quarta-feira, 23 de março de 2016

Benjamin de Almeida Sodré – O Velho Lobo.


Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
Benjamin de Almeida Sodré – O Velho Lobo.

                 Em meados de 1952 eu já tinha passado para os escoteiros. Havido em aprender tudo sobre escotismo me deliciava com minha patrulha e atividades aventureiras. O Chefe já tinha contado muitas histórias de Baden-Powell e eu tinha por ele uma enorme admiração. Um dia depois de uma Corte de Honra fui guardar a bandeira nacional em uma estante vi lá no fundo da gaveta um livro Escoteiro. Era o primeiro que via em minha vida escoteira. O peguei como se tivesse encontrado um tesouro. Seu titulo era: - Guia do Escoteiro – Velho Lobo – Rio de Janeiro – Em cima escrito: - Pelo futuro do Brasil. Fiquei impressionado. Folheei algumas páginas. Incrível o que havia ali. O Chefe deixou que o levasse, mas para tomar cuidado e devolver. Fui para casa e lá fiquei toda à tarde, à noite e até o amanhecer lendo o livro, um livro que me marcou por toda a minha vida escoteira.

                    Hoje sei que nossa biblioteca escoteira tem joias para deglutir com gosto de aprender escotismo. Mas naquela época em uma cidade escondida ao norte de Minas Gerais era impossível ver os famosos livros do fundador. Foi nele que aprendi muito do escotismo que sei. Seu autor ficou para sempre gravado em minha memória. - Benjamim de Almeida Sodré um escoteiro e um futebolista brasileiro que ficou conhecido como Mimi Sodré. Campeão em 1910 e 1912, pelo Botafogo. Mas isto para nós escoteiros não tem muito interesse. Filho de Lauro de Almeida Sodré se tornaria um personagem muito importante na História do Escotismo Brasileiro. Interessante que foi o primeiro a ser chamado de “O Velho Lobo” e que teve muito de sua vida passagens e características semelhantes à de Baden-Powell.

                       Ainda criança mudou-se para o Rio de Janeiro e depois de terminar seus estudos secundários prestou concurso para admissão na Escola Naval sendo aprovado em primeiro lugar. Fez brilhante carreira na Marinha Brasileira, sobrevivendo ao naufrágio do rebocador Guarani, em 1913 e posteriormente chefiando a Comissão Naval Brasileira durante a II Guerra Mundial. Tornou-se Almirante em 1954. Assim como Baden-Powell tinha uma série de talentos. Professor de Astronomia, Navegação e História da Escola naval publicou diversos trabalhos. Desde que entrou para o escotismo brasileiro tornou-se um seguidor dos ideais de B-P participando da fundação dos Escoteiros do Mar e do primeiro Grupo Escoteiro de Belém. Seu livro o “Guia do Escoteiro” de 1925, é uma das mais importantes obras do Escotismo Brasileiro.

                 O “Velho Lobo” teve papel fundamental na idealização e criação da União dos Escoteiros do Brasil ao reunir quatro de algumas das confederações existentes. Escoteiros Católicos, do Mar, Escoteiros do Brasil e Federação Fluminense de escoteiros. Foi honrado com uma série de títulos, entre eles o de Cidadão Honorário do Rio de Janeiro. Recebeu várias medalhas de mérito, presidindo a Ordem do Tapir de Prata a mais alta condecoração do escotismo brasileiro. Faleceu em 1º de fevereiro de 1982, dois meses antes de completar 90 anos. Atualmente diversos grupos em todo o Brasil honram seu nome de Almirante Benjamim Sodré. Uma homenagem de poucos escoteiros do Brasil. Vale notar que no passado a revista “(O Tico-Tico) uma das principais publicações infantis do país, abrigou em 1922 uma coluna ESCOTISMO na qual o pseudônimo de “VELHO LOBO” dava sua importante contribuição para a formação da juventude brasileira”. Após escrever o “Guia do Escoteiro” em sua época foi reconhecido por muitas personalidades entre as quais Coelho Neto, Rui Barbosa e Olavo Bilac.

          Reconhecido como um "IMPOLUTO MAÇOM", dadas suas qualidades de caráter foi eleito membro honorário e escolhido Deputado da Assembleia Legislativa do Grande Oriente do Brasil, chegando a exercer o cargo de Grão-Mestre. Ocupou várias posições importantes na hierarquia naval, tendo-se destacado em combate e durante um naufrágio onde salvou bravamente dois colegas oficiais e um marinheiro lutando contra condições adversas no mar. Ocupou várias posições importantes na hierarquia naval, tendo-se destacado em combate. Quando o Brasil estava em guerra contra os países do eixo, (Alemanha-Itália) foi encarregado de comandar o petroleiro Marajó, único da frota brasileira a transportar de Trinidad, nas Antilhas, o combustível necessário à nossa Esquadra. Apesar de ser presa cobiçada pelos submarinos inimigos, o Marajó foi levado a bom termo, cumprindo o nosso Benjamin Sodré a perigosa missão. Isto foi em 1940/41. Com a vida ligada aos Escoteiros, à Marinha e à Natureza, e dotado de fina sensibilidade e misticismo, Benjamin Sodré deixou-nos um texto, inspirado por ocasião da celebração de uma missa rezada em 28 de setembro de 1948 na igrejinha da Boa Viagem (Niterói), pelo Bispo D. João da Mata:

Eis o texto:
"Há 12 anos eu sou o sineiro da Boa Viagem. Sineiro convicto, emocionado. Entretanto, todos sabem que não sou religioso. Se o Bispo fizesse alusão a isso, como eu responderia? Diria que faço tudo por Zi (apelido carinhoso da esposa), que tanto tem se dedicado à sua linda capelinha. É a ela que eu sirvo, trabalhando pela igreja. Mas, também, é verdade que venero as imagens no que elas simbolizam: a Virgem Maria representa a Bondade e o Amor Infinitos das Mães; minha mãe, minha esposa, minhas filhas. São Jorge, o padroeiro dos escoteiros, é o cavaleiro indômito, exemplo de fortes virtudes; São José, Santa Joana D'Arc... Jesus sintetiza a moral cristã, que eu sigo como moral, como seguiria as normas de Confúcio, Buda e todos os grandes filósofos moralistas pregadores. Os padres, sempre os olhei com simpatia e admiração; são homens que se sacrificaram por um ideal de fé, privando-se do que a vida tem de mais belo, por amor ao próximo. Por todos esses motivos, sou há 12 anos, com convicção, o sineiro da Boa Viagem. E não creio que alguém assista à Missa com maior emotividade do que a minha. Oh! O que aquela capelinha representa na minha vida!... Aquela igrejinha é muito nossa e, por ela, por amor a Zi, tudo farei."

Escritor e poeta, Benjamin Sodré legou-nos algumas páginas inspiradas, de puro lirismo... Este é um trecho do texto que chamaríamos de "Contemplando a manhã":
"Sem nos apercebermos, enquanto o espírito está suspenso na contemplação maravilhosa, quase as sombras foram afugentadas... Uma franja avermelhada coroa, agora, todo o Oriente. A mata despertou toda... Os trinados multiplicam-se, são incontáveis... O mar está azul. Nas ilhas, a vegetação vai tomando o colorido habitual... Surgem os primeiros rumores da vida humana... O sino da ilha bate sonoro, cadenciando o sino da alvorada... Mais alguns segundos, o sol irrompe prodigioso, pondo por todo o mar, em todas as árvores, uma faixa forte e viva de luz dourada... Vida!... Vida!... Tudo estreia em intensa vida, com o ressurgimento do Grande Final Criador!...”.

Almirante Benjamim Sodré – (10 de abril de 1892 — 1 de fevereiro de 1982)