quarta-feira, 26 de julho de 2017

A embriaguez da primavera. Parte I


A EMBRIAGUEZ DA PRIMAVERA – PARTE I.
Nota para os leitores: - Por favor, não esperem algum impressionante e nem excepcional desta publicação. Este é apenas um condensado do conto A embriaguez da primavera. Não sou um emérito conhecedor do Lobismo e li apenas quatros vezes o Livro da Jângal. Tenho Rudyard Kliping como um grande mestre na arte de Contar Histórias. Para os que ainda não possuem suas publicações eu sugiro que as tenha, pois elas nos dá uma tremenda força em nossa atuação junto aos jovens. Aguardem para breve a Parte II.

A embriaguez da primavera.
Parte I

O abutre Chill conduz a noite incerta
E que o morcego Mang ora liberta -
É esta a hora em que adormece o gado,
Pelo aprisco fechado.
É esta a hora do orgulho e da força
Unha ferina, aguda garra.
Ouve-se o grito: Boa caça aquele
Que a Lei d Jângal se agarra”.

Canto noturno da Jângal.
Kipling.

Dois anos depois da morte de Akelá na grande luta com os dholes, Mowgly completou 17 anos. Parecia mais velho porque o intenso exercício, a forte alimentação e os banhos frequentes lhe haviam dado força e desenvolvimento acima da idade. O povo da Jângal, que já o temia pela astúcia, passou a temê-lo pela força.

Um dia estavam Mowgly e Bagheera na encosta do morro frente à Waingunga. Era o fim do inverno. Sentado, Mowgly contemplava o vale semi-desperto. Um pássaro lá embaixo trinava as primeiras notas, ainda incertas, do canto que iria entoar na primavera. Embora esse canto ainda fosse só um ensaio, a pantera reconheceu-o.
-Eu não disse que o tempo das falas novas vem próximo? Relembrou ela. É Ferao, o pica-pau escarlate. Ele não esqueceu. Ora, eu também preciso recordar o meu canto e pôs- se a ronronar para si própria.

– Não há nenhuma caçada para hoje, observou Mowgly. – Irmãozinho, estarão teus dois ouvidos tapados? Isto que canto não é palavra de caça, mas canto que quero ter pronto para a primavera.

– tinha me esquecido. Reconheço muito bem a chegada das falas novas, estação em que tu e os outros correreis para longe, deixando-me sozinho, respondeu Mowgly queixoso. Vós debandais e eu, Senhor da Jângal, tenho que viver sozinho.

Até aquele ano Mowgly se deleitara com o retorno das estações. Era ele quem, antes de todos, descobria o primeiro olho da primavera e as primeiras nuvens da estação. Sua voz era ouvida em todos os lugares, a fazer coro com os outros animais. Como para todos os outros, a primavera era para ele o tempo de correr, só pelo prazer de correr do anoitecer ao amanhecer e voltar ofegante, rindo-se, cheio de flores raras.

O povo da Jângal está constantemente ocupado na primavera; Mowgly via-os sempre rosnando, uivando, gritando, piando , silvando, conforme a espécie de cada um. Suas vozes mostram-se diferentes então; e por isso a primavera no Jângal é chamada o Tempo das falas Novas.

Mas naquela estação o humor de Mowgly estava mudado, quando tentava responder algum animal as palavras embaraçavam-se lhe nos dentes, uma sensação de pura infelicidade o invadiu da cabeça aos pés.

– Comi bem, disse o rapaz a si próprio, bebi bem, minha garganta não arde nem aperta. - Mas tenho o estômago pesado e tratei mal a Bagheera e outros. Ora me sinto quente, ora frio; ora nem quente nem frio, mas apenas furioso contra não sei que. Ah-ah! É tempo de dar minha carreira. Esta noite cruzarei as montanhas; sim darei uma corrida de primavera até os pantanais do norte, ida e volta. De muito que caço sem esforço, isto me enerva.

- Como não encontrou nenhum de seus irmãos lobos para correrem juntos, Mowgly saiu sozinho, aborrecido por isso.

Assim correu ele aquela noite, ás vezes gritando, ás vezes cantando; correu até que o cheiro das flores o visou que estava próximo dos pantanais e longe, muito longe da sua Jângal. Avistou uma estrela bem baixa e olhou pelo canudo da mão.
– Pelo touro que me comprou é a flor vermelha, a flor vermelha que deixei pra trás de mim quando me mudei para a alcateia de Seeonee. Agora, que a vejo de novo, dou por fim a minha corrida.

Mowgly correu descuidadamente pela relva úmida até alcançar a cabana de onde vinha à luz. Uns cães latiram. Ele emitiu um profundo uivo de lobo que fez os cães calarem. A porta da cabana abriu-se e uma mulher espiou no escuro. Dentro, uma criança começou a chorar.

Continua...

Nota:  “A minha força se foi de mim, e não é veneno nenhum”. Assim Mowgly conta para os poucos amigos que atendem seu chamado. “De noite e de dia eu ouço passos me seguindo. Quando viro minha cabeça, é como se alguém houvesse se escondido naquele instante. Vou olhar atrás das árvores e ele não está lá. Grito e ninguém grita de volta; mas é como se alguém tivesse ouvido e guardado a resposta. Deito, mas não descanso. Corro a corrida da primavera, mas nada me aquieta. Tomo banho, mas não fico frio. A flor vermelha [o fogo] está nos meu corpo, meus ossos são água – e – eu não sei o que sei”. – Amanhã a Parte II. Boa caçada.