Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
Benjamin de Almeida Sodré – O Velho Lobo.
Foi em 1951 quando fazendo uma arrumação na sede escoteira, encontrei em uma
gaveta da estante o primeiro livro escoteiro que via em minha vida. Olhei para
ele como se tivesse encontrado um tesouro. Seu titulo era: - Guia do Escoteiro
– Velho Lobo – Rio de Janeiro – Em cima escrito: - Pelo futuro do Brasil.
Fiquei impressionado. O Chefe deixou que o levasse como empréstimo. O li todo
em dois dias. Passei uma noite folheando suas páginas. Foi o meu primeiro e me
marcou para sempre.
Tivemos grandes escritores escoteiros no Brasil. Sem desmerecer os atuais,
Benjamim Sodré e Francisco Floriano de Paula são considerados até nos dias de
hoje pela sua erudição escoteira. Muito do que sei aprendi no Guia do Escoteiro
e no Para Ser Escoteiro. Benjamim de Almeida Sodré um escoteiro e um
futebolista brasileiro ficou conhecido como Mimi Sodré. Campeão em 1910 e 1912,
pelo Botafogo. Mas isto para nós escoteiros não tem muito interesse. Filho de
Lauro de Almeida Sodré se tornaria um personagem muito importante na História
do Escotismo Brasileiro.
Interessante
que foi o primeiro a ser chamado de “O Velho Lobo” e que teve muito de sua vida
passagens e características semelhantes à de Baden-Powell. Ainda criança
mudou-se para o Rio de Janeiro e depois de terminar seus estudos secundários
prestou concurso para admissão na Escola Naval sendo aprovado em primeiro
lugar. Fez brilhante carreira na Marinha Brasileira, sobrevivendo ao naufrágio
do rebocador Guarani, em 1913 e posteriormente chefiando a Comissão Naval
Brasileira durante a II Guerra Mundial. Tornou-se Almirante em 1954.
Desde que entrou para o
escotismo brasileiro tornou-se um seguidor dos ideais de B-P participando da
fundação dos Escoteiros do Mar e do primeiro Grupo Escoteiro de Belém. Seu
livro o “Guia do Escoteiro” de 1925, é uma das mais importantes obras do
Escotismo Brasileiro. O “Velho Lobo” teve papel fundamental na idealização e
criação da União dos Escoteiros do Brasil ao reunir quatro de algumas das
confederações existentes. Escoteiros Católicos, do Mar, Escoteiros do Brasil e
Federação Fluminense de escoteiros. Foi honrado com uma série de títulos, entre
eles o de Cidadão Honorário do Rio de Janeiro. Recebeu várias medalhas de
mérito, presidindo a Ordem do Tapir de Prata a mais alta condecoração do
escotismo brasileiro. Faleceu em 1º de fevereiro de 1982, dois meses antes de
completar 90 anos.
Vale notar que no passado a
revista “(O Tico-Tico) uma das principais publicações infantis do país, abrigou
em 1922 uma coluna ESCOTISMO na qual o pseudônimo de “VELHO LOBO” dava sua
importante contribuição para a formação da juventude brasileira”. Após escrever
o “Guia do Escoteiro” em sua época foi reconhecido por muitas personalidades
entre as quais Coelho Neto, Rui Barbosa e Olavo Bilac.
Ocupou várias posições
importantes na hierarquia naval, tendo-se destacado em combate e durante um
naufrágio onde salvou bravamente dois colegas oficiais e um marinheiro lutando
contra condições adversas no mar. Ocupou várias posições importantes na
hierarquia naval, quando o Brasil estava em guerra contra os países do eixo,
(Alemanha-Itália) foi encarregado de comandar o petroleiro Marajó, único da
frota brasileira a transportar de Trinidad, nas Antilhas, o combustível
necessário à nossa Esquadra.
Apesar de ser presa cobiçada pelos
submarinos inimigos, o Marajó foi levado a bom termo, cumprindo o nosso
Benjamin Sodré a perigosa missão. Isto foi em 1940/41. Com a vida ligada aos
Escoteiros, à Marinha e à Natureza, e dotado de fina sensibilidade e
misticismo, Benjamin Sodré deixou-nos um texto, inspirado por ocasião da
celebração de uma missa rezada em 28 de setembro de 1948 na igrejinha da Boa
Viagem (Niterói), pelo Bispo D. João da Mata:
Eis o
texto: - "Há 12 anos eu sou o sineiro da Boa Viagem". Sineiro
convicto, emocionado. Entretanto, todos sabem que não sou religioso. Se o Bispo
fizesse alusão a isso, como eu responderia? Diria que faço tudo por Zi (apelido
carinhoso da esposa), que tanto tem se dedicado à sua linda capelinha. É a ela
que eu sirvo, trabalhando pela igreja. Mas, também, é verdade que venero as
imagens no que elas simbolizam: a Virgem Maria representa a Bondade e o Amor
Infinitos das Mães; minha mãe, minha esposa, minhas filhas. São Jorge, o
padroeiro dos escoteiros, é o cavaleiro indômito, exemplo de fortes virtudes;
São José, Santa Joana D'Arc... Jesus sintetiza a moral cristã, que eu sigo como
moral, como seguiria as normas de Confúcio, Buda e todos os grandes filósofos
moralistas pregadores.
Os
padres, sempre os olhei com simpatia e admiração; são homens que se
sacrificaram por um ideal de fé, privando-se do que a vida tem de mais belo,
por amor ao próximo. Por todos esses motivos, sou há 12 anos, com convicção, o
sineiro da Boa Viagem. E não creio que alguém assista à Missa com maior
emotividade do que a minha. Oh! O que aquela capelinha representa na minha
vida!... Aquela igrejinha é muito nossa e, por ela, por amor a Zi, tudo farei".
Escritor
e poeta, Benjamin Sodré legou-nos algumas páginas inspiradas, de puro
lirismo... Este é um trecho do texto que chamaríamos de "Contemplando a
manhã":
- "Sem nos apercebermos, enquanto o
espírito está suspenso na contemplação maravilhosa, quase as sombras foram
afugentadas... Uma franja avermelhada coroa, agora, todo o Oriente. A mata despertou
toda... Os trinados multiplicam-se, são incontáveis... O mar está azul. Nas
ilhas, a vegetação vai tomando o colorido habitual... Surgem os primeiros
rumores da vida humana... O sino da ilha bate sonoro, cadenciando o sino da
alvorada... Mais alguns segundos, o sol irrompe prodigioso, pondo por todo o
mar, em todas as árvores, uma faixa forte e viva de luz dourada... Vida!...
Vida!... Tudo estreia em intensa vida, com o ressurgimento do Grande Final
Criador!...”.
Almirante
Benjamim Sodré – (10 de abril de 1892 — 1 de fevereiro de 1982)
Nota de rodapé: - Sei que muitos desconhecem a historia
do primeiro Chefe a ser chamado de “Velho Lobo”. Benjamim Sodré assim como o fundador Baden-Powell, tinha uma série de
talentos e interesses diferentes. Foi
professor de astronomia, navegação e história da Escola Naval. Publicou
diversos trabalhos, foi maçom e, sobretudo
um excelente jogador de futebol. Desde que entrou para o Movimento Escoteiro tornou-se um
grande seguidor dos ideais de Baden-Powell, participando da fundação e
organização dos Escoteiros do Mar, o primeiro Grupo Escoteiro de Belém, a Federação de
Escoteiros paranaenses, entre outros. Escreveu o "Guia do Escoteiro" de 1925, uma das mais
importantes obras do Escotismo brasileiro.
Aqui um pouco de sua história. Boa leitura.