Conversa ao pé do fogo.
Eu amo minha calça curta!
Nada contra de quem gosta da comprida
caqui, amarela, cinza, azul, branca, roxa, verde e agora marrom verde e azul.
Nada contra. E olhe nada contra para quem gosta da vestimenta, desde que se
apresente com garbo e boa ordem. Afinal somos uma associação e ela nos cobra a
apresentação o que se torna um dos maiores marketings escoteiros que podemos
apresentar. E melhor, é gratuito. Mas sem desmerecer ninguém eu adoro mesmo a minha
bermuda curta caqui. Quando visto meu uniforme cáqui me sinto bem. Meu coração
bate, meu corpo treme e não sei por que. Sinto-me mais Escoteiro. Afinal a
vesti pela primeira vez em 1950 quando passei de lobo para a Tropa escoteira.
Antigamente, existia uma norma no POR que dizia – Em atividades juntos aos
jovens, o Chefe deve portar o mesmo uniforme deles. Sempre levei a sério esta
norma e não abro mão. Muitos rebatem que não somos uma organização militar e
nem somos aprendizes da ordem militar como alguns dizem por aí. HOJE todos tem
a liberdade de escolher o que quiser. Mas desculpe não me sinto bem com esta
camisa fora da calça ou má postura na apresentação do seu uniforme ou
vestimenta.
Desde pequeno que fui exigente com
minha postura e apresentação. Lembro que meu Chefe dizia que ou somos ou não
somos exemplos e para isto exigia um uniforme bem passado, bem posto não
importando se Velho ou novo. Ele dizia que nosso uniforme era uma tradição e tínhamos
que orgulhar em vesti-lo. Nunca pensei que alguém pudesse dizer que tinha
vergonha dele, que não seria Escoteiro porque não era do seu agrado. Estes eu
sei que não importa o que vestirem, pois nunca serão mesmos escoteiros. Hoje vejo muitos chefes usando calça
comprida. Quem sabe é um hábito de comportamento, mas me sinto bem com minha
curta. Amo ela demais. Já ouvi alguns dizerem que o caqui é militarista. Meu Deus!
Então eu sou militar, pois adoro marchar!
Não sei se a vestimenta
vai virar uma tradição ou um hábito de comportamento. Eu respeito. Mesmo me
sentindo deslocado neste tempo eu não critico. Já vi alguns dizendo cobras e
lagartos das tradições. Um tema espinhoso para um tradicionalista como eu. Em
1976 fui convidado a participar de um Curso Avançado para membros da Equipe de
Adestramento Nacional. Senti-me deslocado. Todos com o traje e eu não. O
dirigente do curso me perguntou por que não estava com ele. Dizer o que? Quando
voltei a minha cidade mandei fazer o traje. O usei muito, mas só em ocasiões
especiais. Afinal estar com meus amigos chefes, ou mesmo quando menino com
minha patrulha só o caqui. O andar ereto à frente, sorrindo e vendo todos nas
ruas, portas, janelas admirando os esbeltos escoteiros de calça curta (risos eu
não era assim tão esbelto) a desfilarem, era bom demais. As meninas nos vendo
apaixonadas. De onde São? Olhe aquele ali, lindo! Era eu! Risos.
Era costume ir a pé para a sede. Seis
quarteirões. Eu fazia questão de estar com meu caqui e orgulhoso no andar. Eu
tinha de provar a mim mesmo que era Escoteiro de corpo e alma e enfrentaria
multidões pelo meu amor ao escotismo. Hoje isto não existe mais. Nas capitais
tudo é longe. Ou se tem carro ou se vai de ônibus. Eu fui muitas vezes de
bermudas curtas sim senhor! Nunca iria me esconder levando meu uniforme na
mochila para vestir na sede. Isto é abominável. Que propaganda faremos junto ao
público? Que exemplo daremos aos nossos escoteiros e lobos? Nos velhos tempos
era maravilhoso ver dirigentes de bermuda curta e Chapelão. Fiquei admirado
quando vi o disco do Trio Irakitan com eles de bermuda curta. Marketing nota
10!
E hoje? Temos algum cantor
famoso que gravou músicas Escoteiras usando um uniforme ou vestimenta ou traje?
Sei não. Agora a moda dos dirigentes é a vestimenta. Fazem questão. Meia dúzia
decidiram e impuseram para o grupo Escoteiro decidir com a escoteirada. Pena
que ainda tem aqueles que diferem uns dos outros. Na mesma sessão você vê calça
curta, comprida, camisa para fora ou para dentro. Igualdade de apresentação
quase não se vê. Sinto falta do meião na vestimenta. Lembro-me da exigência dos
frisos retos e bem colocados. Agora tem o azul e o verde. Assim como o uso do
lenço a moda prêt-à-porter é fato na moçada escoteira. Viu, gostou usou. Alguns
dizem que o POR autoriza. Nem sei quem foi o maestro que decidiu o uso da
maneira atual. Fico pasmado ao ver fotos de cursos, membros da equipe e todo
tipo de apresentação. Nossa! Este é o exemplo atual? Meu filho com seus 49 anos,
Escoteiro no passado me disse: Pai! Estou pasmado. Fui numa festa na escola do
meu filho, chefes só com o lenço e meninos só de camisetas. É assim agora? Saudades
do meu Chefe: - Mal uniformizado vai para casa. Ou você está uniformizado ou
não esta!
Já no fim da vida sei que vai ser difícil eu
usar a vestimenta. Se este for à escolha de amigos que seja. Só peço que meditem
bem na apresentação no garbo e na boa ordem. Tem um público que nos vê, que nos
julga que irá comentar se temos disciplina e se somos verdadeiramente um
movimento de educação. Disseram-me uma vez que o escotismo tinha dois caminhos.
O antes da vestimenta e o depois. Haveria filas enormes de jovens nas portas dos
Grupos Escoteiros para se matricular. Arrumaram uma desculpa dizendo que os
jovens detestavam o caqui. Eu nunca soube disto. Nunca vi nenhum jovem que
procurou para ser Escoteiro dizer isto. Não vou discutir custos, caro ou
barato. Se o Chefe é exemplo ele não deve se uniformizar diferente de sua
sessão. Lembremos que uns podem comprar outros não.
“Mormente” eu uso a minha bermuda curta dos velhos tempos e digo a ela com um
sorriso de Velho bobão: - Adoro você! Sei que gosto não se discute. Afinal a vestimenta
representa hoje uma nova era para o escotismo brasileiro. Coitado do traje sumiram
com ele de vez. Não sei se estarei vivo para ver o garbo daqui a vinte anos no
uso da vestimenta. – Gosto de dizer que de calça curta eu tive a honra de estar no Palácio da Liberdade
conversando com o Governador Magalhães Pinto de Minas Gerais por quase duas
horas. O cara entendia “pacas” de escotismo. Cumprimentei o Presidente
Juscelino que me convidou a subir no seu palanque em minha cidade com ela. Em
Juiz de Fora fui apresentado ao presidente do distrito, que era também prefeito
e futuro Presidente do Brasil. Doutor Itamar Franco. Um cara legal, simples,
valeu! Conversamos por mais de meia hora. Tive a honra de estar com diversas
autoridades portando minha calça curta.
Mas o que não esqueço nunca e jamais esquecerei foi quando sênior
cheguei a Malacacheta, uma cidade perdida nas Minas Gerais, o povo rodeando
quando paramos as bicicletas na praça e alguém gritou; - Olhem! São Escoteiros
do Brasil! Já ouvi falar deles! E na Gaiola descendo o Rio São Francisco quando
chegamos a Juazeiro? Alguém lá nas margens nos viu e gritou: São Escoteiros!
Corram todos, pois a Gaiola vai partir! Pai e mãe venham ver! Bão demais! São
coisas que a gente nunca mais esquece. Que Deus permita que os vestimenteiros
possam um dia lembrar-se das suas aventuras como eu me lembro das minhas. Então
o mundo será pequeno demais para eles!