terça-feira, 15 de março de 2016

Salvem minha bandeira que está no céu.


Conversa ao pé do fogo.
Salvem minha bandeira que está no céu.

                  Não era uma tarde de sol, o tempo estava nublado. O acampamento sorria com a escoteirada fazendo seus bordados com cinzais nas dobras de uma costura de arremate. Um pequeno punhado deles carregavam um tronco, uma birosca de barro, bambus aos chumaços cada um querendo fazer mais e mais para aprender. Não ouve trovão, não ouve faíscas e nem relampejar no ar. Em segundos o céu escureceu com uma nuvem cor de cobre. Muitos disseram para si e para os outros: – “É temporal que se descobre”. É hora de aprisionar no seio da barraca a matutagem do campo, fincar no alto da cabeça o chapéu para proteger. Todos deviam se abrigar, pois o molhado na mata não perdoava ninguém. Até a passarinhada que se aninhavam a cantar para ver a escoteirada escoteirar se calaram. As burras da borrasca pronunciava uma torrente de águas cristalinas a cair do céu. Cada um sabia o que fazer, pois ao anoitecer tudo seria mais difícil para ver, para imaginar e para consertar os estragos que iam acontecer.

                      Aflito o amofinado cozinheiro protegia seu lenheiro, berço do fogaréu que em breve horas iria cantarolando nos comes a fazer. O mal aventurado abençoava o temporal, mísero chuveiro que Deus lhe reservou. Não haveria na hora do costado o bife pança vazia, guardada proporções ele sabia que a fome da escoteirada ao debandar no bucho e na goela, depois da chuva seria de matar. Melhor uma sopa, daquelas bem brasileiras, daquelas famosas Escoteiras que um sal, óleo e um pouco de mingau aguado daria para sustentar. O céu desabou no acampamento. Não havia firmamento, não havia sol, ninguém cantava o arrebol. Correm os corvos na bandeira, ela desce bem treteira naquele enorme vendaval. Mas o vento, oh! O vento danado soprou enviesado e a bandeira subiu aos céus. A escoteirada se animou e desandou a correr atrás. Pega aqui pega ali é nossa pátria, a ela vamos salvar. Cada um virou herói, herói da bandeira, herói do universo do nosso querido Brasil. Salvem ela, é nossa pátria, por ela vamos lutar ou morrer.

                      Um pé de vento mais forte, a bandeira foi lá pru norte e ninguém ficou para trás. Sobem montes, atravessam lagos, correm bem no costado do morro da Vaca Preta, e a escoteirada gritando: - Pega bandeira! Não deixem ela escapulir. Parecia um jogo infernal. O vento sorrindo o danado, a escoteirada mesmo cansada não desistia. Afinal ali não era a terra do nunca, eles não podiam voar, mas tinham pernas treteiras, pernas bem Escoteiras e a bandeira não ia escapar. Eis que ela subiu e se deitou bem no alto do Jequitibá, numa galhada enorme, pequena até disforme e a escoteira em volta olhando o vento que sumia, deixando no alto da coxia, da arvore que escolheu para ficar. A bandeira molhada encolheu. Zé do Osso, um escoteirinho, amarelo magro que nem angu do brejo, esbelto cabeça chata, se lança no tronco da dita cuja. Seus braços pequenos não dava a volta que precisava para firmar e subir. Mas quem desiste depois da promessa? Promessa que um dia prometeu amar a Deus e a Pátria, portanto a bandeira ele fazia questão de salvar.

                       O vento escondido nos montes olhava de esbugalho o escurecer do horizonte, sorria ao ver Zé do Osso, subir no Jequitibá. Deixa ele, ele pensou. Quando estiver para chegar, vou lá de novo pé de vento a levo para longe do acampamento. Não deu outra, os bracinhos bem curtinhos de Zé do Osso arranhou. Um galho pegou no menino, o sangue correu pelo corpo, mas quer saber? Zé do Osso não desistiu. Seu chapéu de abas largas foi levado pelo vento, amarrou no tronco seu lenço e sem mostrar canseira ele abraçou a bandeira. Embaixo se ouviu um urro da escoteirada. A bandeira estava salva. Honras a Zé do Osso o nosso Escoteiro herói. Salvou a Pátria, salvou a honra, palmas e bravos pipocaram no ar. E depois da aventura, foi carregada nos altos, a escoteirada sorrindo todos se divertindo e a chefaiada aplaudindo.


                        À noite no céu de estrelas, a lua brotou no céu, espantou o vendaval o vento e seu carnaval. A fogueira foi acesa, sussurros de boca em boca, saudando um Escoteiro valente que não deixou de barato, afinal se tornou um mateiro dos maiores aventureiros cabra macho dos bons. Salvou nossa alma nossa honra... Nossa Bandeira.  Alegria e contentamento valeu acampamento. Zé do Osso ficou famoso, teve glorias de valente, foi saudado docemente pela linda escoteira Maria. Hoje de tempos passados, os dois já bem casados, contam histórias sem fim. Maria sabia da saga, da bandeira lá na mata, do espinhaço sofrido, contava a seu filho Walfrido o que seu pai realizou. E assim a história termina lembranças de fatos passados, aqui aos poucos narrados de um vendaval que se foi.