Conversa ao pé do fogo.
Matar, morrer ou correr!
- Abri os olhos
devagar. Uma luz forte me cegava. Minha cabeça girava a mil. Tentei levantar e
não consegui. Estava amarrado a uma cadeira. Meus pés firmes estavam presos por
um volta de fiel duplo, daqueles que só eu sabia fazer. Minhas mãos estavam presas
atrás por uma amarra paralela perfeita. Quem a fez tinha experiência de campo. Por
quê? Minha cabeça estava a mil. Onde estava? O que queriam comigo? Sou um Velho
Escoteiro babão com dizem, mas de paz, briguei quando criança e apanhei muito. Nunca
fui bom de briga. Não me lembrava de como fui parar ali. Meus olhos foram se
acostumando com a luz e me vi em um quartinho pequeno, na parede uma bandeira
do Brasil. O DOI CODE? O DOPS? Mas a democracia não existia agora? A porta abriu.
Vi um Chefe Escoteiro magro, simpático com a vestimenta escoteira. Adorava ela
com a meinha branca. Sorri, agora sabia que ia ser solto.
- Sabe quem sou
eu? Disse o Chefe. Não meu senhor! – Sou dirigente da UEB, e você é nosso
prisioneiro. Macacos me mordam! E agora? O que eu fiz de tanto errado? – Vamos dar
uma lição a você! Vai aprender a respeitar as associações bem organizadas! –
Mas Chefe! – Ele não me deixou continuar. – Vou acabar com sua raça e destes chefetes
do passado que se julgam dono das ideias de um escotismo perfeito! – Madre minha!
Eu pensei. O que fiz de tão errado? – Você chefinho se acha o bom, se acha o
tal, critica todo mundo, mete o pau na vestimenta, fala mal de nosso amado e querido
SIGUE, cria revolta em muitos chefes e até um que é seu amigo se afastou de você.
Era verdade, fiquei chateado, mas fazer o que? Afinal nasci assim um Chefe chato
de galocha, e não tinha duvidas em sabia que ia morrer. – Ele implacavelmente
continuou: - Só porque fez a jornada, tirou a primeira classe e foi Correia de
Mateiro acha que pode dar lições? – Humildemente respondi: - Não senhor, não
senhor!
- Velho Babão,
você nem imagina o que vai acontecer com você. Aqui não adianta estas medalhas
que nem existem mais, para mim pouco importa se foi regional, se fez três insígnias,
se foi formador e dirigiu centenas de cursos. Aqui para mim você não é nada! –
Vamos lhe dar uma lição, este teu uniforme de tergal caqui vai fazer de você mais
um da patrulha da onça. Ninguem vai lhe salvar. Se você é o tal, se acha que
sabe tudo então venha assumir no nosso lugar! – Sorri, será que iriam me deixar
assumir? – Está sorrindo em Velho Escoteiro idiota, acham mesmo que vamos
deixar? Nesta boquinha ninguém tasca! – Abaixei a cabeça, os nós perfeitos em
meus pés e braços doíam. – Mas Chefe! Eu só quero ajudar? – Ajudar? Você? Com
esta panca de Velho babão sabe tudo? Só porque foi Lobinho, Escoteiro e Sênior acha
que pode dar lições? Afinal suas quase oitocentas noites de acampamento não é
nada comparado às viagens do nosso Diretor Internacional. Sabe quantos países
ele conhece? Sabe quantos idiomas ele fala? Você Velho babão precisa ter mais
respeito. Se mudamos foi para melhor. Se na sua época era outro escotismo então
volte para lá! – Sim senhor! Sim Senhor! – era só o que eu sabia dizer.
- Ele deu
um grito: - Chame o Chefe Coronel Facão. Ele vai dar uma lição neste belho babão
metido a sabe tudo. – Tremi, agora sim estava no papo da UEB. Não havia como
escapar. Ele entrou e achei que fosse o Demônio, mas era um Chefe Escoteiro,
assim diziam. Alto, enorme pançudo, cabeludo, barbudo, dentuço e portava um bastão
de dois metros com ponteira de aço. Seu corpo cheio de distintivos, o cara era
mesmo o tal. – Chegou perto de mim e sorriu: - Deus do céu que horror! O cara
além de feio, nem me disse sempre alerta, foi logo dizendo – Be Prepared! I am an American scout CIA. Secret
agent. Son of President Obama. – Pelas Barbas de Maomé. Desta vez entrei
pelo cano. – Tentei rezar, precisava. Onde foi que amarrei minha égua? Agora estou
frito. Língua maldita que tinha eu pensei. Língua não escrita. Quem mandou ser
metido a saber como resolver a situação do escotismo mundial!
Ele se
mexeu para um lado e outro, vi na mão dele um enorme facão. Afiado, o cara
sabia afiar. Rodopiou o facão no ar. Senti que precisava fazer as pazes com Deus.
Comecei a rezar. Senhor, me mantenha calado dora em diante, faça com que eu não
fale mais mal da nossa querida, simpática, maravilhosa, estupenda UEB. Olhei
para o gringo Boy Scout que sorria com o facão na mão. – Mas não aguentei,
mesmo na hora da morte gritei: - Onde foram parar os quase seis mil escoteiros
que se mandaram da UEB o ano passado? O facão girou no ar. Me vi liberto, abri
a porta e sai correndo nas ruas de Curitiba. Atrás uma chusma de chefes da UEB
com a vestimenta. Muitos com calça comprida, outros calça curta, camisas do
lado de fora, para dentro e até com saia eu vi. Dois meteram a mão nos bolsos
da camisa. Enormes, grandes e tiraram de lá duas metralhadoras israelense. Eu
gritava pela rua afora! Acudam-me!
- Chefe, Chefe! Quer um cafezinho? Abri os
olhos. A clareira era a mesma quando chegamos ali para acampar. O céu estrelado
com uma lua enorme fazendo bonito para quem quisesse ver. Graças a Deus! Eu estava
entre amigos em uma pequena conversa ao pé do fogo. Olhei para o monitor que
tinha me chamado e espantado sorriu sem jeito e perguntou? – Chefe! O que houve
com o senhor lá na UEB?