Crônicas de
um Velho Escoteiro.
Memórias de
um “Caderno”.
Um Insígnia
de Madeira.
Qual Chefe não tem este
sonho? Todos têm. Alguns lutam outros desistem no meio do caminho. Afinal o
sonho de ser Insígnia de Madeira existe para todos os chefes de sessões. Uma
honra de poucos comentam. Dizem que Insígnia no passado era mais difícil que
hoje. Alguns dizem que sim outros não. Ouve uma época que ela era dividida em
três partes e por ramo. Parte I Caderno, Parte II Campo e Parte III observação.
De todos o caderno dava medo. Um receio enorme do Leitor. A parte II no campo
era gostoso, oito ou dez dias acampados. Depois caiu para seis e hoje nem se
quanto é. A Parte III Observação não era fácil. Hoje tem muitos AP, naquela
época não.
A maioria dos chefes sempre começavam
pela parte II Campo. Era preciso vivenciar o Sistema de Patrulhas. Entender o
método Badeniano. A Patrulha sempre foi o espirito do verdadeiro escotismo. Viver
e construir um campo de Patrulha, rodízio de funções. As obrigações na patrulha
eram cobradas. Não importa se cozinheiro, se intendente ou mesmo um simples aguadeiro.
O meu foi de dez dias. No final do curso saímos convictos do valor do método de
Baden-Powell. Não Havia restaurante, Self Service ou quentinhas. Cada patrulha
recebia suas rações e cozinhava. Todos se revezavam como monitores,
cozinheiros, intendentes, almoxarifes, aguadeiro, enfermeiro ou construtor de
pioneiras.
Horário corrido. Tempo livre
só para refeições. Havia sessões de meia hora e outras de até três horas. Um
dia reservado para grandes pioneiras. Os temas mais comentados para o ramo
escoteiro eram Sistema de Patrulhas, Corte de Honra, Jogos, Programando o
Programa, Técnicas de Pioneiria, Garbo e boa Ordem, Padrões de Acampamentos,
Normas e Regulamentos, Atividades Aventureiras, Métodos e Programas, Tradições
e Cerimônias, conhecendo o Adolescente, Jogos, Deveres para com Deus (Lei e
Promessa) e outros. Parece-me que tudo mudou. Com o ECA (Estatutos da Criança e
do Adolescente) os dirigentes de formação resolveram mudar com receio de alguém
ir contra o que ele diz. Outras mudanças também aconteceram. Cursos de salão,
pedagógicos e ensino moderno. Não sei se foi para melhor, mas torço por bons
resultados.
Antes de partir para a Parte II
Campo, todos faziam um CAB, Curso de adestramento Básico de ramo. Fiz o meu com
cinco dias. Pouco tempo depois passaram para três dias e hoje fazem em um
sábado e domingo. Sei não. Já deram ideia de cursos pela internet, por
correspondência e até em fins de semana. Breve teremos cursos por smart fone
usando Whatsap. Serão milhares recebendo ao mesmo tempo. No passado havia mais
tempo para os chefes. Todos se programavam para nas férias fazer. Hoje não.
Cada um sabe onde a “bota aperta”.
Muitos faziam a Parte II e depois
desistiam. O “Caderno” era o terror dos chefes. Um questionário com dezenas de
perguntas para serem respondidas. Dizem que em alguns estados ainda fazem
assim. Outros não. Eu fui um leitor de caderno. Acho que diferente de muitos
daquela época. Recomendava e não mandava refazer. Eu fiz o caderno de Escoteiro
e lobo. O primeiro ficou quase um ano zanzando para lá e para cá. Todos sabiam
que com o Leitor não tinha “papo dois” ou era ou não era. – Você só recebia o
lenço se lutasse por ele. Sem essa de amizade, proteção ou bajulação. A gente
nem sabia quem era o leitor. Quando mandei meu primeiro caderno foi em abril de
1963. Registrado via correio. Seis meses e nada. Um belo dia ele veio de volta.
Refaça as alíneas II e VIII dizia. Olhei, era sobre o Sistema de Patrulha e
Corte de Honra.
Passava minhas folgas
devorando os livros de BP do Velho Lobo e do Floriano. Refeito enviava de
volta. Quatro meses e de novo pedindo para refazer o que escrevi sobre a Lei e
Promessa e sobre Normas e Regulamentos. Refiz e mandei de volta. Quatro meses e
ele retornou com o Certificado de Aprovação. Viva! Agora era hora da Parte III
Observação. Quem? Enviei uma carta para a Direção Nacional. Não havia e-mails
ou telefone. Tudo escrito à mão. O Chefe Darcy Malta me mandou um ofício
dizendo que seria meu observador. Caramba! O futuro Escoteiro Chefe?
Início de 1965, um Ajuri
Distrital em Belo Horizonte. Escoteiros e seniores de vários estados presentes.
Eu era o Chefe de um Sub. Campo Senior. A noite um fogo do Conselho só do sub.
campo. Foi ali no calor de mais de 110 seniores que recebi minha Insígnia. A
mesma que uso até hoje e o colar. Dois tacos. Ri a valer. Uma alegria sem fim.
Nunca esqueci tudo que fiz para ser um IM. Foi-me lembrado que eu agora seria
um exemplo. Teria que me portar como um membro do Primeiro Grupo de Gilwell. Eu
seria capaz? Lutei para ser exemplo e tento até hoje ser um.
Porque escrevo isto?
Afinal não é passado? Amanhã ou em alguns anos os de hoje também não terão suas
histórias para contar de sua Insígnia de Madeira? Espero que sim. Tenho
observado como são feitos os cursos de Insígnia hoje. Devem ser supimpas. Mas
meus amigos não sei se o Sistema de Patrulha está sendo lembrando como BP deixou
para nós. Se o tal do ECA é importante não sou contra. Mas deixar de lado o que
é mais significativo para desenvolver o método Badeniano fico em dúvidas.
Sei que existem ainda
boas tropas fazendo um belo escotismo. Muitas delas sem Insígnias na direção.
Mas aconselho a todos lutarem para terem as suas. Baden-Powell sempre disse que
só os resultados interessam. Resultados de jovens alegres, firmes no seu ideal
que ficavam cinco, dez ou mais anos na sua trilha desde lobo até pioneiro. Resultados
de jovens com o verdadeiro “Espírito Escoteiro” um sonho de todos nos.
Um dia fui lobo, fui Escoteiro, fui sênior,
fui pioneiro, fui Chefe fui Distrital, Fui Comissário Regional fui membro da
Equipe de Adestramento Nacional. Dirigi centenas de cursos e devolvi meus
quatro tacos quando parei de atuar. Não gosto de usar o que não represento mais.
Até hoje procuro aprender tudo sobre escotismo. Aprendi tanto com alunos que
isto ainda me faz falta. Aqueles chefes que foram meus amigos receberam tudo
que podia dar do escotismo que vivenciei. Todos nós sempre precisamos de uma
palavra amiga.
Escrevemos muito sobre a palavra impossível. Eu
sou fã dela. Lembro-me daquele general inglês que era mestre em dizer que o
possivel fazemos agora, e o impossível daqui a pouco. Oito dias é pouco quando
se sai em férias. Afinal é uma vez só na vida! Quem quer faz, quem não quer
manda. Hoje ninguém tem mais tempo. Insígnia de Madeira. Desejo de muitos,
conquista de poucos. E o caderno? Puxa! O Meu foi demais! Quantas saudades...
Nota de rodapé: - Os cursos avançados da Insígnia de
Madeira deixam saudades para quem os fez. Receber o lenço, o colar é uma honra
para quem se preparou tanto. Tudo mudou de ontem para hoje. O caderno deixou de
existir em muitos estados. Ninguém tem mais tempo. A pressa dizem é inimiga da
perfeição. Ficar oito ou dez dias fazendo um curso? Cinco a oito meses
escrevendo e reescrevendo um questionário de um caderno? È... O tempo não para.
Só as saudades é que fazem as coisas pararem no tempo...