Contos
escoteiros.
Ele sorriu e
me disse que era um Escoteiro.
Eu o vi uniformizado em
plena Avenida Rio Branco. Estava perfeito. Lenço bem dobrado, meião com listas
retas, sapato brilhando. Parei. Hoje em dia é difícil ver alguém assim. Quando
passou por mim fiquei em posição de sentido olhei para ele dizendo: - Sempre
Alerta Chefe! Ele me olhou sorrindo e disse: - Somos do mesmo sangue tu e eu! –
E continuou: - Nós somos de uma estirpe que só o escotismo faz. Encantei-me com
sua voz. Seu estilo era inconfundível, o chapéu de abas largas retas e aprumado
na sua cabeça mostrava quem ele era. – E ele continuou: - Sei que muitos não
entendem as escolhas que fazemos na vida. Alguns já me perguntaram se eu sou um
herói da juventude. Não sou. Sou um herói de mim mesmo. Não duvide nunca. Eu
posso ser muito melhor sendo Escoteiro do que pode pensar. Sempre digo por que não
correr atrás dos seus sonhos? Quem não vai atrás do que gosta, não tem direito
de reclamar. Orgulho tem limite, e o meu não tem. Não abro mão do que amo ou na
escolha que fiz. É uma questão de princípios, e alguns dizem que é uma questão
filosófica.
Fiquei ali paralisado com sua
maneira educada em falar: - Não sou filósofo e nem gosto de filosofar. Comecei
sem saber onde pisava. Pivete entrei neste movimento sem similar. Foi amor à
primeira vista. Amor de menino sardento, marrento, ainda aprendendo a ler. Fui
crescendo. Vivia cada dia como se fosse um novo dia. Vi coisas extraordinárias.
Descobri minha paixão por aventuras, descobertas, andanças por trilhas
desconhecidas, estradas floridas, florestas encantadas encravadas no meu coração
para sempre. Descobri o valor das fogueiras nas noites escuras, do frio nas
invernadas chuvosas. Elas me aqueciam e queimavam minha sede de continuar sem
poder parar. Aprendi a dormir sob as estrelas e sonhar como se vivessem em mim.
Voei morro abaixo a procura de vales para acampar. Andei de canoa e jangadas em
rios e lagos e profundos. Tive índios amigos, sertanejos que me ensinaram muito
do que hoje sou.
Estava espantado. Eu era
assim também, mas deixei-o continuar: - Esculpi em minha memoria um sol que não
conhecia diferente ao nascer ou sumir no horizonte. Fiz do meu escotismo uma
maneira de fazer amigos e com eles buscar minha felicidade. Não ouve montanhas
com quem não conversei. Não ouve pássaros com que aprendi a cantar. Fui amigo de
uma Coruja que me disse: - Chefe, o espírito da coruja mora neste acampamento!
Dizem que sábio é o ser humano que reconhece
até onde pode ir e que tem mais a aprender, do que a ensinar. E como eu aprendi
nas minhas aventuras Escoteiras. Não fui herói, mas aprendi com a floresta, com
os ventos, com as trilhas ligeiras de pedras no caminho sem normas para seguir.
Aprendi com o ribombar do trovão, da cascata e com a chuva incessante na
primavera. Aprendi com as estrelas, com o arco íris que nunca me mostrou seu
pote de ouro. Rodei céus e terras para descobrir se pisava em terras virgens,
conversei com magos, santos e homens da lei querendo aprender e saber se o
mundo escoteiro era este que eu fazia.
- O tempo foi passando. Eu tinha que seguir em
frente, mas aquele Chefe Escoteiro me encantou. Não arredei pé, queria ouvir
mais e mais – E ele não se fez de rogado. - Sei que muitas vezes procuramos a
verdadeira felicidade fora de nós sem saber que possuímos a sua fonte no
coração. Em nenhum momento duvidei do meu amor Escoteiro. Meu uniforme era
minha estrela, me mostrando que ser belo não precisa somente de um nome.
Precisa apenas ter ética e respeito. Encontrei adversidades por onde passei.
Nos seres humanos foi mais real. Sei que problemas grandes ou pequenos nos
apresentam durante a nossa existência. Posso estar contente, posso ser
inteligente e embora estejamos em algum momento tristonho, é difícil ver que a
vida corre célere para a solução e esta sempre depende de nos mesmos.
- E ele continuou: - Inesperadamente
somos confrontados com problemas, lutas, desafios e milhões de dificuldades. È
como se o escotismo nos tivesse posto a provas para ver de qual fibra fomos
feitos. Atravessamos tudo isto como o vento atravessa as arvores nas florestas e
altos picos encontrados no caminho. Cada escoteiro sabe como pular a maré alta
do mar. O escotismo nos diz que aceitar é uma estratégia até ter as armas de
volta para partir e nos reestruturarmos seguindo em frente para vencer.
– Desculpe se não me fiz entender, disse. Não
existem segredos para o verdadeiro Escoteiro. Eu nunca abri mão do meu amor ao
escotismo esteja onde estiver. Seja no passado e no presente, ou mesmo no
futuro incerto e não sabido. Eu não abro mão do meu orgulho em me chamar
Escoteiro. Sou mesmo com muita honra! Não abro mão do meu uniforme. Não abro
mão da minha lei. A promessa que um dia fiz eu prometi ao Senhor meu Deus para
sempre. Foi ele quem me indicou o caminho a seguir. Não abro mão das minhas crenças, não abro mão
dos meus sonhos e não abro mão do que acredito. Fiz do escotismo uma maneira de
viver. Se pudesse eu diria ao mundo inteiro:
- Sempre amei e sempre vou amar este movimento que mora e residirá em meu
coração para sempre. Eu acredito que se temos uma lei, um artigo que diz que
somos irmãos e amigos de todos não pode haver fronteira que nos impeça de ser
feliz.
Ele me olhou
sorrindo. Saiu devagar depois de apertar minha mão esquerda. Ficou em posição
de sentido e disse um Sempre Alerta firme, daqueles que a gente gosta de ouvir.
Virou a esquina e eu estupefato esqueci aonde ia e o que iria fazer. Pensei
comigo que a suprema felicidade da vida é a convicção de ser amado por aquilo
que você é não tem nada igual. Nada mais a dizer...