sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

As sementes Africanas no Escotismo. O Chifre de Kudu.


As sementes Africanas no Escotismo.
O Chifre de Kudu.

              Baden-Powell nos presenteou com muitas tradições e místicas que aos poucos estão desaparecendo da história escoteira. A busca incessante no que é moderno acabou com muitas destas tradições e hoje poucos ainda sabem para que servem. No meu alfarrábio “Simbolismo e Místicas Escoteiras” eu comento algumas delas. O Chifre de Kudu hoje é lembrado com uma das excentricidades de Baden-Powell. Em Gilwell Park para os que se aventurarem a uma volta a Gilwell certamente irá ouvi-lo. Até a década de setenta os Cursos no Brasil ainda utilizavam. Hoje pelo que saiba são poucos Formadores que ainda mantém a tradição. Vejamos sua história:

             O Kudu (Tregelaphus strepsiceros) é uma espécie de antílope cujo habitat vai desde a África do Sul á Etiópia. Um touro Kudu pode chegar a uma altura de 1,5 metros e tem uma coloração que vai de um cinzento avermelhado até quase azul. As suas características de visão aguçada, bom sentido de audição, olfato apurado e grande velocidade fazem dele um animal difícil de capturar. Seguindo uma tradição que remonta há 90 anos, as patrulhas são chamadas a reunir com o toque tradicional do chifre de Kudu, durante os cursos da Insígnia de Madeira. Pode parecer estranho que o chifre de um antílope africano, do tipo usado pelos Matabeles como clarim de guerra no século XIX, seja usado para chamar Escoteiros e Chefes por esse mundo afora. Mas foi precisamente com um toque deste chifre que os primeiros Escoteiros foram acordados nos primórdios do escotismo.

Quando realizou o primeiro acampamento em Brownsea, Baden-Powell lembrou-se do chifre de Kudu que tinha trazido das guerras contra os Matabeles, e usou-o para dar um toque de aventura e divertimento ao acampamento. De fato, foi durante o acampamento experimental de Brownsea, em Poole Harbour, no verão de 1907, que Baden-Powell colocou ao serviço do Escotismo, e pela primeira vez, o chifre de Kudu. William Hillcourt, um dos grandes pioneiros do Escotismo, o mesmo que escreveu o resumo da história de BP no final do «Escotismo para Rapazes», descreve assim a primeira alvorada em Brownsea: - "O dia começou ás 6h da manhã, quando BP acordou o acampamento com o som esquisito do longo chifre de Kudu em espiral - o clarim de guerra que tinha trazido da sua expedição à floresta de Somabula durante a Campanha Matabele de 1896".

John Thurman, grande nome do Escotismo britânico, conta como BP conheceu o chifre de Kudu: - "Como coronel na África, em 1896, Baden-Powell comandou uma coluna militar na Campanha Matabele. Foi num raid pelo rio Shangani que ele primeiro ouviu o som do chifre de Kudu. Ele andava confundido pela rapidez com que os alarmes eram espalhados entre os Matabeles, até que um dia se apercebeu que eles usavam o chifre de Kudu, o qual tinha uma grande potência sonora. Era usado um código. Assim que o inimigo era avistado, o alarme era tocado no Kudu, para todos os lados, e assim transmitido por muitas milhas em pouco tempo".

Depois da ilha de Brownsea, o chifre de Kudu voltou para a casa de BP onde permaneceu silenciosamente durante 12 anos, enquanto o movimento que ele anunciara se tornava moda e se espalhava pelo mundo fora. Então, em 1919, Baden-Powell entregou o chifre ao Parque de Gilwell para ser usado nos primeiros cursos para adestramento de Chefes. William Hillcourt comenta assim o início do uso do chifre de Kudu no Parque de Gilwell, na floresta de Epping, Inglaterra, a oito de Setembro de 1919:

- "O primeiro acampamento para adestramento de chefes feito em Gilwell começou a oito de Setembro. Seguiu o padrão que BP tinha usado com os rapazes em Brownsea, 12 anos atrás. O sistema de patrulhas foi novamente posto á prova com 19 participantes divididos em patrulhas e vivendo uma vida em patrulha. A instrução tomou a mesma forma que em Brownsea. Cada dia um assunto novo era introduzido e aplicado em demonstrações, prática e jogos. O chifre de Kudu dos Matabeles que tinha sido usado para chamar os rapazes em Brownsea foi usado para todos os sinais." - Dez anos mais tarde, aos 72 anos de idade, Baden-Powell levou consigo o chifre de Kudu para a abertura do 3º Jamboree Mundial, em Arrowe Park, Birkenhead, Inglaterra, a 28 de Julho de 1929. Foi constatado, pela experiência de Arrowe Park, que fazer soar o chifre de Kudu é um desafio. Os resultados, no entanto, foram tão impressionantes quanto se poderia desejar, segundo as palavras de William Hillcourt:

            "O dia da abertura do 3º Jamboree Mundial começou com uma forte chuvarada que aumentou com o passar do dia; mas, à hora prevista... o tempo tornou-se «ameno». BP tinha trazido consigo para Arrowe Park o velho chifre de Kudu dos dias da guerra com os Matabeles e que tinha sido usado para acordar os acampados em Brownsea no primeiro acampamento de escoteiros do mundo e para abrir o primeiro curso para chefes no Parque de Gilwell. Levou-o aos lábios para dar um toque que haveria de ecoar pela extensa parada em frente dele, mas, com o excitamento, os lábios recusaram-se a fazer o que deviam. O som do chifre não passou de um fraco «pff». No entanto, como que chamados para a ação pelo chifre, a marcha começou, com os contingentes a desfilarem atrás de contingentes em frente da plateia, com as bandeiras de quase todas as nações civilizadas desfraldadas ao vento, com milhares de pessoas a aplaudirem cada nação entusiasticamente.”.


             Ainda hoje o chifre é usado para reunir chefes em cursos de formação em todo o mundo. Para todos os que seguem as pegadas do fundador, é um viver do Escotismo no seu melhor.