quarta-feira, 27 de março de 2019

Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro. Nó górdio.



Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
Nó górdio.

Nota do editor: - Relata-se que Alexandre Magno, rei da Macedônia, no início de sua campanha contra os persas, parou em Gordião, capital da Frígia. Ali, foi informado de que um oráculo havia prometido o império da Ásia a quem desatasse o complicadíssimo nó que prendia o jugo ao timão da carroça de Górdio, rei da Frígia. Não conseguindo desatá-lo, Alexandre Magno cortou-o com a espada. Esse gesto de Alexandre simboliza perfeitamente a ação da violência: ele corta o nó em vez de desatá-lo. Com esse gesto, destrói de forma irreparável a corda em que se encontrava o nó, tornando-a definitivamente inutilizável.

            Chico Bento sempre foi um apaixonado de técnicas escoteiras. Nada deixava passar sem aprender. Lembro que ele treinou tanto Morse em uma cigarra que um
Chefe de Estação conhecido de seu pai disse que quando crescesse seria um ótimo telegrafista. Não foi e deu graças a deus. Risos. O Morse foi seu caminho por anos. A patrulha tinha nos dedos a maneira correta de conversar por Morse. Um segredo que ninguem nunca contou. Não deu muito certo o Morse por sinais de fumaça. Demorava demais. Semaforas ele gostava também, mas nem tanto como o Morse. Dificilmente saiam para acampar sem um bom par de bandeirolas de semaforas e uma boa lanterna. Naquela época as lanternas não duravam como hoje. Era comum quando acampavam em patrulha cada uma tinha em seu campo um portico para transmitir o Morse e a semáforas em cima dele. Era obrigatório sempre ter dois membros nas transmissões. Um para transmitir e outro para orientar o transmissor.

           Mas um dia a patrulha ficou “encucada” quando soube que existia um nó que ninguem nunca desatou. Chamava-se Nó Górdio. Qualquer um da patrulha fazia tranquilamente com os olhos fechados ou com as mãos as costas pelo menos dezoito nós escoteiros e mais quinze de marinheiros. Nonõ da Patrulha Morcego tinha um irmão marinheiro. Era ele visitar a familia e lá estavam todos da patrulha encostados nele para aprender nós que ainda não sabiam. Foi ele quem contou sobre o tal nó Górdio. Era uma lenda que envolveu o Rei da Frigia e Alexandre, o Grande. Ficou famoso como metáfora de um problema insolúvel (desatando um nó impossível). Bem a historia é longa e não vou contar todos os detalhes, mas só para saber tudo começou com o aviso de um Oráculo que um sucessor do rei da Frigia iria chegar. Chamava-se Górdio. O moço chegou e foi coroado Rei. Chegou em uma carroça, pois era pessoa humilde e amarrou a carroça em uma coluna com um nó que ninguem conseguiria desfazer.

       Dizem que Górdio reinou por muitos anos e deixou como herdeiro seu filho Midas que expandiu o império, mas ao falecer não deixou herdeiros. O Oráculo ouvido novamente declarou que quem desatasse o nó seria o rei. Quinhentos anos se passaram e ninguem conseguiu. Muitos anos depois Alexandre o Grande ouviu esta lenda ao passar pela Frígia. Foi até o templo de Zeus e viu o nó Górdio. Não conseguiu desfazê-lo. Pegou a espada e cortou o nó. Lenda ou não o fato é que Alexandre se tornou o Rei de toda a Ásia Menor. O marinheiro riu depois de contar e completou – E daí também que deriva a expressão “cortar o nó górdio” o que significa resolver um problema complexo de maneira eficaz.

        Chico Bento ria quando contava esta história. Meus amigos disse em uma roda de fogo de conselho, achamos a história interessante, mas e como fazer o tal nó? O marinheiro não sabia. Muitos anos depois nos mostraram a foto do nó. É este perguntei? Quem me mostrou riu e disse não ter certeza.

        Sei não, mas nunca fui tão severo como São Tomé que dizem dizia só vendo para crer. Mas uma coisa amigos eu tenho certeza naquela época se aceitava todo tipo de desafio. Muitos demoraram anos para desvendar, mas outros as patrulhas buscavam “céus e terras” e nunca desistiam. Nós e amarras, costuras de arremate, armadilhas de todos os tipos, conseguir tirar uma pena de um gavião vivo e depois soltá-lo, transportar por corda um doente na maca por cima de um riacho, transmitir Morse e Semaforas deitado, de costas, e até pendurado por uma corda de cabeça para baixo eram desafios normais. Mas quer saber? Até hoje não desvendei como fazer e desmanchar o manhoso Nó Górdio das longiquas terras da Frigia.

        Pois é, depois de ouvir Chico Bento eu mesmo procurei fazer o tal nó. Como? Passei belas tardes na Biblioteca de Dona Etelvina e nada. Paciencia, anos depois já velhote descobri sua foto, olhei, olhei e disse para mim mesmo: - Vado Escoteiro, com talento ordinário e perseverança extraordinária, todas as coisas são possíveis. Será? Melhor copiar Clarice Lispector: - Decifra-me, mas não conclua... Eu posso te surpreender.