São
Paulo 09 de julho de 2016.
Ao meu
amigo,
Chefe Zé
das Quantas.
Brejo
Seco – RN – Brasil.
Meu caro
amigo Zé das Quantas, ou melhor, Chefe Zé. Quanto tempo eim? Preciso voltar às
origens e passar uns dias aí com você. Saudades e muitas dos velhos tempos. Disseram-me
que você ficou no tempo e ainda faz aquele escotismo de raiz, tradicional e
como nos deixou Baden-Powell. Lembra quando descobrimos na gaveta da sede
aquele livro dele? Como se chamava? Ah! Lembrei-me, Escotismo para Rapazes. Chefe
Zé, dizem que aquele foi modificado e o original tem outro tema. Esta turma de
hoje Zé são estudiosos, têm doutores, pensadores, pedagogos têm de tudo. Nós
dois Zé ficamos parados no tempo, eles sabem tantas coisas que fico de orelha caída
perto deles. Mas a vida é assim não Zé? Pelo menos você ainda é um Escoteiro simples,
sem tantas ambições que aqui a gente fica pensando se o escotismo tivesse
salário seria um Deus nos acuda! Mas estou escrevendo para lhe contar as
novidades. São tantas Zé, que se fosse colocar todas precisaria de muitas
páginas e sei da sua dificuldade para ler e eu em escrever. Risos.
Antes
que entre na pauta do dia, como vai o Escoteirinho de Brejo Seco? Soube que
cresceu, agora está fazendo o SENAI em Barra do Onça. Vai a cavalo todo dia. Menino
marreta não Zé? Lembra-se de quando comprou sozinho toda sua tralha do
uniforme? Nunca reclamou, trabalhou sem parar engraxando, seu uniforme dona
Nazinha caprichou. Olhe Zé, o escoteirinho é danado, comprou um cantil, comprou
sua faca escoteira, comprou seu facão e sua machadinha. Quando ia acampar ia
orgulhoso sabendo que se vai para o mar avie-te em terra. Soube que ele tentou
o Lis de Ouro e não conseguiu. Pois é Zé, se não tem registro, se não tem
computador para “fuçar” no tal SIGUE nunca iria conseguir. Coitado do
Escoteirinho Zé. Lembra-se de seus sonhos em ir naquele acampamento nacional? Quando
viu a taxa, taxiou em suas pernas e chorou. Nunca poderia pagar. Afinal Zé ele
aprendeu que era melhor fazer seu escotismo aventureiro aí em Brejo Seco do que
se elevar pelos ares nas riquezas que hoje são exigidas aqui para ser Escoteiro.
Olhe
falei Para ser Escoteiro e me lembrei do Chefe Floriano. Cara batuta não Zé?
Lembra quando fomos fazer cursos na capital? Ele pagou tudo, pagou a passagem
de trem e olhe, foram dois cursos supimpas. Foi lá que saboreei pela primeira
vez o tal de Bacon. Dizia que se pronunciava Baicon. Dei risadas, mas comi demais.
A noite deu até “piriri”. Ganhei dele o Para ser Escoteiro e ano depois ele
escreveu também o Noviço, o Segunda Classe e o Primeira Classe. – Época boa eim
Zé? Lembro que você foi primeira classe e no curso deu um show de pioneirías.
Mas Zé, hoje tirei o dia para pensar se estamos no caminho certo. São tantos
Salvadores do Escotismo que fico assustado. Alguém resolveu fazer um novo
uniforme que só a mamãe UEB vende. Mamãe? Risos. Melhor chamar de madrasta, mas
lembra de Dona Chiquinha? A madrasta do Toninho? Mulher nota dez! Pois é Zé,
aqui se cobra para tudo. Tem taxa prá dedéu. Escotismo de pobres já era hoje só
prá ricos. Olhe se tem 300 piulas compra se não tem esqueça.
E Zé,
nem sabe o que passo quando escrevo minhas convicções do nosso escotismo. Chamam-me
de ultrapassado e arrematam que se o escotismo nosso foi bom e de hoje também
é. Eu acredito sabe Zé tem muitos chefes gente boa que faz escotismo de ótima
qualidade, mas Zé precisa ver as ambições de cargo de funções cada um querendo
saber mais que o outro. Aquele nosso orgulho de se apresentar a comunidade para
que eles confirmassem nosso garbo, nossa elegância e nosso sorriso retribuído pelos
elogios aqui não mais existe. Outro dia elogiei dois chefes de caqui, calça
curta, bem uniformizados. Esqueci que ao lado deles tinha outros com a
vestimenta. Zé choveu reclamações. Mas o que posso fazer Zé? Como posso
aplaudir uniformes mal postados, chefes que não se esmeram em mostrar seu
orgulho na apresentação? Sei que eles são modernos, acataram a nova vestimenta
e a usam com seu orgulho pessoal.
Bem Zé,
não posso me alongar muito. Há tantas coisas a recordar, tantas coisas que queria
comentar com você, que nem sei por onde terminar. O tempo hoje Zé não é mais o
nosso. Agora só se fala em modernismo. Pois é Zé, sabe o que é moderno para
mim? Aqueles acampamentos aventureiros, aquelas jornadas incríveis que fizemos
no Vale do Sol, aquelas travessias em jangadas no Rio Jaguari. Lembra Zé quando
fomos ao ADIP? (Acampamento Distrital de Patrulhas). Levamos quatro patrulhas,
chegamos cantando e dizendo que aqui estava o Guará, a Lobo, a Touro e a
Morcego. Foi uma festa. Tudo feito por patrulha. Hoje Zé? Hoje é acampamento de
férias de ricos. Não precisa mais apresentar com patrulha, alguns tem a “quentinha”
outros restaurantes sofisticados. Mas Zé eu sei que você aí faz aquele Velho e
saudoso escotismo que um dia eu fiz.
E
terminando Zé, eu aqui vou indo, vou me divertindo, escrevendo minhas
histórias, falando mal de tudo que acho errado e ouvindo o que não quero ouvir.
Que importa se sou ultrapassado? Que importa que o estudado e o sem estudo
também são escoteiros? Que importa o dinheiro Zé se sem ele Baden-Powell
construiu uma fraternidade mundial? Zé meu amigo, aqui ninguém pergunta, ninguém
consulta, ninguém pesquisa. Os donos do poder agem e fazem o que querem. Impõe
seus pensamentos suas idéias e o mundo vai girando, a terra não vai parar, mas
o escotismo? Zé sempre pergunto, onde estão os resultados? Os resultados meu Deus!
Só eles importam. Mas existem Zé? Existem sim, ainda bem que gente como eu e você
ainda faz escotismo de verdade.
Chega
Zé, vou terminando, não sei o Mané do Brejo, se o Tomé Esqueleto, se o Joaquim
Espoleta e o Mario cozinheiro ainda estão aí. Saudades deles. Quem sabe antes
do fim eu possa vê-los, dar aquele abraço cantar o Velho Rataplã e melhor, acender
um fogo e contar “causos” daqueles cabeludos quando você se apaixonou pela
Mariquinha da Fazenda do Nestor. Olhe diga ao Escoteirinho de Brejo Seco que
seus acampamentos são os melhores do mundo, diga a ele que quando crescer mais
quem sabe junte seu rico dinheirinho e vai conhecer sem se decepcionar de uma
acampamento nacional. Pelo menos Zé ele vai ver os Grandes Chefes atuais, com
suas poses e sorrisos, seu saber e sua sapiência. Ele infelizmente vai pagar
para ser Staff, pois do jeito do passado não dá mais. Não esqueço aquele sub
campo de chefia na Beira do Rio Jaguari com todos pulando no rio e alguém gritando:
- Não sei nadar! Não sei nadar!
Abraços
a Sebastiana sua esposa, Josefa sua filha e claro ao meu orgulho pessoal o
Escoteirinho de Brejo Seco. Sempre Alerta!