Conversa ao
pé do fogo.
Acampar é
sonhar com a natureza.
Se você é Escoteiro já
deve ter acampado. Isto mesmo e eu sei que foram muitas vezes. Já escrevi aqui
a diferença de Camping com Acampamentos Escoteiros. Eu já fiz camping por boa
parte deste Brasil. É divertido. Temos conforto, uma barraca que dá para ficar
em pé, levamos rádio, TV, o fogareiro a gás tem duas ou três bocas, as mesinhas
são fáceis de armar, os bancos ou cadeiras de praias estão ali para nosso
deleite. Enfim, um conforto enorme e sem esquecer que temos luz elétrica e próximo
chuveiros quentes. Uma delicia. E em um Trailer? Impossível imaginar a
“gostosura”. Bom demais. Tive um Diamante e me esbaldava com ele. Que conforto
meu Deus! Mas isto não é escotismo. Nunca foi. Vejo fotos de barracas
inteligentes, suspensas, algumas em árvores como se fosse à casa do Tarzan. A
turma se delicia com estas fotos e com estes confortos. Mas pergunto novamente
isto é acampamento? Isto é escotismo?
Claro que não. Eu lembro quase
tudo dos meus acampamentos Escoteiros, mas pouco me lembro dos meus campings e
do meu trailer. Não desmereço os primeiros acampamentos, as barracas novas,
cheirando a pano de loja. Isto é norma para pata tenras. Mas se sua turma já é
escolada, ela acampa com ou sem barraca e que venha a chuva! Quer saber? Nunca
usei um Sleeping ou saco de dormir. Nunca usei um colchonete. Mas sei que hoje
os tempos são outros e a meninada precisa primeiro aprender a ser um bom
mateiro. Por isto vá cortando de acampamento em acampamento. Quando eles souberem
fazer um abrigo e tiver somente uma lona em cima o caminho começa a dar frutos.
Um Chefe outro dia comentou que
ele já dispensa os veículos dos pais ou ônibus fretado, e aprenderam a usar as
pernas como transporte. Carregam tudo que precisam na mochila, pegam ônibus,
trens e vão aonde muitos nem sequer imaginaram. Mas isto eu sei é para uma
tropa mateira. E olhe ele disse que mora em cidade grande. Estupendo! Um artigo
meu fazendo gosação comentou sobre o que ensinou um Chefe Escoteiro sobre o
material a levar para o campo. Incrível eu pensei. Isto é material para os escoteirinhos
pata-tenras, onde a Mamãe a vovó e a titia ficam ali insistindo com ele para
levar. Coitado. Vai aprender a carregar peso sem a necessidade e pobre das suas
costas. E quando ele entrar em um ônibus? Bate aqui, bate ali e todo mundo olhando
para ele espantado ou resmungando. No caminho ele fica para trás. Um bom Chefe
divide com os demais a tralha dele com os outros, eu não, eu deixo ele se matar
para aprender. Não é fazendo que se aprenda?
Lá no acampamento é uma beleza.
Os bons chefes vão lá ajudar a escoteirada a armar a tenda, a preparar um fogo,
a fazer a cozinhar e etc. e tal. Eu não. O que eles foram fazer ali? Um jogo de
olhar o Chefe? Eles que se virem. Afinal para que serviu o acampamento de
monitores, o acampamento experimental de um fim de semana? Não ajudo mesmo. Que
fiquem com fome que durmam no relento. Quando a fome apertar eles farão o fogo,
quando o fogo estiver pronto eles aprendem a cozinhar. Se botarem açúcar no
arroz paciência. Que comam arroz doce. Se o bife torrou danou-se, mas que
mordam o queimado. Se for para pegar na mão do Escoteiro não conte comigo. Olhe
que já acampei com tropas e tropas neste mundão de Deus. Quantos mateiros Escoteiros
e escoteiras eu vi crescer? Centenas. Gente boa, gente que aprendeu a fazer fazendo
e que quando adulto saberão se virar e ter iniciativa. Isto sem a mamãe e o
chefinho Professor.
Quantas vezes dormimos ao
relento? Quantas chuvas enfrentamos? Quantos dias frios tiramos de letra com um
bom Fogo Espelho? Conheci meninos Escoteiros que uma parada de uma hora em uma
jornada era suficiente para uma fazer uma sopa e prosseguir. Turma da pesada! E
quantas vezes dormimos sobre pedras, nas subidas das montanhas, molhados com a
chuva e nos viramos com uma árvore copada? Pergunte aos que fizeram isto e
verão um brilho em seus olhos, uma lembrança gostosa, um sabor diferente no
aprender para a vida. Sei que hoje os pais não são como antigamente, mas se
fosse eu diria: - Senhor, o escotismo vai ser assim. Se quiser que seu filho
seja um homem no sentido da palavra ele vai aprender a fazer fazendo. Se o
senhor acha que não dá, melhor que ele não fique conosco! Deixa o jovem chorar
e reclamar com o pai. Ou ele o deixa ir conosco e aprender ou então que o leve
para casa.
Acampar à Escoteira! Bom
demais. Sozinho, enfrentando tudo. Medo? Putz! De que por acaso? Fantasmas? Eu
dou risadas. Curei meu medo nos acampamentos onde uma árvore á noite era copia
do demônio. Onde uma casa de cupim nos montes nos fazia tremer nas madrugadas.
Cobras? Escorpiões? Animais selvagens? Não sei se isto existe mais. Dormi
amarrado por horas em um pé de pequi olhando para baixo e vendo uma jaguatirica
deitada me esperando. Hoje isto não mais existe, mas ainda dá para fazer
atividades aventureiras. Ora se dá. Agora se você é daqueles que levam pais
para ajudar na cozinha, se você é daqueles que montam barracas e pioneirias explicando
como se faz com a escoteirada em volta, paciência. Você não é o tipo de Chefe
que acredito. Muito mais se é você quem estica a corda que é o primeiro a fazer
o comando Crown e a escoteirada olhando, que adora fazer um caminho de barro e
deixar que eles se lambuzem para uma boa foto, vá lá. Faça assim. Não é o que
faria.
Muitas vezes não culpo você
por isto. Você não teve a felicidade de acampar como os Escoteiros acampam.
Hoje você tenta ao seu modo, pois aprendeu assim. Os cursos não lhe deram um
começo de pista. Mas quer saber? Errar é humano e persistir no erro é uma
tremenda burrice. Saia da sua rotina de sempre se quer fazer bons escoteiros.
Acampe, vá onde ninguém foi com eles, mas deixe que eles tomem a frente. Você
não é o Borba Gato, um Raposo Tavares ou um Fernão Dias Paes. Se divirta com o
que eles fazem. Sinta-se realizado em estar ali ajudando de longe e claro você
sabe disto. Eles precisam de você, mas não como o papai e a mamãe, mas como um
herói que eles querem ser. Lembre-se não seja enganado como o foi Fernão Dias
Paes que sempre acreditou ter encontrado esmeraldas, mas nunca ficou sabendo da
riqueza que encontrou. As famosas turmalinas de Minas Gerais.
Barracas suspensas com um
simples toque? Luz elétrica no campo? Enormes sacos de dormir acolchoados
esticados nas barracas? Unguento para mosquitos? Bah! Não é o escotismo que
penso. Faça acampamento meu amigo, acampamento de Gilwell como deve ser e não
Camping. E por favor, não me convide para isto, mesmo Velho Escoteiro como sou
ainda acho que dormirei bem em um galho de arvore sem necessidade da
Jaguatirica a me olhar. Ufa! Acho que foi isto que me fez Escoteiro até hoje!