Os escoteiros declaram guerra ao
Exército Brasileiro.
Um conto quase real.
“(Qualquer semelhança com pessoas
vivas ou mortas, não é mera coincidência)”.
Eram seis seniores. Passaram
para a tropa e resolveram criar uma nova patrulha. Por unanimidade escolheram o
nome de Tamanduá Bandeira. Já se entrosavam no passado e agora melhor no
presente. Corria o ano de 1956. Josué o Chefe sênior dava inteira liberdade.
Funcionário da Vale do Rio Doce vivia quase que em um vagão percorrendo
estações, locais perigosos e pouco aparecia na sede. As três patrulhas tinham
liberdade de ir e vir e as reuniões eram mais para discutir atividades
aventureiras. Lindomar foi quem se lembrou das Grutas de São Raimundo. Há
tempos não iam lá. Seria menos material e isto facilitaria a jornada de duas
léguas bem contadas.
Encontraram-se na sede na
sexta às oito da noite e as nove já atravessavam a ponte de São Raimundo sobre
o Rio Doce. O Povoado de São Raimundo dormia e não viu os escoteiros seniores
cantando baixinho uma canção rumo à trilha da Fazenda do Mário Labrador.
Voltariam no domingo. O programa de sempre. Alvorada sempre ás seis. Um pouco
de física que o Tom Maia intendente conhecia e acostumado a dirigir. Levaram a
ração C. Sabiam que lá tinha belos peixes e muitas codornas para belas fritadas
na frigideira do Calêgo o cozinheiro. Às duas da manhã chegaram e se
arrancharam. Dormiram o sono dos justos. Foi Luiz Almeida quem acordou
primeiro. Chamou Tom Maia e acordou os demais. Sempre aquela vontade de
continuar dormindo, mas Coleman o Monitor logo deu a ordem para formar.
E eis que todos ficaram alerta
ao verem dois caminhões do Exército a Norte do Rio, uns 800 metros de distância
despejar dezenas de recrutas próximos às corredeiras da Curva do Onça. Cada um na sua e assim como o Exercito não deu
bola para eles o mesmo aconteceu na patrulha. Havia um programa não escrito e
foi para isto que eles foram arranchar ali. Tudo corria bem, almoçaram taioba
com arroz e lambari frito. Não havia “sesta” era a hora de montar armadilhas
para pegar um bom tatu ou mesmo um quati. O Arlindo foi para a beira do rio
montar um Cubo de bambus lascados em um remanso, onde o peixe entrava e não
podia sair. Quando voltava para o campo viu mais a sua direita uma enorme
abobora laranja. Grande mesmo, ele nunca conseguiria levá-la sozinho para o
acampamento.
Tom Maia e ele improvisaram
uma biga e ela foi levada até as grutas. Não sei quem deu a ideia, mas o
Arlindo ficou toda a tarde limpando por dentro sem cortar por fora e após fazer
uma pequena tampa cortou a parte mais larga fazendo uma boca cheia de dentes
pontiagudos e dois olhos arregalados. Todos sorriram quando perceberam o que
ele queria fazer. Calêgo trouxe duas velas. Arlindo preparou tudo para que o
vento não apagasse as velas. Deixou no fundo da abóbora um pouco de capim seco
com folhas verdes molhadas que quando tudo ficasse quente sairia pela boca
muita fumaça escura. A noite chegou. Ninguém falava nada. Não precisava. Luiz
Almeida o melhor nadador da patrulha levou a Abóbora até o meio do rio. No
início águas mansas até as corredeiras da Curva do onça onde estavam acampados
os recrutas do exército.
Antigamente e hoje nem sei
se ainda é assim, as cidades tinham seu Tiro de Guerra, uma pequena unidade
militar para que pudessem ter reservistas sem necessidade de investir em um
quartel militar. A turma recebia tudo. Fardamento e alimentação, mas iam para
casa a noite e nos fins de semana pouca atividade militar. A abobora no escuro
era fantasmagórica. Logo a fumaça tomou conta e quando ela passou pela área do
Tiro de Guerra (por volta das onze e quarenta da noite) os dois sentinelas
levaram o maior susto. Sem experiência começaram a gritar e abriram fogo na
pobre abóbora que navegava tranquila pelo rio soltando fumaça e girando nas corredeiras.
Os dois gritavam a mais não poder. – Sargento é o capeta! O demônio! O diabo! A
tropa acordou e se juntou aos outros que gritavam e abriram fogo na pobre
feiticeira do Rio Doce. E tome tiro agora com mais de uma dezena de outros
atirando também.
A gritaria era demais. Os
seniores gargalhavam e pulavam com sua abobora do fim do mundo. Enquanto isto
os soldados corriam para todo lado, alguns atiravam até mesmo em árvores
pensando que o inferno abriu a porta para eles. O tiroteio só parou quando o
sargento Martinho mirou e acertou uma bala bem no centro da abobora que se
despedaçou. Os seniores ficaram quietos. Não queriam que os militares soubessem
que foi invenção deles. Saíram das grutas na madrugada de domingo sem fazer
barulho. Após percorrerem alguns quilômetros foi aquela festa. Eles sabiam que
tal aventura seria contada por gerações em fogos de conselho ou conversas ao pé
do fogo.
Mas no sábado seguinte as patrulhas reunidas e
treinando uma passagem do caminho do Tarzan montada pela Jaguar viram o Capitão
Leopoldo do Tiro de Guerra chegando junto com o Chefe Josué. Ambos sérios.
Todas as patrulhas formaram em linha. O medo aflorou nas hostes da Tamanduá.
Não havia riso. Perfilados lado a lado em posição de sentido. Os seis bravos
seniores tremiam como varas verdes. Dizem que dois deles fizeram xixi na calça e
outra não aguentou e borrou até cair pelas pernas no chão. O capitão com um
olhar feroz passou em revista a patrulha. Olhou nos olhos de cada um e Arlindo
jurou que saia fumaça e fogo no seu olhar. Olhou os uniformes, na sua pose
característica de capitão foi por trás e voltou novamente a frente olhou de novo
a cada um e falou:
- Então são vocês? Seis merdinhas
escoteiros que botaram o Exército Brasileiro para correr? – A coisa “tava
braba”, pensou Tom Maia. Mas eis que para surpresa ele começou a rir
desbragadamente. E não parou de rir até que toda a Patrulha parou de tremer e a
rir também. A cidade comentou por muitos e muitos anos. Nem tudo foram Flores.
O Chefe Josué proibiu a patrulha de acampar sem Chefe por quatro meses. Um
suplicio, mas eles sempre quando se encontravam as lembranças nunca era
esquecidas. O tempo passou, a turma cresceu e eis que os seis seniores se
alistaram no exercito. Acamparam sim próximo as Grutas de São Raimundo, mas
sentiram saudades dos tempos que seis jovens botaram o exercito brasileiro para
correr!
Uma história quase real e o autor
deste conto ainda ri até hoje e se lembra que foi um dos que de tanto medo fez
xixi na calça. Não aconselho hoje a fazer isto, naquela época tudo era aventura
e tudo servia para curtir um pouco da monotonia da falta de um Smartfone de uma
TV ou das belas criações do mundo moderno pois dizem que agora se faz grandes
aventuras! Sempre Alerta!