Crônicas de
um Velho Escoteiro.
Quer saber?
Eu adoro desfilar.
Bom
demais. Só quem já passou por isto sabe o orgulho, o frenesi de estar ali
desfilando, marchando, cantando, ou então tocando em um instrumento qualquer
nos desfiles que para muitos se tornaram histórias. Não sei se era uma paixão
enorme por ser Escoteiro, por ter passado uma semana engraxando o Vulcabrás,
polindo as estrelas de metal, polindo o cinto e dobrando o lenço Escoteiro de
olho no seu chapéu de abas largas. Sempre com a mente voltada para o dia
especial. Cada desfile tinha um sabor diferente. As palmas do público quando
pipocavam a gente sentia um entusiasmo próprio de ser Escoteiro e brasileiro.
Não dá para esquecer o palanque, o alto, o direita volver, a saudação à
autoridade, o corneteiro brilhando no seu toque, o retorno e ainda dar uma
colher de chá aos bairros mais distantes fazendo lá também seu périplo de
orgulho em desfilar. Época de enfrentamento de bandas, de fanfarras, a do
colégio, a da Escola Estadual, o Ginásio dos padres, e o Berica. O Berica?
Gente eu não me esqueço dele. Tinha uma fanfarra comprada com seu dinheiro.
Fazia questão de desfilar com ela em um Grupo Escolar. Tinha até uma cantoria
conhecida de todo mundo que dizia: Arreda Grupo, que o Ginásio vem, que catinga
de macaco, que o Berica tem! Kkkk.
Eram tempos que ficávamos
treinando ordem unida duas três vez por semana. Nestas épocas os acampamentos,
as atividades aventureiras diminuíam de intensidade e davam lugar aos treinos,
onde todos acorriam no campinho do Zefir Futebol Clube. Eram mães, pais, avós,
tios tias, vizinhos e onde a meninada pequena ficava com os olhos brilhando a
olhar o treino e sonhar que um dia seria um de nós. Ah! Saudade lembrada,
saudade sentida, saudade hoje e para o resto da vida. São saudades eternas. Em
um aniversário da cidade ganhamos mais cinco tambores, quatro tarois, quatro
bumbos e cinco cornetas. Haja “embocadura” para tocar todas elas. Foi presente
do Tiro de Guerra, amigo nosso de longa data. Quando chegou minha hora de
servir a pátria eles me receberam de braços abertos. Claro, com uma corneta! Risos.
Então voltemos à festividade. Nossa “banda” tinha mais de quarenta
instrumentos. Ninguém tinha igual. Formados na sede esperávamos o Munir nosso
Maestro e Guia Monitor para dar a ordem de: Grupo! Firme! Em frente, marche!
Tivemos no passado um fato que
marcou. Quer saber? Não fomos bons Escoteiros, mas até hoje eu guardo tudo na
memória. O prefeito chamou a Banda de Colatina para desfilar na cidade.
Treinada pelos Fuzileiros Navais. Respeitada em todo vale do Rio Doce. Munir
nosso maestro e Guia da Tropa gritou: - Vocês são Escoteiros ou monte de
“merda”! – Deus do céu, agora era para valer. Lá fomos nós com o orgulho
próprio que BP nos deu. Ao passar uma banda pela outra foi como se uma bomba
tivesse explodido. Quase houve brigas, mas enfrentamos sem medo. O prefeito não
gostou. Reclamou com o Chefe João chefe do grupo. Na partida deles fizemos uma
delegação e fomos lá pedir desculpas. Eles riram, e oh! Que vontade de sair no
tapa com eles! No vagão enquanto o trem partia gritavam: - Quer apanhar? Vão a Colatina.
Soube que o prefeito pagou
todas as despesas, pois muitos instrumentos quebraram. O tempo passou e nós
fomos a Colatina várias vezes. Um grupo irmão se fez lá. Ficamos de castigo por
três meses. Não podíamos acampar, não podíamos excursionar, nossas bicicletas
estavam enferrujando (uma maneira de dizer). Que saudades da minha mochila, da
minha barraca, de fazer uma pioneiria, de cantar em volta de um fogo. Mas Chefe
João era duro e queda. O tempo passou e tudo foi esquecido. Esquecido? Nunca vi
tantas enquetes da briga nos fogos de conselho. E nas conversas ao pé do fogo?
Tinha Escoteiro que rolava no chão de tanto rir. No Sete de Setembro o prefeito
não nos deixou desfilar. Deixou que tomássemos conta dos grupos escolares e
mais nada. Paciência. Se errarmos nós temos que aprender com nossos erros. O
“diabo” maior foi ver a banda de Colatina desfilando e rindo de nós. Acho que
merecemos.
Sei que hoje somente os
saudosos chefes de cidades do interior ainda pensam assim. Eles sabem que a
meninada gosta e nas suas cidades todos se orgulham em desfilar. Nunca esqueci
quando cheguei em Sampa. Um chefão paulista da gema olhou para mim como se
fosse Deus e disse: - Só andando. Passos orgulhosos sem marchar! – Por quê? Eu
perguntei. – Porque Escoteiro não marcha, não somos militares. – Um perfeito “bobiota”.
Mistura de bobo com idiota. Nem liguei e até marchei com mais força. Lembro que
lá por volta de 1980 um destes “bobiotas” de novo falou para não marcharmos.
Nada de marchar. Caramba! O que ele sabe ou entende sobre isto? O que ele sabe
dos pais e amigos dos meninos que foram ali para assistir? O que ele sabe do
orgulho dos jovens em desfilar marchando e sorrindo pelo que estão fazendo? Não
sei por que estes “bobiotas” acham que marchar é errado – Um Chefe me disse um, isto é militarismo! Não
somos militar! – E dai? Quantos meninos sonham com isto? Querem tirar o sonho
dos jovens Escoteiros e Escoteiras? Já vi alguns que nem alto, nem direita
volver, nem firme e descansar dizem mais. Isto é ser militar.
Cacilda para não dizer
outra coisa. Pelo menos ensinam aos militares que o Brasil é grande, que temos
orgulho, que servir a pátria é uma honra. Idiotas estes chefes que nada
entendem. Gostaria de levá-los para o campo. Se não querem marchar devem ser
bons em técnicas Escoteiras. Afinal marchei muito e gostaria, portanto de vê-los
no campo. Mostrar técnicas Escoteiras
que eles nunca viram mostrar artimanhas e engenhocas que eles ficariam estupefatos em ver. Mostrar
como se trabalha com cipó, como se virar com comida mateira colhida na
floresta. Mostrar em um jogo noturno que o Morse é bom demais. Mostrar que ser
Escoteiro não é aprender o que querem que aprendamos hoje. Que este palavrório de
novos tempos é papo furado. Ser Escoteiro é muito mais que isto, é o sonho de
um grande homem que criou um escotismo e era um militar. É ter orgulho é paixão
pelo Brasil, é cantar o Rataplã de cabeça erguida. Em se sentir bem em uma
patrulha e saber que ali somos todos irmãos.
Época em que nós meninos acreditávamos no
brilhantismo de desfilar, lembrar-se de um Don Pedro I em seu cavalo branco
mesmo que não seja a insurgir-se com Portugal. E na bandeira ao final do
desfile todos formados na sede. Cantando com a dignidade de um infante o hino
Nacional. Ali lobinhos Escoteiros e sênior sorriam orgulhosamente cantando o Rataplã.
Nunca esqueci. Os chefes ao final vinham em fileira cumprimentar a cada um. Um
aperto de mão gostoso, um sempre alerta saudoso – Parabéns obrigado pela sua
contribuição com a pátria. Gente isto fazia um bem danado. Agora não pode.
Dizem que é militarismo. Bendito BP um milico que se orgulhava de marchar com
seus Escoteiros. E viva o Brasil e abaixo a tirania!