Conversa ao
pé do fogo.
Esta terrível
EVASÃO escoteira.
Um foguito. Pequeno, achas finas
como se não fossem permanecer muito tempo naquele gostoso anoitecer. Uma brisa
vinda do norte, sons de um Sapo Cururu coaxando a procura da namorada. Uma
chaleira de café, biscoitos e alguém trouxe batatas doces para assar. Conversas
truncadas, conversas interessantes, causos, papos e prosas. Assunto? Escotismo
é claro. Cada um com sua experiência, sua vivencia e seu tempo de escotismo. –
Porque não crescemos? Silêncio no pedaço. Chefe Um toma seu lugar e diz: -
Dizem que a culpa é do Chefe! – Ninguém diz nada. Chefe Dois pergunta: - Quanto
tempo dizem isto e ainda não consertaram? – Todos calados.
Chefe Três com seu ar de professor
continua: - E a nossa direção não diz nada? Chefe Quatro sorri e emenda: -
Dizer o que? – Todos calados. Parece que sabem os motivos, mas não tem
autoridade para consertar. Autoridade? Quem tem? Um olha para o outro. Sem
resposta, a resposta está na ponta da língua dos quatro chefes. Chefe Quatro
toma a palavra: - Porque nossa direção ainda não se preocupou com este entra e
sai? Como dizem mesmo? Evasão, rotatividade ou em inglês turnover? E ele
completa como se todos ainda não soubessem: Turnover é um conceito utilizado na
área de recursos humanos para designar a rotatividade de pessoal em uma
organização, ou seja, as entradas e saídas por um período de tempo.
Chefe Dois coça a cabeça e diz. Seria
este o motivo principal porque estagnamos neste efetivo como se fosse uma
sanfona de cresce e decresce? Chefe Um fala baixinho: - Uma vez li que nosso líder
B.P acreditava que precisávamos de dez anos para dar toda a metodologia
escoteira a um jovem. Alguém já soube se conseguimos pelo menos manter setenta
por cento do nosso efetivo por pelo menos cinco anos? Chefe Um completa: - Cada
ano mais e mais falam e dizem que temos um plano, ou melhor, projetos
educativos e de longa duração para sanar tudo isto. Mas olhem nada acontece... Por
quê?
Chefe Três sorriu. Perguntou aos
demais: - Quem realmente no Grupo Escoteiro se preocupa com a evasão? Qual
sessão o Chefe tentou ver quais os motivos do entra e sai dos seus jovens? Qual
Chefe quando sentiu a perda foi até a casa do jovem conversar e saber o que
ouve? – Todos riram. Chefe Dois indiferente perguntou se o novo programa
educativo era bem aceito pelos jovens. – Não seria este talvez a consequência
da alta rotatividade escoteira? Afinal se o programa não é do meu agrado melhor
ficar com meus amigos do bairro e jogar uma “pelada”! Todos ficaram pensativos,
mas já sabendo a resposta.
“Chefe Um na sua inocência
pergunta: - Ainda existe o Sistema de Patrulhas”? Ainda existem as patrulhas de
monitores? Ainda existem o treinamento ou adestramento dos monitores em
separado? – Chefe Quatro levanta a mão interessado: - Melhor perguntar se
existem ainda chefes que se preocupam com isto! – Um silêncio total. Chefe Dois
no alto de sua sabedoria fala devagar e compassadamente: - Se a culpa é sempre
do Chefe porque não dar a ele as armas certas para que ele possa atuar melhor
na batalha da formação dos jovens?
Chefe Um se levanta e diz de
supetão: - Não vivemos pelo exemplo? Não fazemos o que aprendemos com os
outros? Como pesquisar, como conversar e trocar ideias se nossa liderança não
faz isto? Se até nos cursos somos uma manada que assiste sem poder nos
manifestar? – Chefe Quatro sorri e completa: - Tens razão. Ainda desconheço os
manuais de curso, mas pelo que soube a importância hoje é a utilização das
novas tecnologias eletrônicas para impressionar mais! Muitas vezes o formador
nem sabe onde pisa, segue a UD como se fosse uma leitura obrigatória. – Chefe Três
falando baixo sem aumentar seu volume diz para todos: Palestras, falatório, parolagem,
fórum onde só um fala. Chefe Um completa: E este nem sempre está preparado para
palestrar...
Se antes fazíamos tudo para que aprendêssemos
a fazer fazendo onde isto foi parar nos Cursos Escoteiros? - Disse o Chefe quatro.
Um silêncio total. Quem sabe o âmago da questão. Chefe Dois não mede a palavras
para dizer: - Uma pena que aqui somos quatro e nossa voz e nosso saber só chega
até onde o vento levar... – Chefe Um se levantou, mexeu na fogueira, a chama se
elevou e ele sorriu. Servir e ser servido. Ou ser servido e não servir. – Chefe
Três também sorriu. Ele sabia o que significava. Afinal nossa associação ainda
não viu suas responsabilidades. Lembrou-se de Getúlio Vargas que disse um dia:
- Para os amigos tudo, para os inimigos os rigores da lei.
Lei? Que Lei? A lei do escoteiro?
Chefe dois coçou a orelha. Pegou a chaleira de café e viu que estava quente
demais. – Acho que estamos esquentando sem saber onde queremos chegar... Chefe Quatro
cantou baixinho uma canção que ninguém conhecia: - Põe tuas mágoas bem no fundo
do bornal e sorri! – Chefe Um falou mesmo sabendo que não acreditava no que
falava: - Dizem que novos ventos sopram na liderança, trocas de função, mais
sorrisos e dizem até que agora serão mais transparentes. – Chefe Um sorriu como
se não acreditasse. Sorrateiramente comeu um biscoito, bebeu uma golada do café
quente e disse: - Sabe amigos, Abraham Lincoln disse certa vez que se quiser por
à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder!
Nada mais disseram. Agasalhados
em suas capas de fogo de conselho ali permaneceram sonhando que um dia, sim um
dia todos iriam discutir conversar, trocar ideias e aprovar o que seria a
opinião de todos. Cem mil? Duzentos mil? Sonhos impossíveis? Ainda haviam
esperanças? Poderiam ver chegar este dia?
Quatro chefes, um foguito, um vento frio
vindo da lagoa próxima. Agasalhados em suas mantas de Fogo de Conselho
conversavam. Sabiam que a floresta iria fazer desaparecer todo seu saber. A
lagoa iria beber tudo que conversariam ali. Suas palavras teriam o alcance dos
ventos levados pela força do rio que caudalosamente corria para o mar. –
Conversar, trocar ideias aprender e ensinar pode? Ou é melhor calar?