segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

DEMOCRACIA ESCOTEIRA


Democracia Escoteira
Sinônimos de oposição: contestação, protesto, queixa e reclamação

"O que mais preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem-caráter, dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons"
 (Luther King)

            Um tema repetitivo. De forma diferente já postei neste blog dando minha opinião da democracia em nossa organização escoteira. Por principio sempre fui contra o sistema e a forma com que a direção nacional é composta. Desde os primórdios até os dias de hoje. Dizer que de outra maneira poderiamos estar melhor, seria arrogante em minha forma de pensar. Mas gostaria de ter visto algum diferente. Onde todos tivessem direitos de opinar e que todos os caminhos conduzissem a uma democracia escoteira. Disse-me um escotista que criticar é fácil. Difícil é arregaçar as mangas e partir para a luta. Concordo. Mas não me serve como exemplo. Sempre lutei por dar voz e voto se não a todos, pelo menos boa parte dos membros adultos do movimento Escoteiro em todos os órgãos por onde passei.

             Dizer que o sistema colegiado é pernicioso seria aventar que todas as organizações  que a possuem estão indo em caminhos errados. Não posso discutir tal hipótese. Muitos caminhos tomados pelos orgãos de diversas congêneres deram resultados. Para ser sincero houve até algumas boas alterações nos estatutos da direção nacional, que deram uma nova conotação do que antes poderia até considerar como autocrático. Quatro praticamente decidiam e hoje são catorze. Aumento considerável.

            Acredito sermos um movimento suis-generis. Temos um passado que nunca foi e não pode ser olvidado. Um método e um programa que nos trouxe uma afirmação de quem somos e temos tudo para acertar. Quando perdemos tudo isto, perderemos nossa identidade. Não teremos passado e nem tradições para serem lembradas. O que acontece hoje, é se alguém da cúpula acha isso ou aquilo do método ou do programa, então se altera. Parece simples não? Claro todos que são atuantes nas lides escoteiras tem todo o direito de acreditar que os caminhos percorridos até agora vai nos levar ao sucesso. Gostaria de pensar assim. Meus mais de 60 anos no escotismo  me mostram o contrário.

Para confirmar ou não minhas palavras, tente um dia ler as atas do CAN (Conselho de administração nacional). Em tempo algum se vê que os Grupos Escoteiros, (tido como o topo da piramede pela nossa direção) foram consultados. Não foram. Mudanças que até hoje ainda geram reclamações, protestos, queixas foram decididas por poucos. Poderia exemplificar com as provas de classe (segunda classe, a primeira classe, eficiencias), e muitas outras alterações. Sempre tomadas por um colegiado e poucos votantes. Estes sempre se achavam especialistas no assunto. Alí sempre tem alguém com a solução de determinado tema, apresenta, se discute, alguns casos pequenas consultas ou mesmo formação de comissão (nunca ví um relatório ou uma ata dessas comissões) e pronto. Votado e colocado em ação.

            Engano meu? Pode ser. Mas pergunto a voce leitor, quando e como no passado ou no presente seu Grupo Escoteiro foi consultado ou convidado a opinar? Seu conselho de chefes foi convidado a discutir tal tema? Se lermos o que nos diz o Projeto Educativo do Movimento Escoteiro não temos o que discutir. Acredito que é quase perfeito. Discuto sim o que é bom ou não para o desenvolvimento do jovem. Incluo o sistema de progressão pessoal, alterações no POR, estatutos, uniformes, trajes entre outros. Tivemos muitas alterações nos últimos anos. Agora por exemplo estão discutindo a progressão pessoal do jovem novamente. Pelo que eu saiba já aprovado. Chegou-se a conclusão que o anterior não era satisfatório. Porque se chegou a esta conclusão? Uns poucos fizeram seus comentários e chegou a hora de alterar.

            Amigos atuantes nas lideranças regionais e nacionais não concordam com meu raciocínio. Sempre naquela tecla que temos de mudar, que o passado se foi e hoje o jovem tem outra maneira de pensar. Interessante. Houve alguma consulta? Eu que atuei anos e anos nunca deixei de fazer minhas pesquisas de campo. Deficientes é verdade, mas sem querer me promover, era uma época de viagens de ônibus, caronas, bicicleta ou trem. Assim andei por boa parte do meu estado. Não seria interessante deixar ver os dois lados da moeda? Deixar que ele o jovem conheçer e sinta a vantagem de um e outro? Sempre o escotista (muitos abnegados e que merecem minha consideração) a dizer, - olhe eu mudei e na minha tropa está ótimo! Entendo. Mas onde existe este ótimo? Nosso efetivo é o mesmo nos últimos dez anos, a evasão continua e não dá treguas.

               Sem entrar no mérito da questão, alguém já discutiu ou perguntou alguma vez sobre a evasão no seu grupo? Em âmbito distrital, regional ou nacional? Sei que alguns grupos previlegiados foram alçados com o direito opinativo sobre várias questões que a nacional aventa. Mas uma ninharia em relação ao todo. É dificil entender como catorze decidem por 64.000 ou 10.000 adultos. Está nos estatutos, é só ler me dizem. Estatutos? Quantas mãos foram necessárias para alterá-lo nos ultimos trinta anos?

             Vou tentar explicar onde quero chegar. Tomemos como exemplo o Grupo Escoteiro. O sistema de patrulhas se bem aplicado é uma democracia quase autêntica. O monitor só age e interage com a concordância da patrulha. Temos ainda o Conselho da Tropa, a Corte de Honra e em alguns casos o Conselho de Patrulha. Já se discutiu que o chefe responsável, deve sempre ouvir a opinião de todos. Partindo do presuposto que o Conselho de Chefes é funcional, que a participação dos adultos ligados ao grupo tem direitos de voz e voto nas Assembléias do Grupo, então o Grupo Escoteiro é quase democrático. Quase!

            No entanto a partir daí, parece que tudo vai afunilando. O distrito, a região e finalmente a Direção Nacional são completamente diferentes. Êste sistema de representatividade não é democrático. Já disse. Tente ser um representante do seu estado no Congresso Nacional. Ou então tente ser eleito no próprio congresso nas vagas que anualmente vagam. Vais ver que dificilmente irá conseguir se eleger. E pior, se for considerado oposição, nem pense em se candidatar. Brincadeiras a parte, um amigo me disse que numa foto de anos atrás e uma atual, eram os mesmos!

       Disseram-me outro dia, que a média de votantes neste Congresso não passa de 160 membros. Ali, a maioria se conhece. É um verdadeiro clube do somos nós e mais ninguém. Novatos não entram. Uma vez ao ano, 160 elegem parte do CAN, que indica o DEN. Não entenderam? O CAN é o Conselho de Administraçao Nacional e o DEN é a Diretoria Executiva Nacional. O primeiro decide escolhe o segundo e este é quem cumpre  as determinações e faz cumprir as normas e regulamentos. Três responsáveis que iram dirigir o escotismo nacional e não foram eleitos por ninguém. Escolhidos por catorze.

            Acreditem. Até acho plausível o CAN. Mas eleito por todos e claro. Todos? Sim. Todos. Se vão definir planos e normas, tem que ter representatividade. Como, irão dizer? Simples. Uma mudança nos estatutos, montar um sistema confiável para evitar deslocamento ou gastos desnecessarios e assim todos irão votar no seu candidato. Seria bom que diversos escotistas de todo o país se candidatassem, (não como agora que indicam seu nome ao CAN e este vai escolher os membros da DEN) Dificil? Não. Conheço pessoas que desenvolveriam tais programas facilmente. (é só convidá-los). Entretando não ficaria preso a esta fórmula. Outras poderiam ser criadas.

             Se assim fosse feito, partiriamos para discutir temas que interessam a todos. Mas começando pela base. De que maneira? Vou dar um exemplo. O “xutômetro” hoje é utilizado por muitos. Para tudo temos uma porcentagem hipotética. Não é real. Nunca foi. Nenhuma pesquisa foi realizada pela UEB em todos os tempos. (pesquisa real) Vai-se tentando daqui e dali, através do “xutômetro” alterar as bases fundamentais criadas por Baden Powell simplesmente porque alguns acharam que deveria ser assim. Como disse o lobo Gris no livro da Jangal, hoje os tempos são outros. O movimento feminino é prova viva. Não que seja contra nada disto. Sejam bem vindas as moças as fileiras escoteiras. Mas sua criação foi idéia de uns poucos.

             Coloco aqui dois temas. A EVASÃO e Sistema de Progressão Pessoal. Já pensaram em colocar tais temas em discussão nas bases? Claro de uma forma racional, dando tempo para que se fizesse uma boa pesquisa, e quem sabe (só sugestão) indabas ou seminários em grupos, por exemplo, durante um ano. E no segundo ano, esses temas tivessem continuação em termos distritais e regionais? E finalmente no terceiro ano ser discutido na direção nacional em seus foruns apropriados?

             Muito tempo? Acho que muitos pensam assim. Precisamos de resultados imediatos, dizem. Não sei. Mas só a discussão já teria levado a uma mudança benéfica de atitude por parte de muitos Grupos, Distritos e Regiões. Implantados, a probabilidade de se acertar seria preponderante. Lembro-me que no passado um tema destes foi apresentado em um país do primeiro mundo. Enquanto os resultados não fossem analisados, e isto depois de anos e anos, sua implantação não foi permitida.

             Aqui não. Decide hoje, implanta-se amanhã. Claro, irão dizer, os ajustes estão sendo feitos e sempre foram feitos. Mas sem resultados, sem acompanhamentos. Exemplifiquei dois temas. Poderia exemplificar muito mais. Um bom desempenho e teriamos o sucesso esperado. Não podemos trabalhar sobre hipóteses. São tantos os exemplos mal sucedidos que explicariam perfeitamente onde estamos errando. Mas ninguém, ou quase ninguém quer ver.

             Muitos escotistas usam o velho chavão de que não querem se imiscuir. Seu trabalho é na base. Os considerados “contra” deveriamos estar em uma sessão escoteira em vez de criticar. Os que estão na direção merecem estar ali. São pessoas do mais alto gabarito e sacrificam boa parte do seu tempo indo e vindo em reuniões durante o tempo de sua gestão. São de inteira confiança. Não tiro o mérito de ninguém. Aprovo desde que sejam exemplares dignos de seus eleitores. Não o que vejo atualmente. Catorze falando e decidindo para 10.000 adultos e 64.000 membros e eleitos por 160 eleitores (uma media anual).

             Oposição não faz bem? Fechar os olhos e acatar tudo é melhor? Não pode haver oposição? Pode sim dirão. Vá lá, participe, fale, poderão dizer. Claro, concordo, mas vocês já viram como se desenvolve os congressos regionais e nacionais? Tente ser oposição hoje. Vão fazer de tudo para voce ser “pariá’ e não o chamarão para nada, não iram confiar a você nenhum trabalho ou discussão de temas. Sem generalizar, alí é um jogo de cartas marcadas. Eu no passado sempre fui ativo. Hoje não. Conheci de perto como é ser oposição no estado onde moro. Mas sou informado por amigos e não vejo nenhuma diferença do que era antes e é hoje. Voce alí não é nada. Lutou feito um condenado para ser um participante. Mas quando chega vê que os nomes escolhidos já o foram antes do evento. Os temas já definidos também. E se for oposição conhecida, poucos muito poucos irão comprimentar voce lá nestas Assembléias. Duvida? Risos. Isto aconteceu comigo várias vezes.

            Aproveitando a deixa, fica aqui registrado este tema interessante ainda não visto satisfatoriamente pelos nossos dirigentes. A oposição. A participação de escotistas ou adultos do movimento Escoteiro na política escoteira sempre foi de subserviência. Nada de oposição. Mas não seria bom, principalmente em momentos em que sentimos um desanimo pelo não reconhecimento de nossas autoridades quando as procuramos? Muitos desistem de ser oposição e partem para fundar sua organização ou se transferir para elas.

           Aproveito para fazer um adendo sobre as organizações escoteiras que estão aparecendo. Cada dia uma diferente. Pelo que ví até agora não existem transparência no que fazem. Seus orgãos escoteiros se existem não tem documentação para que possamos confirmar se os destinos propostos estão sendo realizados. Tentar ver relatórios, prestações de contas, biblioteca escoteira é uma quimera. Os idealizadores se perpetuam no poder. Se na UEB a democracia é considerada pequena, nas outras praticamente inexistem. Poderia até ter sido uma boa ideia, uma maneira de fazer o escotismo crescer mais. Competitividade faz bem. Mas isto não vai acontecer. A imigração dos descontentes não mudará nosso efetivo nacional. Os descontentes que ainda estão na UEB, meu conselho é que lutem pelas suas ideias. Continuem participando, pois felizmente ou infelizmente esta ainda mantém uma estrutura que nos dá condições de análise.

         Claro ainda não vivemos em anarquia na direção nacional e, portanto precisamos de diretrizes e oposição, para atender os mais diversos tipos de demandas impostas pela sociedade escoteira, visto que muitas necessidades não podem ser atendidas individualmente. E quando digo oposição não é ficar criticando em suas origens o que foi decidido por todos os escotistas ou diretores. Ou até quem sabe os pioneiros. Aprovado democraticamente, compete a cada um cumprir sem pestanejar. Cobrar claro os resultados nos foruns específicos, mas a partir de então é hora do oitavo artigo.   

         Desta forma, uma oposição que tenha estrutura e funcione de forma correta e atenda aos objetivos para os quais foi criada deve ser sempre bem vinda. Claro, desde que ela seja organizada de forma transparente, objetiva e com igualdade de oportunidade. Somente uma oposição sadía pode servir como meios para que esse objetivo seja atendido. Quais outros meios seriam possíveis para cumprir esse papel? Pelo meu raciocínio não o que vemos hoje. A oposição sempre foi e será essencial para qualquer democracia, a representatividade e a participação na organização e no atendimento dos anseios escoteiros.

         O que está de fato errado é uma parte das pessoas que dirigem os caminhos hoje definidos por poucos, tentam menosprezar o papel de uma oposição. Oposição esta que mal ou bem sente que os eleitos não cumprem o que se espera deles. Uma participação maior do programa Escoteiro na sociedade atual. Claro, uma boa parte da nossa população escoteira não se interessa por política. Somos apoliticos dizem. Nada a ver.  

        Dizer que existe oposição hoje é uma utopia. Sem uma boa oposição sempre teremos alguns se privilegiando em donos do poder e da verdade. Se tivessemos muitos escotistas entrando em uma política de oposição, estariamos bem diferente do que somos atualmente. A sociedade escoteira é complexa e aceita o ser humano imprevisível. Mas as pessoas em sua índole para o bem não podem se acovardar e deixar que alguns se perpetuem no poder e na política. Se todos assim pensassem os ganhos para a sociedade escoteira seriam incomensuráveis.

      Já disse e repito. Não tiro o mérito dos escotistas que hoje estão liderando o escotismo nacional. Isto não. Acredito até que todos têm as melhores das intenções. Estão presentes, deixam seus familiares para ajudar ao movimento. Mas em sua maioria não aceitam de bom grado que haja críticas e ou oposição. Até mesmo os mais humildes escotistas aprenderam a admirar e nunca questionar as modificações e me permito a dizer que nem mesmo tomam conhecimento da atas, relatórios e determinação que a direção nacional mantém. Eu mesmo pergunto-me, quantos já leram os Estatutos e as normas da UEB?

              Que venha a democracia escoteira. Que venham as pesquisas, que venham as  grandes consultas em todos os órgãos escoteiros. E claro que venha a oposição. Tudo pelos resultados. Ainda sonho com grandes consultas dos temas importantes feitas do norte ao sul do país. Que as pesquisas que se bem feitas terão os resultados esperados, e que pode trazer quem sabe um dia, o reconhecimento das autoridades nacionais do escotismo como fonte importante na formação de jovens.

UM MILHÃO DE ESCOTEIROS NO BRASIL! – IMPOSSÍVEL?


Um hipotético passeio no futuro.

 - Um antigo Escoteiro, depois de anos, retorna ao grupo onde cresceu e aprendeu toda a filosofia do programa Escoteiro. Alí recebeu formação de caráter, ética e liderança. Era grato por isso.
Ele chega ao grupo, e vê um número bem inferior ao que eram antes. Sempre Alerta! Diz alegre e solicito. Alguém olha de soslaio para ele e diz de maneira despretenciosa -  Oi!
Amigo eu fui Escoteiro aqui, poderia falar com o chefe do Grupo? Não tem mais responde. Só Diretor Técnico. Tem alguém da Comissão Executiva? Também não, isto já era. Agora é Diretoria.
Ele olha para o lado e vê um monitor displicente, patrulha dispersa, com o mesmo bastão do passado, onde sua patrulha tinha orgulho, e vê agora a bandeirola quase caindo.
Voce é chefe aqui? Pergunta. Não, sou escotista, responde.
E a Akelá? O Balú onde estão? Isto não existe mais, a mística da jangal já era. Agora todos eles são escotistas e o programa é outro.
Não estou mais vendo escoteiros com os distintivos de Segunda e Primeira classe. Ninguem aqui ainda conseguiu? -  Já acabou há tempos responde. Agora é pista, trilha, rumo e travessia.
Ele agora está em dúvida. Mesmo assim pergunta: - Me diga, não usam o uniforme aqui? Estão todos com uma camiseta e o lenço do grupo com um nó nas pontas. Muitos com tenis colorido e alguns usam chapéus esquisitos de todos os tipos, poderia explicar-me? É assim mesmo, responde. Agora é traje. Uniforme já era. Com o lenço cada um usa o que quiser. Ele arrisca uma última pergunta – Sabe dizer quando vai ser o próximo Conselho do Grupo? Gostaria de participar. Não existe isto aqui - responde. Só temos Congresso do Grupo.
Ele vai embora. Triste, desacreditado. Acha que não é o grupo onde tanto amou e onde viveu seus mais lindos sonhos e suas grandes aventuras. Quem sabe é um sindicato que montou uma sucursal infanto/juvenil?
O adeus ao escotismo pode acontecer?