Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
Adeus 2015.
Mais um ano que vai,
mais um ano que vem. Muitas histórias ficaram para trás, muitas historias irão
acontecer novamente. A humanidade festeja a ida de um e a chegada de outro. Na noite
do dia 31 de dezembro, quando virar o ano países do mundo inteiro estarão
cantando Auld Lang Syne. Orquestras iram tocar a melodia de diversas formas,
pessoas irão se abraçar alguns terão lágrimas nos olhos a lembrar do ano que se
foi. Bons para uns ruins para outros. Entes queridos se foram, alguns fizeram
fortunas, outros perderam tudo. Eu costumo sentar em minha varanda e ouvir meu
LP de Guy Lombardo a tocar Auld Lang Syne. Nada mais nada menos que a nossa
querida canção da despedida. É uma melodia popular conhecida no Velho mundo. A
letra original é de um poema escocês escrito por Robert Burns em 1788. Dizem
que significa “Velho e longo tempo” alguns chamam de “Muito tempo atrás” e tem
aqueles que dizem se chamar “Como nos velhos tempos”
Não importa o nome original,
para nós ela é a Canção da Despedida. Não sei quem adaptou nova letra a esta
melodia tão maravilhosa que nós escoteiros nunca a esquecemos. Assoviamos,
cantamos, ela ressoa na memória e bate fundo no peito e no coração Escoteiro. É
bela demais. Ela nos dá a certeza que nunca vamos nos separar que bem cedo
junto ao fogo vamos nos reunir outra vez. Não temos a tradição de cantá-la na
virada do ano. No Brasil poucos estados nas festas da virada cantam. Temos sim
a tradição de cantar no final do Fogo de Conselho. Aprendemos a entrelaçar as
mãos, apertar fortemente, cantar e chorar. Quem não chora? Dizem que tem
escoteiros durões, mas eu não acredito. No fundo do coração bate forte uma
saudade uma vontade de dizer “Eu te amo” gritar naquela noite sem lua ou com
lua, que o escotismo mora no meu coração para sempre. Nem sempre estamos em uma
clareira da floresta, mas na nossa frente tem uma fogueira. Chamas com fagulhas
subindo aos céus. Olhares de amigos que já existiam e outros que fizemos entrelaçam
no circulo do amor.
No dia 31 de dezembro Auld Lang Syne vai ser cantada, orquestras irão
tocar sua melodia imortal no novo e no Velho mundo. Bem longe em um país verde
e amarelo alguns cantarão também lembrando seu primeiro acampamento, outros
lembrando um fato que o marcou para sempre em uma atividade escoteira quando
cantaram a Canção da Despedida. Pode ter sido um curso delicioso, pode ter sido
uma visita fraterna, pode ser em uma conversa ao pé do fogo. As cantadas no
Fogo de Conselho dizem que são as que marcam mais. Não sei. Cada um tem a sua e
o seu lugar. Eu cantei em países sul americanos, em diversos estados
brasileiros, em florestas virgens, em picos formosos. Cantei a noite olhando
estrelas, cantei durante o dia vendo o sol ou a chuva. Não importa onde. Para
mim é a mais sublime das canções Escoteiras. Nunca esqueci a primeira vez. Meu
primeiro acampamento. Hã! Quanto tempo se passou. 1950? 1951? Não lembro. Foi
meu primeiro acampamento como Escoteiro. Seis dias, mata fechada, selva
inóspita, barracas montadas, fogão suspenso, sala de refeições. Putz! Quantas
coisas fizemos.
Penúltimo dia, última
noite. Um fogo de conselho só da tropa. Fico arrepiado só em lembrar. Foi demais,
cantei, brinquei, fingi ser um padre em uma esquete, aprendi a aplaudir de
diversas maneira. Silencio Acampamento, Peito arfante, tambor, mexicana, um
dedinho, O trem, o Matuto, escocesa, nossa foram tantas que até me perdi. Mas
acreditem terminou. Todos se levantaram. Olhei para um e outro. Deram as mãos.
Dei as minhas também. Assim, disse o monitor me ensinado a dar as mãos
entrelaçadas. Não conhecia a letra, fui ouvindo e aprendendo. Comecei a
entender o que ela dizia. A emoção era demais. Tocou-me fundo o coração.
Lágrimas começaram a correr pelo meu rosto. Onze anos, um chorão que não sabia
que iria chorar para sempre. Terminou a
canção. Fogueira ainda crepitando, estrelas brilhavam maravilhosamente no céu.
Vento frio, brisa no rosto, cheiro da terra, do capim meloso, grilos
saltitando, vagalumes mostrando seus brilhos. Silencio enorme. Um olhando para
o outro. Tentando disfarçar as lágrimas. Trombeta tocando. Final. Reunir, Boa
noite Touros! É ninguém esquece. Não dá para esquecer.
Sei que todos conhecem a letra. Não dá
para perder as esperanças, pois vamos nos tornar a ver. Neste fogo ou em outras
eras nossas mãos de novo vão entrelaçar. Não é mais que um até logo, não mais
que um breve adeus. Foi bom, muito bom te conhecer. Eu sei que o Senhor que nos
protege e está sempre a nos abençoar, um dia certamente vai de novo nos juntar.
Lembra supimpa, linda, maravilhosa, tentei descobrir quem a escreveu, não
consegui. Sei que deve ter sido um iluminado. Escreveu como anjo Escoteiro. De
vez em quando penso se ela dói se machuca, se a saudade gritante fala
silenciosamente em nosso coração. É uma situação inusitada. Se contarmos para
amigos eles vão rir de nós. Vão achar que somos tolos, nostálgicos. Eles não
sabem o que significa para nós. Eu sempre fui um Bebê chorão. Sempre lágrimas a
cair sobre a terra, nosso chão abençoado.
Não sei se conhecem a letra original. Aquela escrita por Robert Burns. É
linda, mas não se compara com a nossa. Sei que no virar do dia 31 de dezembro,
milhões e milhões de pessoas estarão cantando por isto abaixo deixo uma parte
dela. Eu estarei em minha varanda, ouvindo Auld Lang Syne e quem sabe chorando.
Cantarei baixinho dizendo que não é mais que um até logo. Pensarei em minha
vida, nos velhos tempos que nunca serão esquecidos. Pelos novos e antigos tempos,
ainda tomaremos um cafezinho no fogo de conselho. Se houver lua cantarei se não
houver canto também. Esta é a minha canção. Trago sempre junto a mim. Uma canção
nunca será esquecida!
Letra original da Canção da Despedida, ou melhor,
Auld Lang Syne.
- Os antigos conhecidos deveriam ser esquecido e
nunca lembrados?
Os antigos conhecidos deveriam ser esquecidos e os
velhos tempos?
- Pelos velhos tempos, minha querida, pelos velhos
tempos;
Ainda tomaremos uma xicara de bondade, pelos velhos
tempos.
- E certamente, você pagará pela sua e eu pela
minha,
Ainda tomaremos uma xicara de bondade, pelos velhos
tempos...
- Nós dois já corremos pelas colinas, e colhemos
margaridas,
Mas já vagamos cansados por muitos lugares, desde
os velhos tempos...
- Nós dois remamos na corrente, do sol da manhã até
a noite,
Mas os mares entre nós já bravejaram muito, desde
os velhos tempos.
- Pelos velhos tempos, minha querida pelos velhos
tempos,
Ainda tomaremos uma chícara de bondade, pelos
velhos tempos...