos. Conheci grupos que passados mais de trinta anos estão firmes nas atividades Escoteiras e prestigiados. Mas este sol é para todos? Sabemos que não.

                              Existe sempre a vontade de possuir uma sede própria. Que seja um quartinho, uma saleta ou mesmo uma tapera qualquer que possa guardar o material. A luta não é fácil. Conseguir um terreno, construir, ver a construção pronta é um passo enorme para muitos que labutam nos Grupos Escoteiros. Quando o grande dia chega é uma alegria tremenda daqueles que lutaram para isto. Festas, foguetes e abraços fazem dos sonhos uma realidade atual. Sei que não é a sede própria que traz um melhor escotismo, sei também que não significa que com ela haverá entre todos uma melhor fraternidade e respeito. Quando todos estão imbuídos da verdadeira democracia tudo vai bem obrigado e infelizmente tem aqueles que após a sede própria passaram a se considerar donos e não mais voluntários para servir.

                              Um tete a tete sobre o tema um dia me chamou a atenção. A burocracia, as exigências legais no município no estado e na união. Fiquei pensando que fui de uma época que isto não existia. No grupo que nasci passamos por dois locais de sede. O primeiro a Igreja precisava construir sua nova paróquia, mas ela não nos deixou na mão. Em outra paróquia com um belo pátio recebemos duas salas. Parecia um palácio em comparação a anterior. Bem eu era menino e não me preocupava com isto. Nesta época ainda não existia o CGC, a obrigação legal dos estatutos e tantas outras que o modernismo de hoje nos obriga seguir a regra. Afinal se por uma infelicidade o Grupo se extinguir tudo vai pertencer a União dos Escoteiros do Brasil. Já não basta nosso trabalho na Tropa, nos acampamentos, nas atividades ao ar livre ainda temos que correr para manter o Grupo Escoteiro legalizado. Por curiosidade fui dar uma olhada nas regras no Google. Desisti. Não era minha praia.

                            Vez ou outra eu me pergunto se vale a pena termos um sistema formal de manter em uma só unidade todas as sessões Escoteiras. Todos dizem que ali somos uma grande família. Ela cresce, começa do lobo aos sete (que falta faz os castores não?) e termina aos vinte e três nos pioneiros. Uma família linda quando reunida. Mas que trabalho esta família dá. Pense nos programas diversos de cada sessão. Pense nas atividades no planejamento, no corre-corre em conseguir suprir as necessidades para manter cada patrulha, cada Tropa, cada matilha seja na sede ou no campo. Temos que ter uma estrutura enorme. Conheci grupos que por terem boas condições financeiras tinham funcionários para a burocracia e me pasmei com um que tinha um profissional Escoteiro responsável para conseguir os fundos necessários para a subsistência do Grupo Escoteiro.

                         Foi então que fiquei pensando se estamos certo em manter esta estrutura. Sei que em alguns países não é assim. Pelo menos nos Estados Unidos a Boy Scout desde os seus primórdios valorizou mais a sessão. Um voluntário quando quer organizar uma unidade ou é convidado, sempre consegue uma sala, um local para atuar. Nada de ter muitos de idades sucessivas aglutinados no mesmo núcleo. Nada de grandes obras para a sede escoteira. Hoje me disseram que os profissionais escoteiros dão suporte, mas isto não importa, seja por sessão seja por unidade de Grupo para mim seria a mesma coisa a existência dos profissionais. Claro que se existem um grande número de voluntários eles são como nós, com uma diferença tem enorme apoio da entidade máxima e profissionais para colaborar. Isto também tem um preço a pagar.

                        Ainda me pergunto como seriam em outros países, os ingleses como funcionam, os franceses, os italianos, os espanhóis e portugueses e tantos outros que tem bons contingentes escoteiros. Até mesmo nas Filipinas campeã de membros escoteiros no mundo. Sei que não é fácil a sede própria, sei que para a maioria é um sonho. Quando temos de fazer um proselitismo para tentar mostrar as vantagens do movimento Escoteiro somos nós mesmos que o fazemos. Sabemos que não teremos nenhum auxilio por parte dos nossos dirigentes. Sede própria? Um trabalhão enorme. Tente achar um local ou um terreno desocupado, tente ver um vereador para juntos pleitear, tente conseguir do prefeito um de acordo e sabemos que não conseguiremos nada facilmente. Não temos mesmo respaldo da sociedade como um todo para o escotismo. Afinal dizem que vendemos biscoitos, ajudamos a velhinha a atravessar a rua, e ainda tem aqueles a nos gozar nas esquinas gritando alto; Sempre Alerta!


                        Não acredito mesmo que a União dos Escoteiros do Brasil um dia iria fazer um convite a todos para discutirem este tema e o dissecarem em suas bases. Ela até hoje acredita que sabe o que precisamos. Ela é nosso papai, nossa mamãe que sabe que devemos ir à escola, que devemos estar em casa antes das dez e que diferente de muitas famílias nunca teremos a nossa mesada no fim do mês. Acostumamos a aceitar tudo e como ainda não vimos o que existe no outro lado da montanha, afirmamos que vivemos nos melhores dos mundos. Cada um aceita sua trilha que escolheu e nem procura saber se a outra era melhor que esta. É difícil arriscar e sair da comodidade cotidiana, Nos acostumamos com o mais ou menos da vida. Afinal quando entramos para o escotismo sempre foi assim, e como dizem muitos, estamos aqui pelas crianças. Mas não poderíamos tentar pelo menos melhorar a vida escoteira para elas? E meus parabéns aos poucos grupos que lutaram e conseguiram sua sede própria.